O advogado do presidente Michel Temer (foto), Gustavo Bonini Guedes, está convicto da tese inédita da possibilidade de separação das contas das chapas, mesmo no cenário político atual, e também da inocência do presidente| Foto: MARCOS CORREAPR

O presidente Michel Temer conta com um fiel defensor no julgamento do Tribunal Superior Eleitoral, no próximo dia 6 de junho, terça-feira, quando o órgão vai apreciar a ação em que o PSDB pede a cassação da chapa Dilma-Temer por irregularidades na campanha presidencial de 2014. O advogado Gustavo Bonini Guedes está convicto da tese inédita da possibilidade de separação das contas das chapas, mesmo no cenário político atual, e também da inocência do presidente. 

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Para ele, a delação dos donos da JBS, Joesley e Wesley Batista, e a entrega de uma mala de R$ 500 mil para Rodrigo Rocha Loures, assessor presidencial, fazem parte de uma estratégia dos empresários para saírem impunes de crimes cometidos. Em entrevista, realizada antes da prisão de Loures neste sábado (3), ele levanta outros pontos que considera problemáticos, como o fato de o advogado dos irmãos Batista também ser delator e a saída de um procurador da equipe do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para trabalhar em escritório de advocacia contratado pela JBS para negociar acordo de leniência do grupo.

Guedes deu uma entrevista à Gazeta do Povo antes da prisão do ex-assessor especial de Temer, Rodrigo Rocha Loures. 
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Antes da delação da JBS, a análise nos bastidores era que o presidente tinha grandes chances de se livrar da cassação no TSE. Agora, em sua opinião, ele ainda poderá receber uma decisão favorável?

Nesse momento é tudo especulação. Não só nesse momento. Quando antes [se] dava o placar de cinco a dois [a favor do Temer] também era especulação. Ministro nenhum adianta voto. Claro, você tem uma expectativa com base na orientação de cada ministro, em julgamentos anteriores. Mas alguém que assista às sessões do TSE chegaria à mesma conclusão. 

Acha que pode haver pedido de vista por algum ministro?

É claro, eu acredito no pedido de vista. Foi muito rápido entre o término da instrução, o voto do ministro Herman [Benjamin], a disponibilização do voto e o início da sessão. É uma decisão muito séria, é o processo mais importante da história da Justiça Eleitoral. É natural que haja pedido de vistas. Se olharmos os últimos dois casos de [cassação] de governador, Amazonas e Tocantins, nos dois houve pedidos de vista. 

A estratégia de defesa continuará a mesma? 

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É óbvio que o tribunal faz uma avaliação política [do cenário] e uma avaliação de consequências. Agora, eu continuo dizendo, isso não é decisivo, não era decisivo antes e na minha avaliação não deve ser decisivo agora. O TSE não pode assumir essa responsabilidade, de determinar o rumo do país. O componente político, da estabilidade social do país estará no julgamento, mas o TSE não pode fechar os olhos para as nossas argumentações que continuam fortes, e a minha argumentação era forte tanto quanto é agora. 

A defesa continuará com a tese da separação das contas das chapas e a não inclusão das provas apresentadas pela Odebrecht?

Juridicamente falando, não pode ter prova da Odebrecht, não estava na [petição] inicial. No mundo inteiro existe a preocupação, não só no Brasil [de respeitar o prazo máximo previsto para representar à Justiça Eleitoral, para preservar a governabilidade de um mandatário eleito]. Aliás, têm países em que o prazo é menor, nós ainda temos 15 dias da diplomação. Ele [o eleito] tem de saber: passado os 15 dias, não há nada mais que se possa fazer eleitoralmente em relação ao mandato. Pode entrar com uma representação criminal e vai haver a punição, talvez até mais grave, inclusive há pena de prisão para isso. Mas, da mesma forma que você não pode entrar com ações novas agora [na Justiça Eleitoral], por mais grave que seja o fato que se descubra, em relação a qualquer político do país, você não pode enxertar fatos novos depois do prazo de 15 dias. 

Há um quadro feito pela ministra Maria Tereza [Assis Moura]. Ela elenca lá os 23 tópicos tratados nessas ações. [A delação do publicitário] João Santana não está lá, compra de tempo por partido político não está lá, nem os tais R$ 50 milhões do Marcelo Odebrecht. Ela definiu o escopo e é isso que dá estabilidade para o processo. 

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Você acha que os ministros acolherão a tese da divisão da chapa Dilma-Temer?

É outra coisa que eu não consigo dizer. E é a primeira vez que alguém propõe isso.

