Construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará: consórcio teria pago propinas a PT, PMDB e ao ex-ministro Delfim Netto.| Foto: Divulgação/Norte Energia

A Polícia Federal (PF) deflagrou na manhã desta sexta-feira (9) a 49.ª fase da Operação Lava Jato, a partir de investigações sobre corrupção na licitação e construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará.

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Nove mandados de busca e apreensão são cumpridos nos estados do Paraná e de São Paulo. A ação em curso, realizada em conjunto pela PF, Ministério Público Federal (MPF) e Receita Federal, foi batizada de Operação Buona Fortuna.

De acordo com os órgãos envolvidos, a suspeita é de que agentes do governo federal favoreceram a vitória do consórcio Norte Energia na licitação de concessão da usina, em 2010, durante o governo Lula. O ex-ministro Antônio Delfim Netto, todo-poderoso durante o regime militar, e os partidos PMDB e PT teriam dividido propinas relativas à obra. A construção começou em 2011, já na gestão de Dilma Rousseff.

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Em entrevista coletiva, o procurador Athayde Costa afirmou que Delfim Netto teria recebido R$ 15 milhões ao todo – o juiz federal Sérgio Moro determinou o bloqueio de R$ 4,5 milhões das contas do ex-ministro. Por meio de advogados, Delfim negou irregularidades. PT e PMDB teriam recebido aproximadamente R$ 120 milhões – R$ 60 milhões cada um. Em nota, os dois partidos também negaram ter recebido propinas.

O esquema foi revelado, segundo a Procuradoria, por acordos de leniência firmados com as empresas Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa e acordos de colaboração premiada da Odebrecht.

Os investigadores também realizaram quebras de sigilos bancário, fiscal, telemático e de registros telefônicos, que, segundo a Procuradoria, revelaram a existência de estreitos vínculos entre os investigados e confirmaram as informações dos colaboradores.

Delfim Netto, codinome ‘Professor’

O economista Delfim Netto, um dos focos da operação, tem 89 anos. A operação também mira o empresário Luiz Appolonio Neto, sobrinho dele.

Delfim foi ministro da Fazenda, da Agricultura e do Planejamento durante o regime militar, e depois foi deputado federal. Conselheiro informal de Lula, Dilma Rousseff e do atual presidente, Michel Temer, ele é “suspeito de receber parcela das vantagens indevidas que seriam direcionadas aos partidos PMDB e PT, em razão de sua atuação na estruturação do Consórcio Norte Energia”, segundo o MPF.

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Até o momento, prossegue a Procuradoria, já foram rastreados pagamentos em valores superiores a R$ 4 milhões de um total estimado em R$ 15 milhões, pelas empresas Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Odebrecht, OAS e J. Malucelli, “todas integrantes do Consórcio Construtor de Belo Monte, em favor de pessoas jurídicas relacionadas a Antônio Delfim Netto, por meio de contratos fictícios de consultoria”.

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No caso da Odebrecht, diz o Ministério Público Federal, os pagamentos foram registrados no sistema de controle de propinas da empresa, o “Drousys”, com o codinome “Professor”. As apurações teriam demonstrado que não foi prestado nenhum serviço pelo ex-ministro às empreiteiras que efetuaram os pagamentos.

Os advogados Fernando Araneo, Ricardo Tosto e Jorge Nemr afirmam que o ex-ministro “não cometeu nenhum ato ilícito em qualquer tempo”. “O professor Delfim Netto não ocupa cargo público desde 2006 e não cometeu nenhum ato ilícito em qualquer tempo. Os valores que recebeu foram honorários por consultoria prestada”, afirma a defesa.

Em agosto de 2016, em depoimento ao delegado da Polícia Federal Rodrigo Luís Sanfurgo de Carvalho, da Lava Jato, Delfim disse ter recebido R$ 240 mil em espécie da Odebrecht em outubro de 2014 por “motivos pessoais, por pura conveniência”, devido a um serviço de consultoria que ele teria prestado à empreiteira.

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Ministro todo-poderoso durante o regime militar, o economista Delfim Netto foi conselheiro informal dos governos Lula, Dilma e Temer. 

Ele declarou, na época, que “presta serviços” para a empreiteira há 20 anos, mas que esta consultoria específica, pela qual ganhou R$ 240 mil, foi feita sem contrato. Afirmou que não recebeu outros valores da empreiteira em circunstâncias similares.

O ex-ministro alegou, ainda, que “não tinha ideia” que o valor foi pago pelo setor da Odebrecht responsável pelo caixa 2 da empreiteira, conforme revelou a investigação da Lava Jato. O ex-ministro não detalhou qual foi o serviço de consultoria para a Odebrecht que justificou os R$ 240 mil. Ele afirmou, na ocasião, que o dinheiro já havia sido gasto e declarado em seu Imposto de Renda.

