Os quatro maiores bancos do país concentram quase 80% de todos os empréstimos, o que dificulta uma queda mais forte dos juros ao consumidor.| Foto: Arquivo/Gazeta do Povo

Aproveitando a queda da inflação e a estagnação da economia, o Banco Central acelerou a queda da taxa básica de juros. A autoridade monetária cortou a taxa Selic em 1 ponto porcentual nesta quarta-feira (12), para 11,25% ao ano, 3 pontos abaixo do nível de outubro de 2016.

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O problema é que os bancos, confortáveis com a baixa concorrência, não têm pressa em acompanhar esse movimento. Quase nada do “afrouxamento monetário” feito pelo BC nos últimos seis meses chegou para quem mais importa.

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Pessoas e empresas que precisam de crédito continuam sujeitas a juros quase tão altos quanto os de meio ano atrás e muito superiores aos cobrados antes da recessão, o que atrasa ainda mais a retomada da atividade econômica que a queda da Selic deveria estar facilitando.

A perspectiva do mercado financeiro é de que a Selic caia a 8,5% até o fim do ano. Analistas ouvidos pela Gazeta do Povo acham que até lá o juro bancário terá um recuo mais perceptível, mas nada espetacular.

Passo de tartaruga

De outubro até a reunião recém-encerrada do Comitê de Política Monetária (Copom), o juro básico havia recuado de 14,25% para 12,25% ao ano. Ou seja, a taxa que influencia o custo que os bancos têm para levantar dinheiro – e por isso serve de referência para a maioria dos empréstimos – encolheu 14%. Mas, na ponta, o custo do dinheiro caiu apenas 1% para pessoas físicas e 5,7% para empresas, segundo dados do BC relativos a fevereiro, os últimos disponíveis.

O recuo foi tão modesto porque o chamado spread – a diferença entre o que o banco paga para captar recursos e o quanto ele cobra dos clientes – pouco mudou. Para empresas, caiu só 2,5%. Para pessoas físicas, chegou a subir 0,7%, em média, em relação aos níveis de outubro.

“A redução do spread favoreceria uma conexão mais rápida e direta entre a queda da Selic e a melhora das condições para retomar o crescimento. Essa resistência dos bancos acaba prejudicando”, diz Juliana Inhasz, professora de Economia da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap).

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Inadimplência

O suspeito de sempre é o alto nível de calote. Se os bancos veem risco grande de não receber de volta o que emprestaram, embutem isso no spread e elevam o juro. Não é difícil imaginar por que andam mais temorosos. Apenas de outubro a fevereiro, pouco mais de 500 mil brasileiros perderam o emprego, elevando a 13,5 milhões o contingente que está em busca de trabalho, segundo o IBGE.

O que chama atenção é que a inadimplência não está subindo. Até recuou um pouco. Num intervalo de cinco meses, o nível de calote de empresas baixou de 5,6% para 5,2% do saldo de empréstimos, e o de pessoas físicas foi de 6,2% para 5,9%. Enquanto isso, os bancos elevaram as provisões. Em fevereiro, o dinheiro reservado para cobrir eventuais calotes chegou ao equivalente a 6,8% da carteira de crédito.

Talvez as instituições financeiras estejam olhando mais para outros números, como o de pessoas inadimplentes, que subiu. No primeiro trimestre, cerca de 900 mil nomes entraram para essa lista, o que elevou para 59,2 milhões – ou 40% da população adulta – o total de brasileiros “negativados”, segundo SPC Brasil e Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL).

Outra questão é a renegociação de dívidas, que bateu recorde. No ano passado, os bancos mudaram condições de empréstimos que somam R$ 416 bilhões, o equivalente a 13% do saldo de crédito do país. “Os empréstimos renegociados refletem uma dificuldade financeira que acaba não aparecendo no dado da inadimplência”, explica Patrícia Krause, economista-chefe para América Latina da seguradora de crédito Coface.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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Poder de mercado dos maiores bancos mantém juro lá em cima

Um dos fatores que impede uma queda mais forte no custo do crédito é a concentração bancária. No fim de 2016, os quatro maiores bancos do país – Banco do Brasil, Itaú, Caixa e Bradesco – dominavam 79% dos empréstimos. Um ano antes, o índice era de 75,8%. No fim de 2007, primeiro ano da série histórica do Banco Central, os quatro maiores bancos detinham 54,7% do crédito.

“A saída do HSBC [vendido ao Bradesco em 2015] e do Citi [vendido ao Itaú em 2016] aumentou a concentração bancária, que já era elevada. Os bancos ficam confortáveis em manter altas as taxas de juros porque ninguém oferece taxas menores”, diz Patrícia Krause, economista-chefe para América Latina da seguradora de crédito Coface. “A última vez em que houve uma queda mais forte dos juros foi porque os bancos públicos puxaram a redução e foram seguidos pelos privados.”