| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Joesley Batista e Ricardo Saud, do Grupo J&F, afirmaram em uma conversa gravada que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tinha ciência prévia dos seus planos para firmar um acordo de delação premiada, que era negociado informalmente com o ex-procurador Marcelo Miller. As declarações contradizem a versão do Ministério Público Federal sobre as tratativas para o acordo, que serviu de base para a denúncia por corrupção passiva contra o presidente Michel Temer. O diálogo ocorreu provavelmente em 17 de março, dez dias após Joesley ter gravado sua conversa com Temer no Palácio do Jaburu.

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No áudio, entregue ao Ministério Público Federal no último dia 31, o empresário diz que pretendia delatar Temer e “falar” do Supremo Tribunal Federal na colaboração. Caso estivesse em curso uma ação controlada, na qual o Ministério Público orienta os colaboradores a produzirem provas de crimes, o presidente só poderia ser gravado com autorização do STF.

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Em Paris, o ministro Gilmar Mendes, do STF, levantou a suspeita de “uma ação controlada sem ordem judicial” e disse que a PGR terá de responder sobre isso.

Na segunda-feira, 4, ao anunciar uma investigação que pode levar ao cancelamento dos benefícios dados aos delatores, Janot afirmou que a Procuradoria-Geral da República não mantivera direta ou indiretamente contato com eles antes de ter sido procurada pelos irmãos Joesley e Wesley Batista em 27 de março - o acordo foi fechado no dia 7 de abril.

A divulgação do conteúdo do áudio levou a uma ofensiva da defesa de Temer e de aliados no Congresso pela anulação da delação. O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo, suspendeu o sigilo da gravação.

Nesta terça-feira, 5, Joesley disse que mentiu no áudio e a PGR afirmou que Janot jamais se encontrou com o empresário e delator (leia mais abaixo).

Na conversa, os delatores relatam contatos com o então procurador Marcelo Miller, um dos assessores de Janot. “O Marcelo deu uma tarefa para nós. O que nós temos é muito fraco e ele quer mais. É isso?”, pergunta Saud. Joesley diz: “Ele já contou para Janot que a gente tem muito mais coisa para contar”. Joesley completa dizendo que ele e seus executivos eram “a joia da coroa deles”. “O Marcelo já descobriu e falou para o Janot: ‘Janot, nós temos um pessoal que vai dar todas as provas que nós precisamos’.”

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Na conversa é citado também o chefe de gabinete do procurador-geral, Eduardo Pelella. “O Anselmo (não identificado) falou para o Pelella, que falou pra não sei o quê lá, que falou para o Janot. O Janot está sabendo.”
Aparentemente, a gravação, que tem mais de quatro horas, foi feita de forma acidental.
Ministros. O dono da J&F diz em um trecho que pretendia gravar José Eduardo Cardozo, ex-ministro da Justiça de Dilma Rousseff, como forma de delatá-lo e, assim, obrigá-lo a ajudá-los a “dissolver o Supremo”. “Você (Saud) com o Zé e eu (gravo) com o Temer.” Os delatores consideravam que ele conhecia fatos graves envolvendo ao menos cinco ministros da Corte.

A conversa prossegue com os delatores dando a entender que estavam negociando os termos de suas delações com Miller. Mais adiante, ele completa: “Falei para o Marcelo: ‘Marcelo, você quer pegar o Supremo? Entrega o Zé. O Zé entrega o Supremo’”. Este se encarregaria de levar as informações a Janot por meio de um “amigo em comum”, chamado Cristiam.

Segundo Saud, Miller lhe teria dito ainda que Janot, após deixar o cargo, iria trabalhar no mesmo escritório de advocacia onde Miller e Cristiam trabalhariam. Em 5 de abril, Miller deixou o MPF e passou a trabalhar no escritório de advocacia Trench, Rossi e Watanabe, que participou do acordo de leniência do Grupo J&F.

Era mentira

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Os delatores Joesley Batista e Ricardo Saud divulgaram nota nesta terça na qual afirmam que as declarações no áudio que citam o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e ministros do Supremo Tribunal Federal “não guardam nenhuma conexão com a verdade”.

“Não temos conhecimento de nenhum ato ilícito cometido por nenhuma dessas autoridades”, diz o comunicado. “O que nós falamos não é verdade, pedimos as mais sinceras desculpas.”

O ex-procurador Marcelo Miller afirmou que “não cometeu qualquer crime ou ato de improbidade administrativa e está à disposição das autoridades”.

A Procuradoria-Geral da República afirmou que Janot “jamais” se encontrou com Joesley e “não recebeu Marcelo Miller na condição de advogado do Grupo J&F”. “As tratativas efetivas para celebração de acordo de colaboração premiada com os advogados dos executivos do Grupo J&F se deram somente no fim de março, após a gravação em questão”, diz a PGR.

Segundo a nota, s colaboradores falavam sobre a Operação Carne Fraca e Janot “jamais aceitou convite para integrar qualquer escritório de advocacia”.

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