Em abril de 2016, Flávio Barra, alto executivo da Andrade Gutierrez disse em acordo de delação premiada que a empreiteira pagou propina de R$ 15 milhões a Delfim na fase final das negociações para a construção da usina de Belo Monte.

Segundo Barra, o pagamento teria chegado a Delfim por meio de contratos fictícios de empresas de um sobrinho dele, Luiz Appolonio Neto, com a Andrade Gutierrez. Barra, que presidiu a AG Energia – braço da Andrade para esse mercado – disse que os pagamentos foram uma gratificação por Delfim ter ajudado a montar consórcios que disputaram a obra.

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Em nota, a defesa de Appolonio afirmou que “refuta veementemente as acusações e esclarece que sua vida profissional sempre foi pautada pela legalidade”.

PT e PMDB

As investigações prosseguem, segundo o MPF, “especialmente no que se refere aos pagamentos de vantagens indevidas direcionados ao Partido dos Trabalhadores e a seus representantes, assim como em relação a outras empresas integrantes do Consórcio Construtor de Belo Monte que destinaram parte da propina inicialmente direcionada aos partidos políticos para o ex-ministro [Delfim Netto] e pessoas a ele relacionadas”.

Em nota, o PT afirmou que a Lava Jato está atacando o partido em ano eleitoral para criminalizá-lo. “As acusações dos procuradores da Lava Jato ao PT, na investigação sobre a usina de Belo Monte, não têm o menor fundamento. Na medida em que se aproximam as eleições, eles tentam criminalizar o partido, usando a palavra de delatores que buscam benefícios penais e financeiros”.

O PMDB afirmou que “não recebeu proprina nem recursos desviados no Consórcio Norte Energia”. Disse lamentar que uma pessoa da importância do ex-deputado Delfim Netto “esteja indevidamente citado no processo”. “Assim, como em outras investigações, o MDB acredita que a verdade aparecerá no final”, concluiu o partido.

Favorecimento ao consórcio Norte Energia

Conforme a Polícia Federal, as investigações “identificaram modus operandi semelhante ao já investigado nas demais fases da Operação Lava Jato e consistia no pagamento de vantagens indevidas a agentes públicos e políticos por parte de consórcio de empreiteiras diretamente interessado nos contratos de construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte”.

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O MPF relata que há “fortes indícios” de que o consórcio Norte Energia foi indevidamente favorecido por agentes do governo federal para vencer o leilão de concessão da usina.

“Posteriormente, mediante acordos de corrupção, a Norte Energia direcionou o contrato de construção da usina a outro consórcio, formado por empresas que deveriam efetuar pagamentos de propina em favor de partidos políticos e seus representantes, no percentual de 1% do valor do contrato e seus aditivos”, continua o comunicado do MPF.

Impactos sociais, ambientais e econômicos

Em operação desde abril de 2016, Belo Monte tem 14 de suas 24 unidades geradoras em atividade. São oito na casa de força principal, com capacidade instalada de 4,9 mil megawatts (MW), e seis na casa de força complementar, em Pimental, com 233,1 MW, totalizando mais de 5 mil MW.

Quando pronta, será a terceira maior do mundo em capacidade de geração, com potência de 11,2 mil megawatts (MW), atrás de Três Gargantas (22,5 mil MW), na China, e Itaipu, no Brasil (14 mil MW).

Belo Monte é polêmica desde antes da construção. Tem um longo histórico de conflitos envolvendo questões indígenas e de meio ambiente, além das controvérsias envolvendo o governo e a formação dos consórcios que disputaram o empreendimento.

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Citada no comunicado do MPF, a procuradora da República Jerusa Burmann Viecili, integrante da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, afirma que “as provas indicam que o complexo esquema criminoso verificado no âmbito da Petrobras se expandiu pelo país e alcançou também a Eletrobras, em especial nos negócios relativos à concessão e construção da usina hidrelétrica de Belo Monte”.

“Essa obra, além de ter ocasionado graves impactos sociais e ambientais na região que já haviam sido demonstrados pelo Ministério Público Federal, também redundou em elevados prejuízos econômicos para toda sociedade”, afirma a procuradora.

Os mandados

Os mandados judiciais cumpridos nesta manhã foram expedidos pelo Juízo Titular da 13.ª Vara Federal de Curitiba/PR. Os mandados são os seguintes:

PARANÁ

Curitiba - 4 mandados de busca e apreensão

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SÃO PAULO

São Paulo - 3 mandados de busca e apreensão

Guarujá - 1 mandado de busca e apreensão

Jundiaí - 1 mandado de busca e apreensão

Colaboraram Kelli Kadanus e Flávia Pierry