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homem empunha arma de fogo
Ações previstas no pacote anticrime que endureciam o trato com líderes do crime organizado foram retirados ou abrandados pelo grupo de trabalho da Câmara.| Foto: Lunae Parracho/AFP

Os deputados que analisam o pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, impuseram uma nova derrota ao relatório apresentado pelo deputado Capitão Augusto (PL-SP), nesta quarta-feira (18). O grupo de trabalho que analisa as medidas, por maioria, retirou da proposta regras mais duras propostas pelo ex-juiz da Lava Jato para líderes de organizações criminosas abrigados em prisões de segurança máxima.

O texto proposto por Moro e apoiado pelo relator previa, por exemplo, que o atendimento de advogados a clientes em estabelecimentos penais federais de segurança máxima deveriam ser previamente agendados junto à direção do presídio. Os deputados entenderam que a exigência viola o princípio da ampla defesa e do devido processo legal, e retiraram a obrigatoriedade de agendamento do texto.

Outro ponto previsto no relatório do Capitão Augusto era a possibilidade de gravação das conversas entre presos e advogados, desde que fundamentadas em decisão judicial. A maioria dos deputados do grupo decidiu proibir as gravações entre cliente e advogado em qualquer hipótese, contrariando o relator. “Nós estamos falando só de líderes de facções criminosas e queremos blindar, por questões corporativistas, a OAB. Sinceramente, é demais”, reclamou Capitão Augusto. A Ordem dos Advogados do Brasil manifestou oposição a essa medida.

Para o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), não se pode fazer a criminalização do direito de defesa. “Tem uma questão colocada aqui, que é basilar. O regime diferenciado é para o preso, não para o advogado”, argumentou.

“Um juiz que tenha convicção do envolvimento de advogado [em crimes da organização criminosa], no lugar dele cercear a defesa, o que está impedido pelo Constituição, ele pode, por exemplo, investigar ou autorizar o grampo sobre o advogado, fazer busca e apreensão”, sugeriu o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ).

Progressão de regime para integrantes de organização criminosa

Os deputados também retiraram do texto do pacote anticrime a previsão de proibição de progressão de regime e livramento condicional para presos vinculados a organizações e facções criminosas. A sugestão de retirada da previsão foi feita por Freixo e acatada pelo relator do projeto.

Freixo argumentou que é muito difícil determinar quem faz parte de facções prisionais, por exemplo. Ele citou o exemplo do Rio de Janeiro. “Qualquer pessoa hoje detida e não precisa ser por tráfico, qualquer pessoa hoje detida por furto ao ingressar no sistema penitenciário, o Estado pergunta qual é sua facção criminosa”, argumentou o deputado.

“Hoje, a chance de um preso, por furto, não estar vinculado a uma facção no cumprimento e sua pena é zero”, disse Freixo. “O que faz ele ser membro de uma facção? Ele estar preso em uma unidade prisional dominada por uma facção. Não interessa se você matou 30 pessoas, se você é traficante ou se você furtou uma havaianas”, completou.

Reta final

O grupo de trabalho foi criado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para analisar as propostas anticrime apresentadas por Moro e pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). O relator, deputado Capitão Augusto, é aliado de Moro e manteve praticamente todas as propostas do ministro em seu relatório, que vem sofrendo diversas alterações no colegiado.

Algumas alterações têm consentimento do relator, outras, como as alterações das regras para presos em unidades prisionais de segurança máxima, são contestadas por Capitão Augusto. “Isso incomoda porque nosso texto endurece, principalmente contra as facções criminosas e crimes hediondos. Tive que ceder em alguns pontos para não perder o todo”, disse o relator.

O deputado diz que, mesmo que o grupo altere trechos do relatório, ainda há chances de recuperar parte do texto original. “Minha intenção é salvar o máximo possível do projeto aqui no grupo de trabalho e os pontos que porventura perdermos, no plenário a gente consegue resgatar através de emendas”, disse.

O grupo de trabalho foi prorrogado nesta terça-feira (17) por mais 30 dias para conclusão da análise das propostas. Depois que o trabalho for concluído, Maia vai decidir se manda o relatório do grupo direto para votação em plenário ou se cria uma comissão especial para analisar o documento.

