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Delação envolvendo Rui Costa pode respingar em Lula
Delação envolvendo Rui Costa, ministro da Casa Civil, pode respingar em Lula| Foto: RICARDO STUCKERT/Presidência da República

Após uma semana marcada por notícias desfavoráveis ao governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) encontra-se diante do desafio de avaliar os danos, os riscos iminentes e as possíveis saídas para otimizar a sua atuação nas eleições municipais de outubro.

Contrariando suas expectativas, emergiram fatos que ampliaram a atmosfera de pessimismo em torno da gestão petista e deram munição aos seus adversários, como as preocupações expressas pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, acerca da trajetória das finanças públicas. Além disso, os últimos dias foram dominados pela denúncia contra o filho mais novo de Lula de agressão à ex-mulher, o voto do relator no julgamento de Sergio Moro (União Brasil-PR) na Justiça eleitoral – contrário à cassação do senador – e as disputas internas e especulações sobre uma possível troca no comando da Petrobras.

Mas o fato mais preocupante para Lula, amplamente divulgado pela imprensa, diz respeito à denúncia envolvendo o ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), quando era governador da Bahia, relacionada a desvios na compra de respiradores durante o ápice da pandemia da Covid-19. O resgate deste escândalo pode se intensificar em meio à batalha eleitoral e ainda alimentar divergências internas.

O governo encontra-se dividido em dois polos: um liderado pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda), que busca o ajuste fiscal, e outro composto por Rui Costa e líderes petistas que buscam expandir gastos por motivos eleitorais. Na quinta-feira (4), durante evento em Pernambuco, o presidente buscou baixar as tensões contra Costa e tratou de expressar elogios a ele, a quem chamou de “primeiro-ministro” e interlocutor do governo com os governadores.

A deterioração dos indicadores fiscais, acompanhada pela sequência de pesquisas de opinião que apontam queda na popularidade de Lula, forma o pano de fundo das crescentes dificuldades do governo para melhorar as relações com o Congresso e conter crises, muitas delas motivadas pelo chamado “fogo amigo”.

O Planalto tem apenas três meses para negociar a aprovação de projetos de sua agenda legislativa devido às limitações do calendário eleitoral. Nesse sentido, tudo que o chefe do Executivo não precisava agora era de uma denúncia de corrupção envolvendo o chefe da Casa Civil, que atua como gerente do restante do ministério.

O presidente é muito grato a Rui Costa pelo apoio importante que teve das urnas na Bahia, maior reduto petista dentre os estados. Lula tem também resistido a sacrificar os companheiros mais leais, sobretudo os que ficaram ao seu lado quando esteve preso em Curitiba. Essa proteção ao ex-governador vai depender do avanço das investigações e da repercussão política do episódio envolvendo justamente o tema mais sensível para a gestão de Jair Bolsonaro (PL), antecessor de Lula, envolvendo a reação dos serviços de saúde pública às demandas excepcionais da pandemia.

Delação à PF complica a situação de Rui Costa

Segundo o caso revelado pela revista Veja, a empresária Cristiana Prestes Tadeo, da Hempcare, empresa que vende remédios à base de canabidiol, citou Rui Costa em delação premiada, na investigação da Polícia Federal (PF) que apura fraude na compra de respiradores durante a crise sanitária, em 2020.

O ministro nega envolvimento, mas o assunto é muito incômodo para o Planalto. A Hempcare recebeu adiantado R$ 48 milhões do governo da Bahia, mas não entregou nenhum respirador. A empresária devolveu R$ 10 milhões aos cofres públicos, como contrapartida para ter benefícios processuais, além de dar detalhes e entregar documentos que comprovariam as irregularidades.

Para piorar a situação do ministro, o ex-secretário da Casa Civil do governo baiano, Bruno Dauster, disse à PF que Costa deu sinal verde para avançar nas tratativas com a Hempcare. O então governador, segundo disse aos investigadores, passou o contato de Dauster à empresa de apenas dois funcionários e capital social de R$ 100 mil.

Devido ao inquérito vazado, cresce a tensão entre Costa e o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, mantido pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski. O ex-governador já vinha sendo alvo de muitas reclamações de colegas de Esplanada e líderes partidários em razão de seu estilo "autoritário".

O governo teve sorte de as notícias encontrarem um Congresso desmobilizado, com sessões suspensas na Câmara e baixíssima presença no Senado. Apesar disso, a oposição deverá fazer muito barulho nos próximos dias e os aliados do Centrão do governo se aproveitarão do abalo para aumentar o poder de barganha.

Em 2021, deputados e senadores agora na oposição já haviam tentado, sem sucesso, investigar por meio da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid as denúncias envolvendo compras fraudadas do Consórcio do Nordeste, que reúne os governos estaduais da região e era presidido por Rui Costa, sendo impedidos pelos hoje governistas.

Crise de reputação pode atrapalhar planos do PT

O diretor da BCW Brasil Eduardo Galvão avalia que a implicação do ministro da Casa Civil no suposto esquema dos respiradores pode prejudicar a imagem do governo. “Essas alegações trazem de volta à tona questões de corrupção, um tema sensível que tem sido um ponto crítico na política brasileira recente, e abrem espaço para referência aos escândalos nas gestões anteriores do PT”, sublinhou.

Para o também professor de Relações Governamentais e Políticas Públicas do Ibmec-DF, se essas acusações ganharem mais credibilidade ou atenção midiática, poderão afetar a confiança e a reputação da administração federal.

Para Galvão, esses eventos podem agravar a situação de queda de popularidade, contribuindo para a percepção de instabilidade ou incompetência no Executivo e diminuindo a influência do presidente nas urnas de 2024.

“Os episódios são uma pedra no sapato para a gestão da reputação do governo Lula, especialmente no contexto da preparação para as próximas eleições”, sublinhou. “Por isso, o governo precisará gerenciar cuidadosamente essas questões para mitigar possíveis danos”.

O cientista político Leandro Gabiati, diretor da Dominium Consultoria, concorda que a situação do Rui Costa certamente foi uma notícia negativa para o governo, sobretudo quando está com problemas nas pesquisas de opinião. Mas apesar disso, ele não acredita que a suspeição descambará em uma grande crise para o Planalto. Depois de o Congresso ter parado pelas negociações em torno da janela partidária, a oposição explorará esse caso a partir da próxima semana.

“A minha aposta é que o evidente desgaste do governo no episódio não avançará muito mais. Outras notícias polêmicas deverão surgir nos próximos dias e, de certa forma, vão encobrir o vazamento do inquérito dos respiradores”. avaliou. Um sinal disso está no rumor de eventual troca do presidente da Petrobras, Jean-Paul Prates (PT) e o risco de o ministro Fernando Haddad (Fazenda) judicializar a cobrança de impostos de municípios.

Já o analista político Daniel Contreira, da BMJ Consultoria, ainda considera cedo para se avaliar os efeitos possíveis do escândalo dos respiradores na Bahia, mas um dos mais importantes deverá recair sobre o PT baiano.

“O partido tem uma capilaridade muito relevante no estado e o impacto dessa crise no eleitorado é difícil de mensurar num primeiro momento. É um fato novo que pode ser administrado, tendo em vista o tamanho do partido. Mas será preciso muita atenção para não se tornar problema maior em duas semanas ou um mês”, disse.

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