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Alexandre Padilha
O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, está confiante na aprovação de pacote fiscal pelo Congresso para manter crescimento da economia em 2024| Foto: Valter Campanato / Agência Brasil.

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, mencionou em uma reunião com prefeitos de São Paulo, em 7 de outubro, a intenção do governo federal de erguer um “tríplex da economia”, formado por crescimento econômico, controle da inflação e redução do desemprego. Segundo ele, essa perspectiva está próxima de se tornar realidade, dependendo só da aprovação ainda neste ano pelo Congresso de propostas focadas na arrecadação de mais impostos, projetando receitas extras de R$ 170 bilhões anuais a partir de 2024.

Mas analistas consultados pela Gazeta do Povo afirmam que o otimismo de Padilha pode sucumbir perante prazos apertados, piora do cenário global e possíveis desentendimentos com o Legislativo, levando ao caos nas contas públicas.

Sem hesitar nomear os três alvos econômicos do governo como “tríplex”, Padilha destaca o progresso desses objetivos, a começar pela expectativa de aprovação da reforma tributária nas próximas semanas. O relatório do senador Eduardo Braga (MDB-MA) será lido em 24 de outubro e a votação em plenário foi marcada para 7 de novembro, retornando depois à Câmara dos Deputados. “Apenas com isso, podemos encerrar o ano com o PIB acima de 3%, a inflação abaixo de 4% e taxa de desemprego inferior a 8%”, estimou o ministro.

Ainda para este mês, Padilha conta com o aval do Congresso à taxação dos fundos exclusivos e dos fundos offshore, que ele chama de “os fundos dos super-ricos”. “A aprovação dessas matérias ainda em 2023 não traz prejuízo para o plano do ministro Fernando Haddad (Fazenda), no rumo de unir responsabilidade social e responsabilidade fiscal, consolidando ambiente favorável à queda de juros e à volta dos investimentos”, disse. Apesar desse discurso, o mercado financeiro vem reduzindo as expectativas de que o governo alcançará o prometido déficit zero no próximo ano.

Marcus Pestana, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), vinculada ao Senado, afirmou, em 10 de outubro, aos membros da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) da Casa estar preocupado com a evolução das contas públicas. Ele lembrou que não por acaso as matérias de maior interesse do governo sob análise no Congresso versam sobre o tema, tais como a reforma tributária, a nova governança do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e o novo arcabouço fiscal. “Este é o principal desafio do governo, porque o desequilíbrio fiscal desenfreado provoca o aumento de sua dívida, além de inflação, juros altos, recessão e desemprego”, alertou.

Analistas de mercado compartilham desse receio com as finanças públicas, sobretudo quando cresce o poder do Legislativo sobre o Orçamento, reduzindo o espaço de manobra do Executivo, além do que se espera de um Banco Central (BC) vigilante. Os primeiros cortes da taxa básica de juros (Selic) tiveram como base o cumprimento das metas fiscais definidas no arcabouço. Mas essa mesma confiança está enfraquecendo e o BC, diante de um eventual surto inflacionário gerado pelo desarranjo fiscal, terá de agir, interrompendo a redução da Selic em meados de 2024.

"Tríplex do Guarujá"

A nomenclatura "tríplex" para as medidas econômicas faz lembrar o escândalo do apartamento no Guarujá (SP), que levou à condenação de Lula à pena de cerca de nove anos de prisão.

Mas, em abril de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro para julgar o caso do tríplex. Dessa forma, a Corte anulou a condenação de Lula e encaminhou a investigação para a Justiça Federal em Brasília. O processo deveria começar do zero, sem as provas colhidas pela Lava Jato de Curitiba.

Posteriormente, em janeiro de 2022, a 12ª Vara Federal Criminal de Brasília determinou o arquivamento da ação contra Lula no caso do "tríplex do Guarujá". O pedido para arquivar o processo partiu da Procuradoria da República no Distrito Federal, que apontou a prescrição das acusações contra o petista apontadas pela Operação Lava Jato.

Guerra no Oriente Médio e juros americanos expõem risco fiscal

A possibilidade de uma escalada no conflito entre Israel e Hamas, abrangendo também o Irã, já encabeça as preocupações dos investidores em mercados de países emergentes. Depois do ataque do Hamas, em 7 de outubro, a subida dos juros americanos e a desaceleração da China começaram a ficar em segundo plano. O temor é de que o Brasil, caso fique mais desorganizado na questão fiscal, também amplie a fragilidade diante de cenários externos.