Foi ideia sua?

Quem deu a ideia foi o Gastão Toledo, que é o assessor jurídico do presidente. Porque do ponto de vista constitucional, isso é muito evidente. Dois dispositivos constitucionais tratam da individualização da pena, uma pessoa cumpre pena por aquilo que faz e não pode responder por alguma conduta que outro fez. A minha parte foi transformar isso para o Direito Eleitoral. Tratamos dela em relação às contas. A unicidade da chapa, o conceito que tem no Direito Eleitoral, só consta em um único artigo que trata do registro da candidatura, para evitar o que havia antes, quando se elegia um governador com algum dos vices, não exatamente o vice da chapa, o que é uma coisa meio estranha.

Se existe o princípio da individualização, que tem de ser respeitado quando possível, se houve a abertura de conta, que não era uma obrigação do vice, a partir do momento que a conta é aberta ele tem o direito de ter a conta avaliada individualmente. Se o vice abriu a conta e movimentou recursos, não pode ser penalizado pela conduta de outro. Se não tivesse aberto conta, aí estaria tudo misturado. Mas se é possível separar isso, a história muda. Temer abriu conta, movimentou recursos, quase R$ 20 milhões, e ninguém fala nada desses valores, nunca foram questionados. É uma boa tese, mas é uma tese nova. E como toda tese nova... [pode haver resistências].

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Se a decisão for pela cassação, vão recorrer?

Vamos até o fim. Tem muita matéria constitucional para levar ao Supremo.

Alguns dizem que a saída de Temer no julgamento do TSE seria mais suave que o impeachment.

Não há menor possibilidade de Temer renunciar.

Seria admitir a falta.

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Exatamente. Que ele tem convicção que não praticou. Não só ele, eu também. 

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Como avalia a delação da família Batista? 

Um escândalo, uma vergonha. Eu não sou contra o instituto da delação [premiada], eu entendo a relevância, acho que ele é bem-vindo e propiciou ao país que as instituições fossem passadas a limpo. Como meio de prova sou a favor da delação. Mas como meio de prova, repito, esse meio não se esgota em si mesmo, existe a regra de corroboração [que prevê que nenhuma sentença seja proferida apenas nas declarações de um delator].

Delação é uma coisa muito séria, mas tem de ter um extremo rigor do Ministério Público em relação a isso e também dos juízes na hora de validar, que é uma discussão que vai haver agora com a delação da JBS. [É possível acontecer que] o juiz homologa e dali a seis meses de instrução se descobre que um delator mentiu e um juiz não pode fazer mais nada. 

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Esse caso é extremo por tudo, não só por envolver o Presidente da República, um senador, um deputado. Porque ele envolve uma das maiores empresas do Brasil e uma falta de apenamento extrema. Não estamos dizendo que ele [Joesley] deveria ter cumprido mais [pena]. Veja, ele cumpriu zero. Houve, no mínimo, um descuido. Não pode uma coisa dessas. Envolve aceitação de uma prova, que é ilícita.

A OAB viu indícios suficientes para fazer o pedido de impeachment. 

A OAB cometeu o maior absurdo da história dela e a história vai cobrar isso. 

Entendo a sua indignação, mas o fato de o presidente receber um empresário investigado pela Justiça em reunião extraoficial, não é estranho?

Ninguém entra no Jaburu sem ser visto. Seria estranho o presidente receber no Jaburu se quisesse tratar de algo ilícito.

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Mas o teor da conversa, mesmo que supostamente tenha sido editada...

O teor da conversa, primeiro, ele é um flagrante armado. A pessoa vai para obter informações – e repare que [nesse caso] ela não obteve informação nenhuma. O flagrante armado é quando você induz o teu interlocutor a dizer uma coisa que se quer ouvir.

Assim, se o presidente tivesse dito alguma coisa, era uma coisa. O presidente ouviu, e tenho dúvida ainda [se o áudio pode ser usado como prova, por ter sido supostamente editado], isso depois vai ser tratado em relação à distância que eles estavam, que o áudio do presidente é muito baixo, é possível que eles estejam em uma distância significativa, o presidente é um homem de 76 anos, com a audição de um homem de 76 anos – pessoalmente, às vezes tenho de falar com ele um pouco mais perto. Tem várias situações que é possível levantar em relação a isso, e isso é matéria que tem de ser discutida efetivamente.

E a citação à compra de um procurador?

