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Ministro Marco Aurélio deixa o STF depois de 31 anos como ministro da Corte.
Ministro Marco Aurélio deixa o STF depois de 31 anos como ministro da Corte.| Foto: Carlos Moura/STF

Prestes a completar 75 anos, o ministro Marco Aurélio deixa o Supremo Tribunal Federal (STF) na próxima segunda-feira, dia 12 de julho. Com isso, uma nova vaga se abre na Corte e a indicação será feita pelo presidente Jair Bolsonaro. Nesta terça-feira (6), o presidente sinalizou a aliados que o advogado-geral da União, André Mendonça, será o escolhido.

Com 31 anos de STF, Marco Aurélio é considerado um dos ministros mais garantistas da Corte e ao longo da carreira ficou marcado por decisões polêmicas e controversas. Entre elas, a concessão de liberdade para o ex-goleiro Bruno, a liminar que afastou o senador Renan Calheiros (MDB-AL) da presidência do Senado e, mais recentemente, ao colocar em liberdade o traficante André do Rap, ligado à facção criminosa PCC em São Paulo.

Desde o início da gestão Bolsonaro, em 2019, o decano do STF teve atuação marcada entre decisões favoráveis e contrárias ao Palácio do Planalto. Além disso, optou por moderar suas críticas ao presidente durante as crises entre a Presidência da República e a Suprema Corte ao longo deste período.

“A crítica é sempre possível, mas a crítica pela crítica é ruim. Evidentemente, ele [Bolsonaro] precisa de tranquilidade para buscar o melhor para o Brasil. Não vejo com bons olhos a crítica exacerbada e desarrazoada”, disse Marco Aurélio em entrevista ao programa CB Poder nesta terça-feira (6).

Nos primeiro ano do mandato do presidente, Marco Aurélio chegou a "dar um puxão de orelha" em Bolsonaro ao afirmar que o presidente não estava mais em campanha e precisava governar para todos. Neste episódio, o magistrado comentou um vídeo compartilhado por um perfil oficial do presidente no qual o STF é mostrado como uma das “hienas” que atacavam o “leão Bolsonaro”.

“A responsabilidade dele é ainda maior, porque quando o presidente fala, a voz dele ressoa. Eu acho que está na hora de temperança nas coisas que se diz. O Brasil precisa de trabalho, e acaba que o que ele faz se perde com essas bobagens”, ponderou o ministro naquela época.

Com o fim da carreira de Marco Aurélio, Bolsonaro tem a chance de indicar mais um ministro para o Supremo a seu gosto — o primeiro foi o então desembargador Kassio Nunes Marques, em novembro de 2020. Isso seguramente gera um ganho político ao presidente. Levantamento da Folha de S. Paulo mostrou que Nunes Marques já se posicionou ao menos 20 vezes a favor do governo desde que chegou ao tribunal.

Por outro lado, o Planalto perde na Corte uma voz ponderada e calcada na letra fria da Constituição, avessa a justiçamentos e ativismos que tanto marcaram a conduta do STF nos últimos anos, e não influenciável pela opinião das ruas ou de seus pares. Relembre a seguir algumas decisões de Marco Aurélio que agradaram ou desagradaram o Palácio do Planalto:

Indenização da deputada Maria do Rosário

Em fevereiro de 2019, Marco Aurélio negou um recurso do presidente Jair Bolsonaro e manteve decisão que o condenava ao pagamento de R$ 10 mil, a título de danos morais, à deputada Maria do Rosário (PT-RS). A condenação é referente ao episódio em que Bolsonaro, quando deputado, disse que "ela não merecia" ser estuprada por ser "feia".

No mesmo despacho, Marco Aurélio também aumentou o valor que Bolsonaro deveria pagar como honorários à defesa da petista, de 10% para 15% do valor da indenização. Além disso, o ministro afirmou que não era possível o reexame dos elementos probatórios e determinou que o presidente se retratasse em um jornal de grande circulação e em sua página oficial no Facebook.

Marco Aurélio votou contra inquérito das fake news

Marco Aurélio foi o único integrante do Supremo a votar contra a abertura do inquérito das fake news, em 2020, que incomodava o Palácio do Planalto. Para o ministro, a Corte não podia responder pela autoria do inquérito. Esse era o principal argumento dos críticos da iniciativa, os quais destacam que a situação é incomum. Isso porque o Judiciário não é o órgão que, tradicionalmente, conduz investigações. Em geral, a atribuição fica a cargo da polícia, no caso de um inquérito policial, ou do Ministério Público (MP), quando se instaura uma apuração civil.

O processo ganhou força e destaque, principalmente depois que o ministro do STF Alexandre de Moraes autorizou uma operação da Polícia Federal deflagrada contra apoiadores de Bolsonaro na internet, acusando esses alvos de produzirem e promoverem notícias falsas e ofensas contra a Corte e seus ministros. Mesmo sendo voto vencido entre os demais ministro, Marco Aurélio classificou o inquérito do  “fim do mundo”.

"Estamos diante de um inquérito natimorto", afirmou Marco Aurélio destacando ainda que ele é "uma afronta ao sistema acusatório do Brasil" e que "magistrados não devem instaurar [inquéritos] sem previa percepção dos órgãos de execução penal".

