| Foto: Stéferson Faria / Agência Petrobras

O Brasil tem 146 empresas estatais em funcionamento, que movimentam R$ 1,4 trilhão ao ano. Na lista, há gigantes como a Petrobras, Eletrobras e Banco do Brasil, e empresas desconhecidas e com pouca transparência, como Ebserh, EPL e Amazul. Os resultados da Operação Lava Jato e a crise econômica criaram ambiente favorável à privatização e o tema está ganhando corpo no debate eleitoral - Jair Bolsonaro (PSL), Geraldo Alckmin (PSDB), Alvaro Dias (Podemos), Rodrigo Maia (DEM), Henrique Meirelles (MDB), Flávio Rocha (PRB) e João Amoêdo (Novo) defendem abertamente algum nível de privatizações . Uma análise desse universo mostra que a maioria dos serviços estatais poderiam ser prestados pela iniciativa privada.

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Apenas quatro entre as 18 estatais dependentes de recursos do Orçamento atuam em áreas que podem ser consideradas estratégicas ou de segurança nacional, como defesa e pesquisa nuclear. Outras 14 estão em áreas onde já existe a atuação de empresas privadas no Brasil, como serviços de saúde, pesquisa e gestão de projetos (de energia, agricultura ou recursos hídricos), e transportes. São áreas de interesse dos investidores e empresas que atuam nesses ramos.

Em 2017, R$ 20,2 bilhões de recursos que deixam de ir para programas em áreas básicas e não geram receitas (como saúde e educação) para alimentar as estatais dependentes. 

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“O grau de dependência dos recursos do governo federal é de modo geral bastante elevado. Esse é um aspecto que chama atenção, pois a organização de certas atividades de interesse público na forma empresarial sugere certa capacidade de geração própria de recursos”, avalia a Instituição Fiscal Independente (IFI), ligada ao Senado, em relatório especial sobre a atividade estatal dependente no Brasil. 

A necessidade de recursos do governo não é exclusividade de estatais dependentes. Em 2017, outras 11 empresas tiveram aportes de dinheiro público aprovados, que chegaram a R$ 3,3 bilhões. A maior parte desses aportes foi para a Infraero, que administra aeroportos, uma área de grande interesse do capital privado e que pode ser rentável. A empresa recebeu R$ 3 bilhões. 

E o buraco é ainda maior. Mais de 20 empresas (dependentes e não-dependentes) são ralos de dinheiro público e têm patrimônio líquido negativo. Juntas, essas empresas registraram quase R$ 33 bilhões em perdas, que no futuro terão de ser cobertas pelo governo, por capitalização ou por empréstimos. 

E o atendimento aos mais pobres?

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Se não atuam em áreas de defesa ou segurança nacional, por que manter as estatais, principalmente aquelas que não geram lucros? A falta de atratividade à iniciativa privada em alguns setores é apontada por defensores da presença estatal como a razão para se manter sob responsabilidade do estado parte dos serviços. 

Um desses casos seria a Embrapa, empresa de pesquisa e desenvolvimento na área agrícola. O trabalho da empresa auxilia o agricultor familiar e produtores de menor porte. Dependente do governo, ela recebeu R$ 3,2 bilhões em 2017 do Tesouro. Sua atuação em pesquisa mostra resultados e é importante para o setor, como a produção e comercialização de 1.200 toneladas de sementes básicas em 2016. A empresa afirma que para cada R$ 1 investido, foram R$ 11 que retornaram à sociedade brasileira. 

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]

Mas sua área de atuação tem interesse financeiro privado e a estatal conta com grande participação de parceiros ou co-financiadores. De um orçamento de ações que somaram R$ 937 milhões, R$ 564 milhões vieram de “outras fontes”, segundo informativo da entidade de março de 2017. Além disso, os gastos com pessoal dispararam na Embrapa e mais que dobraram desde 2008, chegando a R$ 2,8 bilhão em 2017, descolando de outros custos da empresa, que se mantiveram estáveis. 

O governo tem meios de exigir, cobrar e custear uma gama de serviços que não sejam rentáveis para as empresas e precisam ser prestados. A regulação do setor de energia e telecomunicações já trouxe algumas respostas. Ao conceder à iniciativa privada uma outorga de distribuição de energia elétrica, o governo faz exigências e impõe metas que devem ser cumpridas pelas empresas privadas. 

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É o caso da Universalização Elétrica, custeada parcialmente pelo governo federal pelo programa Luz para Todos. O governo repassa os valores pelas empresas e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) define o prazo para que as empresas levem energia às regiões mais remotas de sua área de atuação. 

Este ano, cinco empresas terão de cumprir as metas de levar instalação elétrica a toda a zona rural sob sua concessão, nos estados do Amazonas, Acre, Alagoas, Piauí e Rondônia. O não cumprimento das metas pode acarretar em multas e punições, que em última instância podem levar à perda da concessão. 

As empresas distribuidoras de eletricidade também têm compromissos em atender a novos clientes em sua área de atuação. A resolução 414, da Aneel, estabelece regras para pedidos de novos clientes em locais que não tenham ligação. 

Outra iniciativa do setor elétrico que pode servir de exemplo para garantia a prestação de serviços com caráter social, que não tenham interesse da iniciativa privada, é a Tarifa Social, no qual o conjunto de consumidores paga em sua conta de luz para que a população de baixa renda tenha descontos nas suas tarifas. Em fevereiro de 2018, foram gastos R$ 197 milhões com essa compensação, para todo o Brasil. 

Em algumas distribuidoras, a fatia de consumidores beneficiados pela Tarifa Social chega a ser mais de um terço da população total atendida pela empresa. Esse é o caso da CEMAR (Maranhão), empresa que foi privatizada em 2006 e adquirida pelo grupo Equatorial Energia. 

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Sem formas de mensurar prestação de serviço ao cidadão 

Mensurar a contrapartida que a atuação da maioria das estatais gera ao cidadão brasileiro é algo quase impossível.  Faltam informações sobre a gestão da empresa, contas e metas, bem como gestão de risco adequada e canais de denúncia em 16% das estatais avaliadas pela Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (SEST), do Ministério do Planejamento. 

Segundo o Indicador de Governança (IG-SEST), apenas oito entre 48 estatais federais de controle direto da União avaliadas (todas as dependentes estão incluídas) têm o melhor nível de governança previsto (Nível 1), incluindo Eletrobras, Petrobras e Banco do Brasil. Quatro empresas se enquadram no Nível 2. Mas a grande maioria das empresas não atendem aos requisitos mínimos de governança.