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Bancada feminina da Câmara une esquerda e direita
Deputadas federais durante reunião em 2019: união em que as diferenças ideológicas são respeitadas.| Foto: MJS/Agência Câmara

Existe um ambiente na Câmara dos Deputados em que bolsonaristas e petistas sentam à mesma mesa e onde as diferenças ideológicas são posicionadas em segundo plano. Há reuniões periódicas para diálogo e até um grupo de Whatsapp para troca de ideias. Parlamentares se unem pelo que têm em comum e lutam por causas conjuntas. Esse ambiente é a bancada feminina.

São 77 as deputadas atualmente com mandato na Câmara, o que corresponde a 15% do total da Casa. Elas se distribuem por praticamente todos os partidos, indo desde a direita bolsonarista até a esquerda, com Psol e PCdoB.

Ao longo de 2019, o grupo se destacou por mostrar solidariedade e atuar de modo conjunto em situações que mobilizaram as mulheres do parlamento. Uma ocasião de união entre as deputadas foi durante a reforma da Previdência. Parlamentares de diferentes partidos – inclusive de siglas favoráveis à reforma – reivindicaram pontos favoráveis às mulheres, como a eliminação de restrições ao pagamento de pensões por morte e o ajuste na fórmula do cálculo do benefício após 15 anos de contribuição. O engajamento foi liderado pela coordenadora da bancada feminina, Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), que é do mesmo partido do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Outro momento em que a unidade da bancada feminina se manifestou foi quando a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) fez um discurso, no início de novembro, em que declarou ter sido vítima de ataques machistas na internet. Na ocasião, a parlamentar havia acabado de romper com o presidente Jair Bolsonaro, de quem foi líder no Congresso. Joice, no pronunciamento, disse que “todas se solidarizaram; todas”. A expectativa das parlamentares é que em 2020 a mobilização da bancada feminina tenha continuidade.

"Foi uma surpresa positiva"

Deputada de primeiro mandato, Rosana Valle (PSB-SP) diz que a união das mulheres na Câmara foi um dos pontos que mais chamou a sua atenção ao longo de 2019. “Vejo as mulheres se defenderem, com uma ajudando a outra, mesmo que de partidos opostos, sempre que uma sofre alguma afronta. Foi uma surpresa positiva do Congresso”, declarou.

Segundo a deputada, “ainda existe muito machismo” no Congresso. Rosana Valle é titular da Comissão de Viação e Transportes da Câmara, em que a presença feminina é, historicamente, reduzida. “É uma comissão em que se vê muito corporativismo masculino. Preciso bater o pé, empinar o nariz e me posicionar.”

Diferenças na bancada feminina ficam para depois

Parte da pauta feminista, principalmente quando se trata sobre aborto e ideologia de gênero, costuma ser rejeitada por parlamentares de viés conservador. Ainda assim, a união das mulheres na Câmara é celebrada mesmo dentro do bolsonarismo. A deputada Aline Sleutjes (PSL-PR) avalia que “o respeito é muito grande” na bancada. “Nós divergimos, mas isso na hora das votações em plenário, não nas discussões entre as mulheres. Jamais as mulheres se ofendem, jamais as mulheres compram brigas ideológicas para se afastarem”, afirma.

Para Aline Sleutjes, a “harmonia” da bancada feminina não impede discordâncias ideológicas entre as parlamentares. “Há legislações em que a posição do governo é uma e a da esquerda é outra. Eu respeito o posicionamento delas, mas fico com a minha intenção.” A deputada do Paraná também é estreante na Câmara. Iniciou o mandato em 2019, após ter recebido 33.628 votos no ano anterior.

Deputada em terceiro mandato, Margarida Salomão (PT-MG) acredita que, ao longo dos anos, a bancada feminina tem se tornado mais heterogênea. “No meu primeiro mandato, o perfil da bancada era mais uniforme. Havia um grupo maior de parlamentares eleitas pela esquerda. A partir de 2015 já percebi uma diferença, e isso se acentuou agora. São deputadas jovens, de outras origens políticas”, afirma. Mas, segundo Margarida Salomão, a diversificação não impediu que o grupo continue solidário. “É uma bancada de uma coesão muito grande, de uma solidariedade que ultrapassa fronteiras partidárias.”

Quem são as líderes da bancada feminina

Coordenadora da bancada feminina da Câmara, a deputada Dorinha Seabra (DEM-TO) é vista como uma referência pelas parlamentares pelo que elas consideram uma elevada capacidade de diálogo e articulação. “Ela é uma pessoa que tem alinhamento político diferente do meu e não vejo nenhum problema em sentar para conversar com ela”, diz a petista Margarida Salomão.

Outra referência para as mulheres da Câmara é Soraya Santos (PL-RJ). A deputada fluminense é, atualmente, a primeira-secretária da Câmara, a única mulher titular da Mesa Diretora da Casa. Com isso, tem lugar cativo nos debates decisivos do parlamento. “A Soraya sempre se coloca à disposição para nos ajudar”, afirma Rosana Valle (PSB-SP). Segunda suplente da Mesa Diretora, Geovânia de Sá (PSDB-SC) também aparece com destaque entre as mulheres da Câmara. Ela habitualmente preside sessões do parlamento.

Mas nem tudo é perfeito na bancada feminina…

A boa relação entre as mulheres da Câmara, porém, não é imune a arranhões. Embates ideológicos e outros pessoais também foram registrados ao longo de 2019. Durante as discussões para a aprovação da reforma da Previdência, não raras foram as discussões entre deputadas favoráveis e contrárias à alteração no sistema de pagamentos de aposentadorias e pensões.

As brigas mais duras, porém, foram as registradas dentro do PSL, em meio ao racha vivido pelo antigo partido do presidente Bolsonaro desde o segundo semestre do ano passado. As deputadas paulistas Carla Zambelli e Joice Hasselmann trocaram farpas em inúmeras ocasiões – em uma delas, na CPI das Fake News, Joice Hasselmann disse que deveria pedir desculpas por ter contribuído para a eleição de Carla Zambelli, que se beneficiou pelo sistema proporcional. Joice teve 1,078 milhão de votos e ajudou a eleger outros deputados do PSL em São Paulo. Carla Zambelli teve 76,3 mil votos em 2018.

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