Plenário da Câmara dos Deputados: para especialista, renovação este ano deve ficar abaixo da média histórica, de 49%.| Foto: Roque de Sá/Agência Senado

Quem espera uma ampla renovação na composição do Congresso Nacional nas eleições deste ano deve se frustrar. Apesar de tantos escândalos de corrupção, que desgastaram políticos e partidos tradicionais, a avaliação de especialistas é que haverá poucas caras novas em Brasília a partir de 2019. Pesam para isso o tempo mais curto de campanha – de 90 para 45 dias –, que privilegia políticos já conhecidos; os critérios de distribuição do bilionário fundo eleitoral, que beneficiam legendas maiores e caciques partidários; e toda a estrutura de apoio que parlamentares têm à disposição, como verba de gabinete e emendas orçamentárias que levam dinheiro para suas bases eleitorais.

CARREGANDO :)

Leia também: Cabeça de Bolsonaro em corpo de galinha – Manuela caiu na armadilha mais óbvia da eleição

Por isso, esperar que um nome novo dispute uma eleição para o Congresso em pé de igualdade com quem já cumpre mandato é ilusão. A expectativa de renovação na Câmara dos Deputados, por exemplo, é de que seja abaixo da média histórica, de 49%, segundo Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).

Publicidade

Segundo dados do Diap, o índice mais alto de renovação na Câmara dos Deputados foi registrado nas eleições de 1989, quando o indicador apontou 61,82% de renovação. Foi também o mesmo ano de mudanças mais significativas no Senado, quando o índice de renovação em relação à composição da casa – 54 das 81 cadeiras em disputa na ocasião– chegou a 55,56%, pouco acima da média história, que é de 50,21%.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]

Nas eleições de 2014, a renovação foi de 47% na composição total da Câmara; no Senado, o índice foi de 27,16%. “São mais de R$ 14 milhões em emendas parlamentares, o que estudos apontam que significam uma vantagem de 25% na disputa em relação a quem aspira uma cadeira”, aponta.

Outro item que pesa a favor de deputados e senadores é a verba oriunda do Fundo Eleitoral, aprovado no final do ano passado, e que deve distribuir cerca de R$ 1,7 bilhão aos 35 partidos com registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Mas, de acordo com a resolução aprovada pela corte, apenas 2% serão distribuídos igualitariamente entre todas as siglas. Os demais critérios tomam como base números de representantes na Câmara e no Senado.

“Teremos com toda certeza a menor taxa de renovação nessas eleições por causa do fundão que apareceu aí”, afirmou o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL), em entrevista à Gazeta do Povo, na última quarta-feira (13). “Esse recurso basicamente vai ser destinado a deputado federal que já tenha mandato. [Então] Nome conhecido com recurso, a chance desse pessoal se manter aqui é muito grande”, apontou.

Publicidade

Além dos R$ 1,7 bilhão disponíveis, os partidos políticos têm à disposição recursos do fundo partidário, que deve distribuir cerca de R$ 1 bilhão este ano.

Menos tempo de campanha, melhor para os já eleitos

A redução no tempo do prazo de campanha, de 95 para 45 dias, em vigor desde as eleições de 2016, também favorece na corrida eleitoral quem já tem acesso a veículos de comunicação, como deputados e senadores com mandatos em vigor. “Quanto menor o prazo de campanha, melhor para quem está no mandato, porque as bases [eleitorais] já estão fidelizadas”, entende Queiroz. “O antigo [parlamentar] se beneficia do tempo curto; quem está fora precisa de tempo maior, de tempo de campanha”.

Leia também: Últimas pesquisas confirmam Bolsonaro favorito, mas ‘já ganhou’ é exagerado

O assunto foi tema de um dos debates do 6º Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral, que terminou na última sexta-feira (15), em Curitiba. Para o ex-ministro do TSE, Henrique Neves, participante de um dos painéis da programação, as restrições estabelecidas no período pré-eleitoral se transformam em limites para o debate de propostas. “Não podemos limitar esse debate, senão vamos chegar em uma situação em que o eleitor vai chegar às urnas sem saber quem são os candidatos, senão os já conhecidos de todos, que acabam levando alguma vantagem com isso”.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
Publicidade

“A restrição da propaganda só beneficia quem está no cargo, e isso vale para todos os níveis”, comenta Carla Karpstein, advogada e presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-PR, também sobre as regras estabelecidas para o período pré-eleitoral. “Esse não é o objetivo de legislação. O destinatário final da norma é o eleitor, e eu tenho que permitir que o eleitor tenha a chance de escolher o melhor candidato”.

Para Carla, os órgãos de fiscalização devem estar de olho em eventuais abusos cometidos por partidos e candidatos quanto ao uso e obtenção do dinheiro, e menos nas estratégias de divulgação adotadas no período que antecede o eleitoral. E defende que as punições se atenham a casos concretos, devidamente comprovados.

“Partidos têm donos”

Professor da PUC-PR, Masimo Della Justina também é cético quanto à possibilidade de renovação no Congresso Nacional este ano. “Tenho feito aposta com algumas pessoas que 75% de quem está na Câmara hoje pode se reeleger”, acredita. E isso se dá independentemente do montante disponível via fundo eleitoral, do tempo estabelecido para a propaganda eleitoral em rádio e TV e das demais regras definidas para o processo.

Leia também: Mourão nega candidatura e se oferece para compor eventual governo Bolsonaro

“O problema fundamental se dá porque os partidos não têm eleições prévias internas. Os partidos têm donos, caciques, então o candidato para o Senado geralmente é um ex-governador”, lamenta. “Para a Câmara, os partidos também têm donos, e na esfera federal, são os próprios deputados federais”. Para ele, se prévias fossem adotadas, as legendas ampliariam a possibilidade de cidadãos comuns apresentarem propostas e eventuais candidaturas, e permitiram ainda renovar seus quadros políticos.

Publicidade

O eleitor

Outra dificuldade para a renovação do parlamento está no perfil do eleitor. Masimo vê o brasileiro como alguém que se fideliza a um partido e a um candidato, sem que fatores éticos influenciem sua decisão diante da urna. “Desde a redemocratização do país, o eleitor brasileiro [demonstra que] não se importa muito com corrupção, ou questão ética. Ele se importa muito se a economia está crescendo, se ele está sendo beneficiado, se está em uma situação confortável”, assinala.

“O problema é que quem mais pede renovação, em geral, é quem vota em branco, nulo ou se abstém”, sintetiza Queiroz.