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Plenário da Câmara dos Deputados - pauta do congresso
Plenário da Câmara dos Deputados.| Foto: Gustavo Lima / Câmara dos Deputados

A "bancada liberal" do Congresso Nacional prevê uma próxima legislatura de baixa produtividade em termos de aprovação de propostas legislativas. A aposta de parlamentares é de desafios em avançar pautas de desestatização, melhorias do ambiente de negócios e ganhos de competitividade durante os quatro anos do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O deputado federal Gilson Marques (Novo-SC), coordenador da Frente Parlamentar pelo Livre Mercado, classifica como "desanimador" o cenário para os próximos quatro anos. "Saímos de um ambiente em que era possível apresentar e até aprovar pautas propositivas, como a [a lei da] liberdade econômica, a [reforma da] Previdência, e algumas privatizações, ainda que tímidas. E vamos para um cenário em que ficaremos com o freio de mão [puxado]", lamenta.

De 45 propostas da agenda legislativa apresentada pela Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo em junho de 2021, 20 foram aprovadas ou implementadas integralmente, enquanto 11 foram aprovados em ao menos uma das Casas do Congresso. Coordenador da frente e relator da PEC que originou a Lei da Liberdade Econômica, o deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS) prevê uma conjuntura de "contenção de danos" para a próxima legislatura.

"Não vejo um resultado nestes quatro anos de diminuição do Estado, a característica do governo não é essa. O papel da bancada liberal será tentar diminuir o tamanho dos estragos. Vai haver o debate, a discussão, mas não será um governo com ambiente favorável para seguirmos avançando na questão da melhoria do ambiente de negócios", pondera. A atuação contra as hipóteses de revogação da Lei das Estatais e da reforma trabalhista são alguns exemplos da contenção de danos defendida por liberais.

Mesmo o aumento do protagonismo do Legislativo em relação ao Executivo pode ser insuficiente para que a bancada liberal tenha uma produtividade próxima em relação à atual legislatura, analisa Goergen. "O Congresso não é muito liberal, ele sempre gosta de uma 'intervençãozinha', e não adianta propor muita lei perante um governo não-liberal. A ideia é tentar evitar muitas vezes que se aprove algo do que aprovar em um governo como esse", pondera o parlamentar, em referência ao risco de alterações a uma proposta liberal.

Gilson Marques concorda com a análise. Para ele, mesmo a aprovação de reformas tributária ou administrativa na próxima legislatura poderia trazer mais riscos do que benefícios. "Muito provavelmente será para piorar, mas, aos olhos de um desavisado, isso vai parecer positivo. No entanto, nada é tão ruim que não possa piorar", comenta. "Muito provavelmente não vale nem perder tempo em tentar aprovar algo e ser propositivo porque perdíamos força para conter o dano do pacote de maldades que terá todo dia", avalia.

O que pode ser discutido pela bancada liberal ao longo do governo Lula

Apesar dos desafios, o analista político Luan Sperandio, cofundador do Instituto Livre Mercado, avalia que algumas pautas liberais podem ser aprovadas, desde que consensuais com o governo e o Congresso. Ele cita como exemplo o parecer aprovado no Senado do novo Marco Legal das Ferrovias, de autoria do senador Jean Paul Prates (PT-RN), que foi indicado para assumir a Petrobras.

"O volume de concessões de infraestrutura feitos no governo Dilma, por exemplo, foi recorde. Não por ideologia, mas por necessidade de maior atuação da iniciativa privada no segmento, e, para isso, precisa de regras de concorrência e que tragam segurança jurídica", analisa.

Sperandio acredita, porém, que pautas como privatizações seriam mais improváveis de ser aprovadas. "Se tornam mais difíceis de avançar em virtude da necessidade do Executivo fazer estudos técnicos e de modelagem de privatização, ou seja, não depende só do Congresso aprovar", pondera.

A diretora-executiva do Instituto Livre Mercado, Karine Amorim, que faz a secretaria-executiva da Frente Parlamentar pelo Livre Mercado, diz que a agenda da próxima legislatura ainda não foi finalizada, mas informa que está sendo elaborada levando em consideração três eixos principais: a melhoria do ambiente de negócios, o aumento da competitividade e desestatização.

Entre alguns projetos que devem entrar na agenda estão o Código de Defesa do Pagador de Imposto (PLP 17/2022), que recentemente foi aprovado na Câmara dos Deputados e falta ser aprovado no Senado; o projeto de abertura do Mercado Livre de Energia (PL 414/2021); o Projeto de abertura do Mercado Previdenciário (PLP 147/2022).

Já a Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo defende uma agenda legislativa pautada em 12 eixos: acesso a crédito competitivo; simplificação tributária e eliminação da cumulatividade; acesso à educação profissional e tecnológica de qualidade; ampliação e atualização da infraestrutura digital; diversificação da matriz logística nacional com o apoio da iniciativa privada; reorganização da matriz energética para diminuir o custo da energia e o risco de desabastecimento.

Os outros pontos são: modernização da legislação trabalhista para criação de empregos formais; simplificação regulatória, profissionalização e independência das agências reguladoras; integração com economia global; ampliação da eficiência do serviço público brasileiro a partir da transformação digital; melhoria do ambiente de pesquisa, desenvolvimento e inovação; e avanço das políticas públicas de promoção da sustentabilidade e melhoria das regulações ambientais.

