Conselheiro do CNJ, Luís Geraldo Lanfredi, defende atuação mais presente do Estado dentro dos presídios para combater facções| Foto: Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ

A atuação de facções criminosas dentro dos presídios no Brasil não é novidade, embora tenha ganhado mais atenção nos últimos meses, desde que o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, elencou como uma de suas prioridades o combate às organizações criminosas. Brigas entre facções rivais, ou conflitos causados por rachas internos nestes grupos, são as principais causas de massacres como o que ocorreu recentemente em presídios do Amazonas e muito já se falou sobre combater facções prisionais para aliviar o problema crônico de segurança pública enfrentado pelo país.

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Para o juiz-coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (DMF) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Luís Geraldo Lanfredi, mais do que combater a atuação das facções, é preciso que o Estado pare de trabalhar para seu fortalecimento. “Como nós trabalhamos para fortalecer facções? Quando efetivamente nós não colocamos dentro dos presídios as pessoas certas”, defende o juiz auxiliar.

O enfrentamento de facções criminosas que atuam dentro dos presídios brasileiros passa, necessariamente, por repensar o modelo de encarceramento no país, na visão de Lanfredi. Para ele, é preciso uma aposta maior em penas e medidas alternativas, para que a prisão seja vista como último recurso.

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“Uma vez isso acontecendo, tendo ali dentro [da prisão] realmente as pessoas em menor número, em condições de serem trabalhadas não em ambiente de superpopulação, mas com intervenções específicas e que possam realmente demovê-las de todo e qualquer comportamento que seja criminoso, aí efetivamente vamos estar trabalhando a perspectiva de recuperação dessas pessoas para o convívio social”, argumenta o juiz auxiliar.

Políticas públicas e ressocialização

Para Lanfredi, o Estado errou ao deixar de aplicar políticas públicas dentro dos presídios, criando um vácuo que atualmente é ocupado por facções prisionais, como PCC, Comando Vermelho, entre outras.

“As facções têm a sua autonomia e sua consideração ali dentro, primeiro porque ocupam o lugar que o Estado não ocupa”, avalia o juiz auxiliar do CNJ. “Quando se fala em defesa da dignidade das pessoas presas, não é querer criar melhores condições para aquelas pessoas do que aquelas que estão em liberdade. Na verdade, é o Estado, garantindo a proteção dessas pessoas, poder ocupar presença e ter ali uma posição que não permita, por exemplo, que uma facção possa prometer a essas pessoas coisas que o Estado deveria fornecer”, completa Lanfredi.

“Por exemplo, uma pessoa que entra em um estabelecimento penal, não entra com kit de higiene, não entra com nenhum tipo de preocupação em relação a seus familiares e, muitas vezes, o suporte, quem vai dar para essa pessoa são as facções criminosas que têm um poder econômico considerável”, ressalta o coordenador do DMF.

Nesse sentido, outro ponto que deve ser levado à sério pelo Brasil para lidar com a crise no sistema prisional é a ressocialização de quem deixa a prisão. “Hoje, segurança pública não dá mais para se pensar simplesmente na perspectiva de se prender alguém. Temos que ressignificar a trajetória de vida dessas pessoas para que essas pessoas não retornem ao ambiente prisional, não voltem a praticar novos crimes e com isso estaremos trabalhando na perspectiva de sociedades mais seguras e pela participação social”, resume Lanfredi.

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Para ele, é necessário investir em uma rede assistencial de apoio para quem termina de cumprir pena e deixa o sistema prisional. “Nós cobramos, muitas vezes, reintegração dessas pessoas, mas nós nos esquecemos que quando elas saem dos presídios, depois de tempos ali sob a proteção do Estado, sequer o Estado providencia para essas pessoas documentos”, aponta. “Sem documentos você não consegue abrir uma conta, não consegue, sem uma carteira de trabalho, ser contratado para o desempenho de uma atividade lícita”, exemplifica o conelheiro.

“Cabe a nós provemos essa rede, trabalhar pelo fortalecimento dessa rede e prover em assistência a essas pessoas para que possamos quebrar esse ciclo de violência e esse ciclo de reincidência e fazer com que a reintegração social passe de uma promessa retórica e seja algo efetivo e pragmático na vida de cada uma dessas pessoas”, defende Lanfredi.

Justiça Presente

Para superar a crise no sistema prisional, o CNJ firmou uma parceria com o  Programa das Nações Unidas para Desenvolvimento (PNUD). A parceria tem como objetivo a redução da superlotação; o uso da tecnologia para promoção da cidadania; implementação de medidas voltadas à promoção da cidadania nos espaços prisionais e da política de reinserção social para presos; e atenção ao sistema socioeducativo.

Uma das metas da parceria é implementar, até o final do ano, um Cadastro Nacional de Presos em todo o país. O cadastro vai servir para monitoramento, em tempo real, de quais presos já têm condições de progredir de regime ou deixar de vez a prisão, além de fornecer dados sobre a população carcerária.

A partir do ano que vem, o CNJ também pretende iniciar um cadastro biométrico de todos os presos do país. A medida vai auxiliar, por exemplo, no fornecimento de documentos para quem deixa o sistema prisional.

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