Veja as principais mudanças feitas pelo grupo no relatório

As alterações ainda precisam passar por aprovação final no plenário da Câmara. Em seguida, seguem para análise do Senado.

Prisão em segunda instância

O grupo retirou do pacote a proposta de Moro que previa a autorização para prisão após condenação em segunda instância. Os deputados entenderam que o tema deve ser tratado em forma de Proposta de Emenda à Constituição (PEC), não como projeto de lei ordinária, como é o caso do pacote anticrime. Essa era uma das principais bandeiras de Moro ao apresentar o pacote.

Plea bargain

Também já foi retirado do relatório de Capitão Augusto a criação do plea bargain – espécie de acordo em que o réu confessa os crimes cometidos e negocia uma pena menor.

Banco Nacional de Perfis Genéticos

Os deputados aprovaram, por unanimidade, alterações ao texto proposto por Moro. Pelo texto, o perfil genético será recolhido de pessoas condenadas por crimes graves contra a pessoa e crimes contra a vida praticados com violência. Moro queria que fosse colhido o perfil genético de todos os condenados por crimes dolosos.

Interrogatório por videoconferência 

Os deputados retiraram da proposta a previsão de realização de interrogatórios de presos por videoconferência. Atualmente, o Código de Processo Penal (CPP) prevê que réus têm direito a interrogatório presencial, frente a frente com o juiz do caso. No CPP, há previsão para realização de videoconferência, em casos excepcionais, “quando fundamentado” pelo juiz.

Multa só depois de trânsito em julgado

O grupo retirou do relatório a previsão de pagamento de multas processuais antes do trânsito em julgado da condenação – quando não cabem mais recursos. O dispositivo, previsto no pacote de Moro, permitia que a multa pudesse ser cobrada a partir de iniciada a execução provisória da sentença, que pelo entendimento recente do STF pode começar a partir da segunda instância.

Criação do juiz sem rosto

O grupo também aprovou a criação da figura do “juiz sem rosto”, para proteção de magistrados que condenem organizações criminosas. A proposta foi feita, originalmente, pelo ministro do STF, Alexandre de Moraes. A proposta prevê a criação de varas colegiadas para instrução, julgamento e execução das penas de delitos cometidos por organizações criminosas. A medida serve para dar proteção a magistrados que atuem contra grandes grupos criminosos, como facções e milícias.

Mais poder para relatores em instâncias superiores

Os deputados também decidiram retirar do relatório a previsão para que relatores de inquéritos em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ) pudessem decidir sozinhos sobre aceitação ou arquivamento de denúncias. Atualmente, a decisão precisa passar por um colegiado de ministros e os deputados entenderam que a tramitação de denúncias deve permanecer como está.

Instalação de escutas

O grupo retirou do relatório do deputado Capitão Augusto (PL-SP) a autorização para instalação de escutas e câmeras em locais abertos ao público sem autorização judicial, como igrejas, hospitais e comércio. O texto, proposto por Moro, também previa que a “captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos” poderia ser feita sem conhecimento prévio do Ministério Público, mas o grupo de trabalho retirou essa previsão do texto. A gravação sem conhecimento prévio do MP só poderá ser feita para matéria de autodefesa. Os deputados também retiraram do relatório a possibilidade de instalação de dispositivos de escuta e monitoramento em casas de investigados. O texto, porém, autoriza a instalação de dispositivos no período noturno ou por meio de operação policial disfarçada.

Penas para tráfico, posse e comércio ilegal de armas

O grupo decidiu alterar penas previstas para crimes relacionados à armas de fogo. A pena prevista para quem pratica o comércio ilegal de armas de fogo passa a ser de 6 a 12 anos de prisão. O relatório do deputado Capitão Augusto (PL-SP) previa penas maiores, de 8 a 16 anos, mas o deputado concordou com a modificação.

A pena para posse ilegal de arma de fogo também foi alterada pelo grupo: passou para 4 a 12 anos. O relatório previa uma pena de 6 a 12 anos nesse caso. O relator também concordou com a alteração. Já a pena prevista para tráfico internacional de armas de fogo passou para 8 a 16 anos de prisão, também alterando a previsão inicial do relator, que previa uma pena de 10 a 20 anos.

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