Presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), comandou a sessão que rejeitou a PEC do voto impresso| Foto: Cleia Vianna/Câmara dos Deputados
Ouça este conteúdo

O plenário da Câmara dos Deputados rejeitou nesta terça-feira (10) a PEC do voto impresso auditável (proposta de emenda à Constituição 135/19). Foram 229 votos a favor, 218 contra e uma abstenção. Para ser aprovada eram necessários pelo menos 308 votos (dois terços dos deputados). "A democracia do plenário deu uma resposta a esse assunto e eu espero que, na Câmara, esse assunto esteja definitivamente enterrado", disse o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), após a votação.

CARREGANDO :)

A Câmara analisou o texto original da PEC, de autoria da deputada Bia Kicis (PSL-DF) e apoiada pelo presidente Jair Bolsonaro, que determinava a impressão de “cédulas físicas conferíveis pelo eleitor” independentemente do meio empregado para o registro dos votos em eleições, plebiscitos e referendos. Mas a proposta não obteve apoio da maioria dos partidos. Quinze legendas orientaram o voto pela rejeição e apenas três foram abertamente favoráveis: PSL, Republicanos e Podemos. Outros quatro partidos, incluindo o PP, liberaram as bancadas a votar da maneira que achassem correto.

A derrubada da PEC é a terceira derrota seguida de Bolsonaro em relação à pauta em menos de uma semana. Na última quinta-feira (5), a comissão especial criada para analisar o voto impresso já havia derrubado o texto substitutivo do deputado Filipe Barros (PSL-PR). Na sexta-feira (6), o colegiado aprovou o parecer vencedor que previa o arquivamento da matéria.

Publicidade

Ainda assim, o presidente da Câmara, aliado de Bolsonaro, decidiu levar o assunto para análise de todos os 513 deputados, justificando que os pareceres das comissões especiais não são terminativos e que era preciso encerrar de vez esse debate.

Como foi a votação no plenário

A rejeição da PEC 135 começou com uma primeira derrota a Bolsonaro e os deputados defensores do voto impresso. O plenário da Câmara ignorou a defesa do PSL de adiar a votação e aprovou por 295 votos a 43 o requerimento de quebra de interstício de duas sessões para a votação da matéria.

Por ter tido um segundo relatório aprovado e rejeitado na comissão especial na sexta, seriam necessárias duas sessões plenárias para que a PEC 135 fosse apreciada pelo pleno da Câmara. Com a aprovação do requerimento, os deputados iniciaram o debate da proposta com as discussões de parlamentares favoráveis e contrários.

O PSL e a liderança do governo foram os únicos a votar contrariamente à quebra do interstício. A segunda derrota veio com a votação de um requerimento para encerrar as discussões e encaminhar a votação da PEC, por 276 votos a 78. Novamente, só PSL e governo orientaram voto contra.

Publicidade

A terceira derrota do governo veio após o líder do PSL, Vitor Hugo (GO), apresentar um requerimento para adiar a votação por cinco sessões. Entretanto, o requerimento foi suspenso por não ter base regimental. Em maio, a Câmara aprovou — com o apoio do governo — um projeto que mudou o regimento interno da Casa de forma a impedir a postergação de uma votação após aprovado o encerramento das discussões.

A derradeira e grande derrota veio com a votação da PEC em si. O governo não obteve a maioria dos votos nem mesmo dentro de sua base aliada. O PP, partido do ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira. Dos 40 votos, 16 foram favoráveis, 13 contrários e 11 não votaram. No PL, outro partido da base, 23 foram contra, 11 favoráveis e sete não votaram. Também acumulou votos contrários de PSD, PTB, Solidariedade, Patriota, Avante e Pros.

Para Lira, debate sobre voto impresso está encerrado

O presidente da Câmara, Arthur Lira, afirmou após a sessão que o assunto voto impresso está encerrado. “Não teríamos nem tempo, nem espaço para retomar esta questão nessa legislatura”, ressaltou. Ele enfatizou ainda o resultado “soberano, altivo e democrático”, que não foi apenas de uma comissão, mas do plenário da Câmara.

Lira também afirmou que o momento é de saber reconhecer os resultados. “Todos os deputados que votaram aqui hoje foram eleitos pela urna eletrônica”, disse. Questionado sobre qual seria a reação do presidente Jair Bolsonaro, apoiador do voto impresso, Lira disse que acredita que o presidente da República vai respeitar a decisão.

O presidente da Câmara fez um apelo aos deputados para que a transparência do sistema eleitoral seja tratada futuramente sem que haja “vencidos ou vencedores”. Ele se comprometeu a buscar a Justiça Eleitoral e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), para encontrar uma saída para aumentar a transparência e aprimorar os mecanismos de auditagem. “Para que não pairem dúvidas”, ressaltou.

Publicidade

Ele espera que as conversas aconteçam rapidamente. “Nossa obrigação é sentar à mesa, sem vencidos ou vencedores, para discutir alternativas para aumentar a transparência e melhorar a auditagem”, completou. Entre as sugestões que pode apresentar, Lira citou aumentar o número de urnas auditadas a cada eleição e incluir a participação de outras entidades nesse processo.

Debate sobre o voto impresso tensionou a relação entre poderes

A PEC do voto impresso era uma das principais bandeiras políticas de Bolsonaro. O presidente da República argumenta que a urna eletrônica é passível de fraude e só com o voto impresso isso seria evitado. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contesta a acusação e diz que o sistema de votação é seguro e já é auditável.

Nas últimas semanas, Bolsonaro passou a criticar publicamente o ministro Luis Roberto Barroso, presidente do TSE, alegando que o ministro agiu politicamente no Congresso para barrar a aprovação da PEC do voto impresso.

O clima ficou ainda mais tenso nesta terça, quando tanques de guerra e outros veículos de combate desfilaram pela Esplanada dos Ministérios para entregar o convite de um exercício militar das Forças Armadas a Bolsonaro. Deputados e senadores, sobretudo da oposição, protestaram, afirmando se tratar de uma tentativa de intimidar o Congresso no dia em que a votação da PEC estava marcada.

Antes disso, Bolsonaro havia deflagrado uma ofensiva para defender o voto impresso para auditar as eleições. Numa live, o presidente da República levantou suspeitas, sem apresentar provas, de que há fraudes nas urnas eletrônicas.

Publicidade

Depois, apresentou um inquérito da Polícia Federal mostrando uma invasão hacker ao sistema do TSE – que, segundo especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, não provam a fraude, mas revelam uma vulnerabilidade grave das urnas eletrônicas.

O presidente também fez ameaças de que, sem voto impresso, o Brasil não terá eleições em 2022. Ele ainda criticou de forma dura integrantes do STF que são a favor da votação eletrônica, abrindo uma crise com o Judiciário.

Além disso, a rejeição da PEC ocorreu mesmo após manifestações a favor do voto impresso realizadas no dia 1.º de agosto.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]