Perguntado sobre os impactos da guerra no Oriente Médio sobre a economia nacional, uma vez que o conflito já está provocando aumentos do preço do petróleo, projetando aumento de inflação e de juros nos Estados Unidos, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que “não é hora de tomar decisões precipitadas”.

A pesquisa mensal de risco político do mês de outubro, produzida pela consultoria internacional BCW Brasil, revelou que medidas como o arcabouço fiscal, além da retração do desemprego e da melhora da confiança do consumidor, ajudaram a afastar o pessimismo inicial com o governo Lula. Mas, no quadro atual, há grande expectativa com a necessidade de o governo aprovar projetos para recompor receitas e alcançar a meta de deficit zero em 2024. Para o diretor de Public Affairs [Assuntos Públicos] da consultoria, Eduardo Galvão, os desafios fiscais futuros continuam e dúvidas sobre a política fiscal “tendem a gerar pressões no cenário político brasileiro”.

A arrecadação federal de impostos não acompanhou a aceleração do crescimento da economia, resultando em um rombo de R$ 104,6 bilhões nos primeiros oito meses do ano, o maior registrado no início de um novo mandato desde a implementação do Plano Real. As projeções dos analistas indicam que o déficit federal para 2024 deve chegar a R$ 80 bilhões, o que seria considerado um fracasso já no primeiro ano sob o novo marco fiscal. Como resultado, é esperado que a dívida pública continue a crescer em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), dos atuais 74% rumo aos 80%.

A percepção de risco fiscal também poderá pressionar o real e dar impulso ao dólar. Investidores ainda têm dúvidas se o governo vai conseguir aprovar no Congresso as medidas propostas para aumentar a arrecadação. Nesse ponto, gera desconforto a disputa entre o Ministério da Fazenda, que deseja manter a meta de déficit zero, e os setores do governo e do Congresso que pleiteiam flexibilização das metas, leia-se liberação de mais recursos em ano eleitoral. Em paralelo, a fuga de capitais para o mercado americano, onde as taxas de juros atingiram níveis recordes, seguirá desafiando a economia.

O indicador positivo vem da balança comercial, sobretudo do agronegócio, que tem compensado em parte essa fuga de dólares. O saldo do comércio exterior em 2023 poderá passar de US$ 90 bilhões, o maior da história.

Prazo curto para votação força busca por definir prioridades

De acordo com Marcus Deois, diretor da consultoria Ética, os feriados que ocorrem em outubro e novembro criam obstáculo para o progresso das principais agendas econômicas do governo. Ele explicou que isso resultou em uma corrida contra o tempo e em um esforço altamente complexo para estabelecer quais são "as prioridades entre as prioridades".

Uma delas é a votação do pacote tributário-arrecadatório, que abrange a tributação de fundos exclusivos, destinados a pessoas com alto patrimônio, bem como de juros sobre capital próprio e de incentivos fiscais relacionados ao imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS).

Outro tema de grande preocupação para o governo e que está previsto para avançar é a redução do imposto municipal (ISS), a renovação da desoneração da folha de pagamento para 17 setores da economia, os incentivos às superintendências da Amazônia (Sudam) e Nordeste (Sudene) e os vetos do governo à chamada Lei do Carf.

O êxito da reforma tributária (PEC 45/2019) no Senado depende, por sua vez, do relatório elaborado pela senador Eduardo Braga (MDB-AM), levando em conta que o seu teor determinará quais atores econômicos se mobilizarão a favor ou contra o texto. Marcus Deois observou ainda que essa dinâmica terá um impacto direto na velocidade de tramitação da proposta.

O primeiro mandato de Lula se beneficiou do chamado "tripé econômico" da Era FHC, que tinha os pilares: câmbio flutuante, meta de inflação e meta fiscal. Esses fundamentos garantiram estabilidade e crescimento do país naquela época. O “tríplex” econômico está voltado para resultados e não nos meios, que deveriam incluir também o controle de gastos e não apenas os ganhos de receita com inclusão de novas fontes.

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