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Fachada do prédio da Previdência Social em Curitiba.
Fachada do prédio da Previdência Social em Curitiba.| Foto: André Rodrigues/Gazeta do Povo

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) paralela da reforma da Previdência, cuja minuta foi apresentada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado na semana passada, traz entre as propostas o fim das desonerações para três setores.

Pelo texto, entidades filantrópicas; produtores do agronegócio exportador; e micro e pequenas empresas, contempladas pelo chamado Simples Nacional, passariam a pagar a contribuição previdenciária.

No relatório da reforma da Previdência, em que apresenta a PEC paralela, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) aponta que o objetivo das alterações é promover mais "justiça fiscal". "Somos pela revisão de renúncias previdenciárias de baixo impacto social, particularmente as feitas em benefício de grupos econômicos que podem arcar com as contribuições", diz o texto.

"Não temos clareza sobre por que faculdades destinadas à elite da elite; hospitais que pagam salários de seis dígitos; ou bem-sucedidos produtores rurais não devem pagar o INSS de seus funcionários. A lógica aqui é simples: se eles não estão pagando, alguém está", diz Tasso no relatório.

O que muda para entidades filantrópicas

No caso das entidades filantrópicas, o texto prevê o fim da desoneração para instituições "que oferecem pouca contrapartida à sociedade, especialmente no setor de educação". Segundo o relatório, entidades de assistência e de referência, como as Santas Casas, ficariam de fora – ou seja, continuariam sem contribuir para a Previdência.

Na opinião do advogado e professor de Direito Previdenciário André Bittencourt, a falta de clareza sobre quais seriam as entidades excluídas do benefício abre margem para que organizações com atuação relevante sejam prejudicadas. "É um retrocesso porque as filantrópicas exercem um serviço importante para a sociedade. Lógico que existem situações de má utilização, mas isso precisa ser combatido com investigações", critica.

Ainda segundo o professor, a medida pode acabar onerando o Estado de outra maneira. Isso porque, como terão que repassar mais recursos para o governo, as entidades podem diminuir investimentos em pessoal e estrutura. "Pode ser um desestímulo para muitas dessas instituições, o que vai acabar penalizando a população que já é mais desassistida. Com isso, o Estado vai ter que investir mais. É uma conta que não está sendo feita", afirma Bittencourt.

Para Luís Eduardo Afonso, docente da Universidade de São Paulo (USP), a medida é "correta em essência", já que exceções à regra precisam ser evitadas. "Por outro lado, existem entidades filantrópicas sérias que o governo vai acabar prejudicando", pondera.

Simples: mais arrecadação e prevenção de acidentes

No caso do Simples, a regra passaria a exigir a contribuição de micro e pequenas empresas para financiar benefícios concedidos por conta de acidentes de trabalho ou exposição a agentes nocivos. Segundo o texto, isso seria uma forma de incentivar essas empresas a investir em medidas de segurança no trabalho.

Mas, na visão dos especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, a alteração pode acabar tendo efeitos negativos. "É preocupante porque quem está começando a empreender geralmente usa o Simples. Isso acaba fomentando a economia. Mudar as regras pode fazer com que as pessoas fiquem desestimuladas. E, com isso, o governo também vai perder", diz Bittencourt.

Outra controvérsia é que, na PEC "principal" da Reforma da Previdência, deve ser incluída a previsão para que trabalhadores informais, que estejam em condição de baixa renda, paguem uma alíquota especial. "A alteração no Simples vai no sentido oposto dessa mudança para quem está na informalidade. É incompatível com o contexto geral", avalia Afonso, da USP.

A cobrança do agronegócio

A proposta para o agronegócio exportador, por outro lado, é considerada positiva pelos especialistas, apesar da provável resistência na aprovação da medida. Hoje os produtores rurais que exportem uma parte de sua produção, por menor que seja, não precisam fazer a contribuição à Previdência.

"É uma boa ideia porque o Brasil tem uma rede de agronegócio bastante grande, constituída, na sua maior parte, por grandes corporações. Isso deve ajudar a fazer com que cada um contribua o quanto deve", diz Bittencourt.

As mudanças em números

Em seu relatório, o senador Tasso Jereissati diz ter consciência de que as mudanças não serão aprovadas com facilidade, mas enfatizou seu impacto para os cofres públicos. De acordo com o cálculo, o fim da isenção para os três setores geraria um ganho de R$ 155 bilhões na arrecadação da Previdência em um período de dez anos.

A contribuição de entidades filantrópicas e do agronegócio traria o maior ganho, com R$ 60 bilhões de arrecadação adicional cada uma. Do agronegócio exportador, viriam R$ 35 bilhões. Segundo a proposta, a cobrança seria implementada de forma gradual e progressiva, em um período de cinco anos.

Os valores estão bem longe de cobrir o rombo da Previdência. Só em 2018, de acordo com dados do Ministério da Economia, o déficit do INSS foi de R$ 195,2 bilhões. Para este ano, sem as mudanças nas regras, a previsão é de um saldo negativo de R$ 215,9 bilhões.

Também para 2019, o Demonstrativo de Gastos Tributários, da Receita Federal, aponta que o governo irá abrir mão de pouco mais de R$ 12 bilhões na desoneração para entidades filantrópicas; R$ 7,2 bilhões para o agronegócio exportador; e R$ 29,4 bilhões para o Simples. Juntos, os três setores totalizam R$ 48,7 bilhões em renúncias em 2019.

A tramitação da proposta

Após ser aprovada na Câmara dos Deputados, a Reforma da Previdência está, agora, em apreciação no Senado. Na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), em que foi aprovada na semana passada, a Reforma acabou ganhando uma "PEC paralela".

Trata-se de uma Proposta de Emenda à Constituição com alterações que serão apreciadas pelos parlamentares separadamente do texto original. É nessa matéria que estão as alterações referentes às desonerações.

Para que entre em vigor, o texto da PEC paralela ainda tem um longo caminho a percorrer. Primeiro, precisará ser aprovado novamente na CCJ do Senado, além de passar por dois turnos de votação no Plenário da Casa. A previsão é de que a matéria, assim como a proposta original da Previdência, comece a ser votada até o dia 24 de setembro.

Depois, se aprovada, a PEC paralela vai para a Câmara dos Deputados. Na Casa, o texto será analisado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e em uma comissão especial. Depois, deve passar por votação em dois turnos. Aí sim, se aprovado, o texto é promulgado e entra em vigor.

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