Primeiro, efetivamente, o Joesley é conhecido como uma figura complexa, para dizer o mínimo. Ostentava muito, desde a vida conjugal. A coisa tem de ser vista em outro contexto. É preciso lembrar o seguinte: a história tomou essa dimensão toda porque foi divulgada como se fosse uma coisa do [Eduardo] Cunha, como se ele tivesse autorizado a manutenção [de propina], que não tem [no áudio]. O presidente, homem cordato, diria isso para qualquer pessoa. “Boa relação com o Cunha?, tem de manter isso”, em relação à relação.

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A história já estava desmontada por aí. O próprio Joesley, no depoimento dele da delação, diz que tem dúvida se o procurador estava recebendo. Está dito isso lá por ele, o Ricardo Saudi, e o advogado Francisco [de Assis e Silva]. Aliás, o Francisco é delator e responsável pela defesa da JBS. Por que não contrataram alguém de fora? 

Advogado não deveria ser delator. Porque a lei que estabelece a delação pressupõe a participação de um advogado, para que você garanta o direito do cliente. Como alguém, que é delator, vai chegar para o procurador e dizer “não faz essa pergunta para o meu cliente que ele não vai responder”. Como ele também é delator, o procurador pode não mais fazer a delação dele e prendê-lo. Está tudo errado nesse procedimento.

Por que o presidente recebeu o Joesley fora da agenda?

O presidente recebe todo mundo até tarde. Realmente acho que pode ter havido um descuido, ele admitiu que foi ingênuo, que não toma todos os cuidados que deveria tomar no cargo de segurança. 

Vocês temem uma possível delação de Rodrigo Rocha Loures?

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Não. Uma coisa que pouca gente explorou é que eles [os donos da JBS] vão primeiro buscar o Rodrigo. Não é o Temer que marca. Quem marca a conversa é o Rodrigo que, por ser do meio empresarial, faz esse tipo de interlocução. Não é nada estranho ele indicar uma conversa com alguém que contribuía com o PMDB.

Aí, quando surge o Rodrigo na conversa [com o Joesley], o que o Temer faz? Simplesmente diz para Joesley falar com o Rodrigo. Quem que marcou isso aqui não foi o Rodrigo? Fala com o Rodrigo. E, no final, não houve o atendimento daquilo que se fez, o Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica] não resolveu em favor da JBS, isso já é relevante. 

E a mala de R$ 500 mil?

Pode-se discutir sociologicamente porque o Rodrigo recebeu aquela mala, é algo que só ele vai poder explicar. Acho que efetivamente houve um equívoco, um mau comportamento, mas [é preciso investigar], isso passa também pelo Estado Democrático de Direito. Talvez seja difícil defender isso nesse momento, toda a opinião pública pressionada como está, é natural. Será que se tivessem oferecido ao Rodrigo R$ 100 mil ele teria aceito? Ou o Rodrigo só aceitou porque vieram com uma proposta maluca de R$ 480 milhões? A corrupção é a mesma, você pode dizer. Mas isso foi construído. É como se conhecesse alguém e dissesse: com um carro eu não vou conseguir comprar essa pessoa, mas talvez com um avião sim. Então eu minto que vou dar um avião, para que você fique em uma posição desconfortável. Eu não estou defendendo o Rodrigo, até porque ele tem advogado para isso. Mas para mim fica muito claro que eles construíram a história para chegar nesse ponto, porque a única forma de ligar o presidente a um ilícito é o Rodrigo.

Tem mais uma coisa: o braço direito do Janot, o procurador Marcelo Miller, como se fosse o Deltan Dallagnol aqui de Curitiba, pede exoneração do cargo no dia 6 de março, no dia 7 é feita a gravação do Temer. No final do mês, entra no escritório que trabalha para a JBS, supostamente para fazer a leniência da JBS nos Estados Unidos. Marcelo Miller atuou em dois casos rumorosos: Delcídio [do Amaral, senador], na gravação dele pelo filho do Nestor Cerveró, e do Sérgio Machado. Ponto comum entre os dois: gravação de interlocutor. Isso é coincidência?

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Então a sua tese é que houve conspiração?

Não é teoria da conspiração. É um complô. Eu não acredito em teoria da conspiração de modo geral. Criaram a proposta de R$ 480 milhões durante 20 anos em troca da suposta ajuda que o Rodrigo daria no Cade.

Tudo isso para atingir o presidente em troca da liberdade dos Batista?

Não tenho dúvida de que foi um complô. Alguém concebeu isso como estratégia e o objetivo da estratégia era que eles não fossem presos. E isso foi alcançado.