| Foto: Corpo de Bombeiros MG Divulgação

O pedreiro Adriano Santos, 36, presenciou a retirada de quatro corpos da lama ao longo da tarde deste sábado (26), em Brumadinho (MG). Na cidade da região metropolitana de Belo Horizonte fica a barragem da Vale que rompeu na sexta-feira (25). “Eu, algumas pessoas da região e brigadistas começamos a andar por aqui e achamos dois corpos, uma mulher e um homem. Acenamos para o helicóptero”, conta ele, enquanto mostra vídeos dos corpos no celular. “Está todo mundo desesperado e unindo forças”, completa.

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Eram cerca de 13 horas. Mais tarde, mais dois corpos foram retirados do lamaçal na região conhecida como horta, entre Parque da Cachoeira e Tejuco, bairros de Brumadinho mais atingidos. O local era literalmente uma horta, mas nada restou da plantação de hortaliças e milho. “Infelizmente muitos corpos vão ficar sepultados debaixo dessa lama. Infelizmente não vão achar todos”, lamenta o pedreiro.

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Santos é um dos sobreviventes da tragédia - quase 200 pessoas já foram resgatadas, de acordo com o Corpo de Bombeiros de Minas Gerais. O número se refere não só a pessoas retiradas da lama com vida, mas também a pessoas que ficaram ilhadas ou em situação de risco e foram salvas. O número inclui moradores da região e trabalhadores da Vale.

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“Onda de lama fazia tremer o chão”

Cássia Oliveira Silva morava em um sítio e a onda de lama passou a poucos passos da sua casa. Os fundos de seu terreno terminam no Córrego do Feijão, no vale por onde a lama desceu, levando consigo a horta e um pequeno pasto onde estavam um cavalo e uma vaca.

A casa ficou de pé, mas tudo em volta agora é barro. Em frente à residência, um morrote serviu de abrigo para a família composta por três crianças, entre sete e dez anos, sobrinhas de Cássia, e sua mãe, uma idosa com problemas na bacia e dificuldades para caminhar.

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O sítio está a uma distância da barragem de rejeitos que foi suficiente para que ela fosse avisada do rompimento com alguma antecedência. Recebeu o aviso por telefone, de uma vizinha, e correu para cima do morro com a família sem levar pertences, de onde viu a onda de lama passar.

“Primeiro, levantou um poeirão. Depois foi quebrando tudo, fazendo um barulho que entrava pelo ouvido, pelo peito e pela barriga. Fazia tremer tudo, o chão, o capim e a gente”, disse Cássia, que aguardava com a família o ônibus que as levaria para um hotel em Brumadinho.

“Não sobrou ninguém”

“Agora acabou tudo”, afirmou Antonio Francisco de Assis Nunes, de 63 anos, produtor rural da região do Parque das Cachoeiras, na periferia de Brumadinho. Chorando e lamentando o estrago nas lavouras, ele contou que naquela área viviam cerca de 20 famílias: “Não sobrou ninguém”.

Conhecido como Tonico da Horta, ele acompanhou o drama mais pesado bem de perto. A menos de cinco metros, remexendo a lama que invadiu o barracão sem paredes, um grupo de bombeiros se preparava para resgatar um corpo feminino da borda. “Olha isso, deve ser gente que veio arrastada.”

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A lama mole devastou a baixada usada para plantio de frutas e legumes e avançou sobre o galpão de selecionar a produção agrícola, destruindo tudo e entrando pelo prédio. Tonico da Horta nem viu quando o corpo foi colocado dentro de uma caixa de plástico, envolto num saco preto, e retirado de helicóptero pelos Bombeiros. Era o resgate de mais uma das dezenas de vítimas ainda desconhecidas.

“Uns 300 metros daqui, já localizamos outros quatro corpos”, afirmou o socorrista que vasculhava, numa equipe de quatro bombeiros, as bordas da lama e ia marcando os pontos de cadáveres. Logo adiante, um outro helicóptero acabara de içar outra vítima. 

“Estamos neste local há umas duas horas e já localizamos quatro pessoas”, afirmou o bombeiro. Eram 16 horas. Pouco antes de uma forte chuva que despertou temor na região, pelo menos mais dois cadáveres tinham as coordenadas definidas para recolhimento.

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A devastação provocada pelo rompimento da barragem foi acompanhada de perto também pelo morador João Moreira do Carmo, de 63 anos. “Eu vi a lama descendo”, contou. “Ela desceu arrastando tudo.”

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Auxiliar técnico de manutenção da Vale, Wilson Pereira de Souza estava com a família em um clube, a cerca de 800 metros do local do rompimento, na hora do acidente. “Subiu um poeirão lá”, disse. “Isso não é normal”, imaginou, ao correr com a filha procurando um local mais alto. “Eu sabia que aquilo estava errado.”

“Tem vários amigos entre os desaparecidos”

“A gente não tem informação nenhuma, mas tenho fé que vamos encontrá-lo”, disse Camila de Amorim, de 20 anos, namorada de Everton Guilherme Ferreira Gomes, um dos desaparecidos. Segundo ela, a tragédia aconteceu no primeiro dia de trabalho de Gomes em Brumadinho. “Ele estava muito empolgado, ansioso”, disse. “Quando soube do que aconteceu, liguei para ele, mandei mensagem... No começo, pensei que era um problema de sinal.”

Funcionários da Vale passaram a tarde procurando colegas nos pontos de informações e resgate da operação montada pelos órgãos de segurança e Defesa Civil. A empresa oferece acomodação em hotéis e apoio psicológico em um centro improvisado, ao lado de uma UPA.

Ainda assim, o dia foi de perplexidade e dúvidas. “Tem vários conhecidos e amigos nossos entre os desaparecidos”, contou Wilson Pereira de Souza, conversando na porta do hospital. “Você viu, está lá o Weberth, o Alano, a Angelita...”. Nas redes sociais, amigos publicaram telefones dos desaparecidos na tentativa de localização. Muitos, em vão.

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Números

Até a noite desse sábado (26), são 256 os desaparecidos. Há ainda 23 pessoas hospitalizadas. Os mortos, por sua vez, chegaram a 34. Com reforço de equipes do Rio e de Goiás, cerca de 220 homens estarão trabalhando nos resgates neste domingo (27). Os bombeiros utilizam câmeras com sensor de calor para tentar achar vítimas. A partir de segunda-feira (28), com a lama mais sólida, serão usados cães farejadores.