Rodrigo Maia: semana de farpas e acenos à paz com Bolsonaro.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A possibilidade de que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), intensifique sua rota de colisão com o governo de Jair Bolsonaro é das menores. A avaliação é de deputados federais que conversaram com a Gazeta do Povo.

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Na terça-feira à noite (26), após uma semana de troca de farpas seguida por afagos a Bolsonaro, Maia colocou em votação a proposta de emenda à Constituição (PEC) que obriga o governo a executar as emendas de bancadas estaduais no Congresso – o que engessa ainda mais o orçamento federal. A inesperada aprovação da PEC, que não estava na pauta de votações e foi incluída em cima da hora após um pedido dos líderes partidários, foi vista como uma demonstração de força de Maia e da Câmara em relação ao Planalto – embora oficialmente o governo não tenha se oposto à proposta e não a considere uma derrota.

O próprio Maia, antes da votação, procurou não confrontar o governo. E disse que a PEC não era uma “retaliação”. Em entrevista na tarde da terça, ele afirmou que o ato de colocar o tema em pauta representava um desejo “de líderes de todos os partidos, inclusive do PSL”. A PEC foi aprovada com 448 votos a favor e apenas três contrários.

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Previdência de Temer e pacote anticrime de Alexandre de Moraes

Outro assunto que gerou rumores no Congresso de uma possível ofensiva de Maia contra Bolsonaro seria o resgate da proposta de reforma da previdência elaborada na gestão do ex-presidente Michel Temer e do pacote de segurança pública apresentado pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Além das farpas que trocou com Bolsonaro, Maia também protagonizou uma discussão pública com o ministro da Justiça, Sergio Moro. O presidente da Câmara chamou o pacote anticrime de Moro de “copia e cola” da proposta feita por Moraes.

Mas quem conhece Maia não aposta que ele vai afrontar o governo ao colocar em votação as propostas de Temer e de Moraes. “Isso não vai acontecer. O Rodrigo Maia é um homem de diálogo”, afirma o deputado federal Fábio Ramalho (MDB-MG), que em fevereiro disputou contra Maia a Presidência da Câmara. “Não vejo possibilidade de que o Rodrigo mude a agenda da Câmara”, afirma o também deputado Gilberto Nascimento (PSC-SP).

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Maia tem mais adesão à agenda econômica do governo do que Bolsonaro

Além de uma propensão ao diálogo, o que ajudaria a descartar a “rebeldia” de Rodrigo Maia é a adesão do presidente da Câmara à agenda econômica do governo Bolsonaro – que, segundo os parlamentares, seria maior do que a do próprio presidente da República.

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Uma declaração de Maia na terça-feira (26) ajudou a reforçar a convicção. O presidente da Câmara disse que “os que têm compromisso com a reforma da Previdência nunca perdem o foco”. E citou o seu nome e o do ministro da Economia, Paulo Guedes, como os que “têm compromisso”. Jair Bolsonaro, que contestou a reforma da Previdência no passado, não foi mencionado.

Essa postura recente de Maia fortalece o aceno por uma “bandeira branca” com o Planalto. Na segunda-feira (25), o presidente da República reuniu ministros para dizer que não queria o prolongamento da crise com Maia. E, na terça, o presidente da Câmara afirmou que manteve diálogo com o ministro Moro, um dos focos do conflito.

Maia também disse que não pretende promover o avanço de “pautas bomba” e nem de pedidos de impeachment contra Bolsonaro, segundo reportagem da Folha de S. Paulo. E o clima de apaziguamento se deu também com uma reunião que o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, fez com líderes de oito partidos na Câmara na terça, com o objetivo de refinamento do discurso.

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O perfil de Maia: um liberal convicto a ponto de engolir sapos

Rodrigo Maia foi um dos principais defensores da reforma da Previdência ao longo da gestão Temer. Seu partido, o DEM, fechou questão em torno do tema no governo do emedebista, e detinha o relator da reforma de Temer na Câmara, Arthur Maia (BA).

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“Rodrigo Maia traz consigo uma convicção da agenda econômica liberal já de muito tempo. Ele tem essa percepção e por isso assume um papel de protagonismo na Câmara dos Deputados na defesa do mérito”, afirma o deputado federal Efraim Filho (DEM-PB).

Vice-líder da oposição na Câmara, e contrário à reforma da Previdência, Aliel Machado (PSB-PR) endossa a análise: “O Rodrigo Maia exerce uma importante liderança aqui dentro. E faz isso na condição de alguém que sempre esteve ao lado da reforma”. O parlamentar traz outro elemento que diminui a possibilidade de votação da reforma de Temer: a legitimidade. Para Aliel, as propostas de Bolsonaro detêm um reforço junto à população pelo fato de o presidente ter sido eleito em outubro, enquanto Temer chegou ao cargo por meio do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.