Qual é o tamanho da bancada liberal e quais pautas são prioridade

Em termos quantitativos, é imprevisível saber qual será o tamanho da "bancada liberal" na próxima legislatura. A Frente Parlamentar pelo Livre Mercado calcula que, atualmente são 211 deputados federais e 10 senadores. Na Câmara, 112 foram reeleitos, três se elegeram para o Senado e 96 não foram reeleitos.

Apesar da "perda" de parlamentares liberais para a próxima legislatura, a diretora-executiva do Instituto Livre Mercado, Karine Amorim, calcula que o número será mantido com a eleição dos deputados eleitos. " Já no Senado, a expectativa é que o número atual de membros irá ao menos dobrar", prevê.

O instituto mapeou alguns nomes eleitos que têm a defesa do livre mercado de forma mais explícita e entende que parlamentares de partidos mais à direita são mais propensos a integrar a bancada liberal. Porém, um cálculo mais preciso será alcançado apenas no início da próxima legislatura.

Entre deputados federais eleitos, acredita-se que Any Ortiz (Cidadania-RS), Rosângela Moro (União Brasil-SP), Deltan Dallagnol (Podemos-PR), Gustavo Gayer (PL-GO), Maurício Marcon (Podemos-RS), Mendonça Filho (União Brasil-PE), Nikolas Ferreira (PL-MG) e Ricardo Salles (PL-SP) assumirão papeis de destaque na defesa da agenda liberal.

Já os senadores eleitos Efraim Filho (União Brasil-PB), Hamilton Mourão (Republicanos-RS), Jorge Seif (PL-SC), Rogério Marinho (PL-RN), Sérgio Moro (União Brasil-PR) e Tereza Cristina (PP-MS) podem se unir aos demais parlamentares.

A expectativa é de que os parlamentares eleitos engrossem a bancada liberal composta por lideranças como Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), Marcel van Hattem (Novo-RS), Kim Kataguiri (União Brasil-SP), Adriana Ventura (Novo-SP) e Gilson Marques.

Vice-presidente da Frente Parlamentar pelo Livre Mercado, Kataguiri promete uma "defesa intransigente" do equilíbrio fiscal e contrária à paralisação das privatizações, e também promete atuar contra o aumento do endividamento público, da inflação e das taxas de juros. "E é uma agenda que deve estar bastante presente, assim como o combate à corrupção, a defesa do Estado de Direito também deve ser uma bandeira liberal. Podem esperar a mesma postura combativa de sempre, de obstrução e resistência mesmo a pautas ruins e negativas que venham do governo", destaca.

Quais outros desafios da bancada liberal no Congresso

O deputado federal Daniel Coelho (Cidadania-PE) entende que a bancada liberal tem mais desafios do que a defesa de bandeiras associadas à liberdade econômica, que, de praxe, costuma atrair o apoio de uma parcela dos conservadores na política brasileira. Outras pautas, porém, não costumam ter o mesmo apreço.

"Existe o desafio da bancada liberal ter nitidez do que representa ser liberal, do que representa uma agenda liberal, e do que representa a agenda populista conservadora e, muitas vezes, antidemocrática, que, inclusive, mantêm-se de pé no cenário pós-eleitoral defendendo intervenção militar e não só isso, mas também outras agendas que são completamente contraditórias", pondera.

Ex-presidente da Frente Parlamentar pelo Livre Mercado, Coelho também defende que a bancada liberal defenda a estabilidade econômica e fiscal, uma "distância correta" entre o Estado e a iniciativa privada, como uma agenda da defesa do empreendedorismo e da geração de emprego e das liberdades.

O deputado Gilson Marques entende que, mesmo mais à direita, o novo Congresso não assegura um amplo engajamento da defesa das bandeiras liberais. O parlamentar do Novo exemplifica sua análise com a Medida Provisória (MP) 1058/21, que recriou o Ministério do Trabalho.

"Foi uma votação enigmática, onde somente 21 deputados votaram contra. Por isso, uso como exemplo e sempre digo que só tínhamos 21 deputados liberais. Liberal que se preze não vai votar a favor de recriar um ministério, muito menos o do Trabalho", destaca.

O deputado Kim Kataguiri admite que, em assuntos de ajustes mais impopulares e conceituais, a bancada liberal pode chegar a apenas 15 deputados. Mas acredita que é possível ter uma votação mais expressiva em outras pautas mais liberais, como criação ou aumento de novos impostos, ou mesmo em avanços sobre o agronegócio. "No uso político das empresas estatais, especialmente empréstimos do BNDES, é outra pauta que extrapola a bancada liberal [e poderia gerar um apoio mais expressivo].

Apesar de ser uma bancada pequena, pontualmente em algumas pautas, pode ter protagonismo relevante em barrar algumas agendas que o governo vai avançar", diz Kataguiri. "Regulamentação de rede social, e de relacionamento de trabalho por aplicativo, só quem é liberal vai ser contrário. Revogação da reforma trabalhista também talvez teria bastante resistência", afirma.

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