Interferência de Bolsonaro na PF

Em setembro de 2020, Marco Aurélio suspendeu o andamento do inquérito contra Bolsonaro que apurava acusações de interferência na cúpula da Polícia Federal até que o plenário se manifestasse sobre o caso. O inquérito completou um ano em abril deste ano e até o momento os ministros da Corte ainda não chegaram a um consenso sobre como deve ser o depoimento de Bolsonaro — se presencialmente ou por escrito.

Sobre este episódio, Marco Aurélio se manifestou favorável à possibilidade de Bolsonaro prestar seu depoimento de forma escrita, tese defendida pela defesa do presidente. Na sua argumentação, o ministro ressaltou que uma testemunha, quando é convocada a depor, precisa se comprometer a falar a verdade. Se mentir, pode responder criminalmente. O investigado (caso de Bolsonaro) não é nem mesmo obrigado a falar, podendo se reservar ao direito de permanecer em silêncio. Por isso, segundo avaliação de Marco Aurélio Mello, o depoimento de Bolsonaro pode ser por escrito.

O inquérito foi aberto a partir de denúncia do ex-ministro Sergio Moro, quando pediu demissão do Ministério da Justiça e Segurança Pública. O ex-ministro afirmou que Bolsonaro tentava interferir politicamente na PF.

Bloqueio nas redes sociais

Ainda em 2020, Marco Aurélio votou a favor de que o presidente Bolsonaro desbloqueasse o acesso, ao seu perfil em uma rede social, de um advogado que fez críticas à sua atuação em relação à Polícia Federal. Para o magistrado, o presidente não podia atuar como "censor de declarações em mídia social".

"Não cabe, ao Presidente da República, avocar o papel de censor de declarações em mídia social, bloqueando o perfil do impetrante, no que revela precedente perigoso", afirmou o ministro em seu voto.

A conclusão do julgamento ainda não ocorreu por parte dos demais ministros do STF. Além de Marco Aurélio, apenas a ministra Cármen Lúcia já se manifestou na ação e de forma favorável ao advogado.

Pedidos de afastamento de Bolsonaro na pandemia

Em meio à pandemia do novo coronavírus, Marco Aurélio arquivou mais de cinco pedidos de afastamento contra o presidente Jair Bolsonaro por conta das medidas adotadas pelo Executivo no controle do vírus. Nos pedidos arquivados, Aurélio afirmou que são ausentes os "elementos, nos fatos narrados e no contexto fático, indicativos do cometimento de infração penal pelo Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, cumpre acolher a manifestação do Vice-Procurador-Geral da República", que pediu pelo arquivamento.

Em abril deste ano, Marco Aurélio acabou escolhido relator de uma ação impetrada por Bolsonaro contra restrições adotadas pelos governadores do Distrito Federal, da Bahia e do Rio Grande do Sul. O ministro acabou rejeitando a ação e criticou o chefe do Executivo pela falta de trabalho em conjunto com os governos estaduais ao longo deste período de pandemia.

“É impróprio, a todos os títulos, a visão totalitária. Ao presidente da República cabe a liderança maior, a coordenação de esforços visando o bem-estar dos brasileiros”, escreveu Mello no seu despacho.

O decano ressaltou que o governo federal, estados e municípios têm competência para adotar medidas para o enfrentamento da pandemia. “Há um condomínio, integrado por União, estados, Distrito Federal e municípios, voltado a cuidar da saúde e assistência pública”.

Em recente entrevista ao programa Roda Viva, Marco Aurélio disse que era preciso aguardar e “marchar com segurança” em relação aos supostos crimes de responsabilidade praticados por Bolsonaro. “Os brasileiros escolheram esse presidente, ele ocupa a cadeira, e que ele seja feliz na prática dos atos administrativos”, afirmou.

Segundo ele, a negação da gravidade da Covid-19 feita pelo presidente no começo da pandemia causou uma “sinalização de insegurança”. “Evidentemente quando o presidente negou a existência da pandemia, nós ficamos a reboque, inclusive quanto à aquisição de vacinas. O ideal seria realmente termos vacina para todos, indistintamente. Mas não é o que ocorre”.

Marco Aurélio e o Censo 2021

Em outro revés para o Palácio do Planalto, Marco Aurélio concedeu uma liminar em abril deste ano, obrigando o governo federal a realizar o Censo demográfico, por meio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas(IBGE), ainda em 2021. O Ministério da Economia havia suspendido a realização do projeto alegando falta de recursos.

"A União e o IBGE, ao deixarem de realizar o estudo no corrente ano, em razão de corte de verbas, descumpriram o dever específico de organizar e manter os serviços oficiais de estatística e geografia de alcance nacional – artigo 21, inciso XV, da Constituição de 1988. Ameaçam, alfim, a própria força normativa da Lei Maior", disse o ministro do Supremo.

A decisão de Marco Aurélio acabou referendada pelos demais ministros da Corte. No entanto, por sugestão do ministro Gilmar Mendes, a Corte estabeleceu que o Censo poderá ser realizado até 2022. Inicialmente, o levantamento de dados por parte do IBGE deveria ter ocorrido em 2020, mas foi adiado por conta da pandemia.

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