O deputado Rodrigo de Castro (PSDB-MG) identifica ainda um descompasso entre o posicionamento de Maia e o de Bolsonaro – e que explica a convicção à reforma por parte do presidente da Câmara. “Bolsonaro dá sinais dúbios em relação à reforma. Foi contra a proposta no passado, e hoje em dia faz declarações controversas. Mostra pouca convicção quanto à importância da ideia. Já o Rodrigo Maia é, indiscutivelmente, favorável à ideia. É por isso, pela grande convicção que tem, que ele aceita ‘engolir sapos’ na disputa com o governo”, acrescenta o tucano.

O turbilhão na Câmara envolvendo a Previdência

Em meio a discussões sobre o mérito da reforma da Previdência, a Câmara viveu um turbilhão em relação ao tema nesta terça-feira (26), após o ministro Paulo Guedes decidir não ir à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para falar do assunto, como estava previsto.

O recuo de Guedes acabou por revelar um “bate-cabeça” entre membros do PSL. Enquanto o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (GO), chamou a ausência de “erro”, a líder de Bolsonaro no Congresso, Joice Hasselmann (SP), definiu o ato de Guedes como “estratégia”.

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O desencontro nos discursos indicou que a coesão dentro do PSL quanto à reforma ainda não foi alcançada – apesar de o partido ter promovido uma reunião entre seus membros na manhã da terça para afinar o discurso. Em plenário, o deputado Bibo Nunes (PSL-RS) chegou a dizer que o partido “está unido como nunca”.

Além do PSL, focos de contrariedade à reforma vieram de outros partidos que não integram a oposição formal ao governo. Um grupo de parlamentares de 11 siglas – MDB, PR, PP, PRB, PSDB, DEM, PSD, PTB, SD, Cidadania (ex-PPS) e Podemos – divulgou uma nota em que rejeita alguns pontos da reforma proposta pelo ministro Paulo Guedes, como a alteração nos pagamentos do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e na aposentadoria rural.

Rodrigo Maia elogiou o posicionamento das legendas. O presidente da Câmara disse, em entrevista coletiva à imprensa, ser positivo o fato de que a objeção a parte da proposta seja feita logo na fase inicial da tramitação. Maia falou ainda que “olha para o futuro” ao insistir na aprovação da reforma, por entender que o Brasil não poderá cumprir seus compromissos financeiros se não modificar o sistema de aposentadoria.

Paz com Moro

O “cachimbo da paz” apresentado por Maia foi também direcionado ao ministro Sergio Moro, seu desafeto na semana passada. O presidente da Câmara disse estar em diálogo constante com o ministro em relação ao pacote de leis para o combate à violência. O grupo de trabalho da Câmara que analisa a proposta se reuniu na terça.

Segundo Maia, ele e Moro poderão fazer “quantas reuniões ele [Moro] quiser” para a discussão do projeto. O democrata falou ainda que é possível ver a conclusão da tramitação do projeto ainda no primeiro semestre. Na semana passada, um dos focos da crise entre Maia e Moro foi o pedido do ministro para que a tramitação do pacote anticrime se dê em conjunto com a reforma da previdência – a solicitação foi interpretada por Maia e outros deputados como uma interferência do ministro na Câmara.

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A reação de Maia, tanto no embate com Moro quanto na troca de farpas com Bolsonaro, chegou a ser elogiada até mesmo por integrantes da oposição – a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) defendeu, em plenário, o presidente da Câmara nesta terça.

Trégua definitiva?

Diante das sinalizações de paz vindas da Câmara e do governo, o questionamento que permanece é se o debate recente foi um episódio isolado ou se os conflitos poderiam se repetir.

Para o deputado Gilberto Nascimento, uma característica da disputa atual deve inibir contendas futuras: “Tem vezes que, numa briga, um lado ganha e outro perde. Nessa briga de agora, todos perderam”. O democrata Efraim Filho tem opinião semelhante: “Nós estamos no limite. Precisamos mais de bombeiros do que de incendiários”.

Já o deputado Aliel Machado vê possibilidade de novos confrontos, principalmente por causa de um dos termos-chave que municiou ataques feitos por apoiadores de Bolsonaro a Maia: “Ele [Maia] não vai aguentar ser chamado de ‘velha política’, como fizeram bastante nesses últimos dias”.