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Roberto Jefferson PTB
Ex-deputado Roberto Jefferson foi afastado em novembro de 2021 do comando do PTB por suspeita de usar recursos do partido para atacar o STF e as instituições| Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Um das legendas políticas mais antigas em funcionamento no Brasil, o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) passa por uma crise interna, agravada, no ano passado, pelo afastamento do ex-deputado Roberto Jefferson do comando. Em novembro, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que ele deixasse a presidência da sigla, pela suspeita de que estaria usando recursos públicos do fundo partidário para promover ameaças à Corte. A decisão foi tomada após entrevistas e postagens em redes sociais em que Jefferson insultava o próprio ministro.

Desde então, o PTB trocou de comando duas vezes, sendo hoje comandado por Kassyo Ramos, secretário-geral que exerce a presidência. A Polícia Federal ainda investiga se o dinheiro destinado ao partido vem sendo usado para “ataques” às instituições, como revelam diversos depoimentos anexados na semana passada ao inquérito das milícias digitais, um dos subprodutos do inquérito das fake news, que investiga supostas ofensas aos ministros do STF.

Uma das depoentes é a publicitária Graciela Nienov, que era vice de Jefferson e assumiu a presidência em seu lugar, em novembro do ano passado. Uma das protagonistas da crise, Graciela era considerada pessoa de confiança do ex-deputado, tratada como uma filha segundo o próprio. Mas caiu em descrédito depois que Jefferson começou a desconfiar que ela trabalhava para mantê-lo preso e, com isso, assumir de vez o controle da sigla.

No dia 18 de abril, ela disse à PF que, depois de assumir o comando, as decisões partidárias continuaram a cargo de Jefferson. E contou que, em janeiro, ao visitá-lo na prisão, ele ordenou que ela patrocinasse outdoors, com recursos do partido, para divulgar mensagens em favor de sua liberdade e o colocando como um “preso político”. “A depoente se negou a cumprir tal ordem, pois envolveria dinheiro público e não queria causar conflito com o STF”, diz o termo do depoimento, documento da PF que resume suas respostas no interrogatório.

No depoimento, Graciela ainda mencionou um áudio dela, transmitido num grupo de WhatsApp da cúpula do partido, que vazou no fim de janeiro. Na gravação, ela fala de um almoço que teria naquele mês com Alexandre de Moraes. “Em janeiro, vou ter que ir lá almoçar com o Alexandre. Fiz esse compromisso. Paciência. Bora lá”, diz Graciela no áudio.

Na época, o ministro do Supremo negou, em nota, qualquer contato com ela. Ainda assim, a revelação da gravação foi interpretada por aliados de Jefferson no PTB como uma traição, uma vez que Moraes é considerado o maior algoz do ex-deputado. No depoimento à PF, Graciela disse que suas conversas e áudios foram descontextualizados. Depois, disse que Jefferson escreveu uma carta, enviada ao grupo de WhatsApp do partido, “demitindo” ela da presidência.

Em seguida, ela e outros aliados teriam começado a receber ameaças, inclusive de morte, por parte de pessoas ligadas ao ex-deputado. “Roberto Jefferson indicou pessoas para cargos estratégicos e manteve o controle da maioria do diretório nacional”, disse.

Graciela foi destituída da presidência no início de fevereiro e, em seu lugar, foi eleito para o cargo, no dia 11 daquele mês, o deputado estadual Marcus Vinícius Neskau, que é ex-genro de Jefferson. Em depoimento, ele disse que só assumiu de fato o partido em março, após uma decisão do ministro Edson Fachin, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), reconhecendo sua eleição. Mas, no fim de março, Alexandre de Moraes determinou sua suspensão do comando.

O ministro do STF recebeu denúncias de dois deputados do PTB, de Sergipe e de Roraima, relatando que Jefferson continuaria mandando no partido através de Neskau, por meio de recados e comunicados com determinações, enviados por mensagens. Moraes considerou o caso “gravíssimo”, lembrando que, em novembro, havia determinado que Jefferson se afastasse da presidência. O ministro disse que os relatos trazidos pelos deputados estaduais demonstravam a existência de uma “rede de intimidação criada por Roberto Jefferson Monteiro Francisco que, valendo-se de ameaças, tem o objetivo de assegurar o controle da agremiação política, às vésperas da eleição”.

Em seu depoimento, no dia 5 de maio, Neskau negou que seguisse ordens de Jefferson no curto período em que esteve à frente do PTB, nem que financiasse ataques às instituições.

No fim de março, com a saída de Neskau, o partido foi assumido por Kassyo Ramos. Segundo Graciela, ele também faria parte do grupo de Jefferson. Ele é genro da desembargadora do Tribunal Regional Federal da 1ª Região Maria do Carmo Cardoso, que, segundo Graciela, é “amiga pessoal” de Jefferson.

No comando do partido, Kassyo Ramos tem tentado desfazer a pecha de que o partido quer atacar as instituições. No último dia 27, ele publicou uma nota afirmando que o PTB “considera a democracia um valor fundamental e não apoia qualquer conflito armado”.

A declaração era uma resposta à notícia de que, durante um evento do partido em São Paulo, um padre subiu ao palco e, no discurso, teria sugerido uma luta armada para frear o avanço do comunismo no Brasil com uma eventual volta do PT ao poder.

Advogado nega influência de Jefferson, que está em prisão domiciliar

Defensor pessoal de Jefferson e secretário jurídico do PTB, o advogado Luiz Gustavo Cunha também prestou depoimento à PF no fim de abril. Ele é apontado por Graciela e seus aliados como um dos intermediários do ex-deputado para continuar mandando no partido.

Ele negou que Jefferson seja o presidente de fato do PTB e disse que nunca seguiu orientações dele a partir de seu afastamento, em novembro. Negou ainda ter feito ameaças a integrantes do partido. Questionado sobre Graciela e seu grupo, apontou “tratativas de traições e destruição do legado do PTB” e que teriam o objetivo de “assumir o controle” total do partido, com a exclusão de “figuras históricas”, incluindo ele mesmo.

Ele confirmou que, no fim de janeiro – época em que Jefferson deveria estar afastado da presidência do partido –, encaminhou no grupo de WhatsApp de presidentes do PTB uma carta elaborada pelo ex-deputado “abordando assuntos relacionados às movimentações internas do partido”, conforme questionado pela PF. Cunha se negou a responder por quais motivos teria transmitido a carta, alegando sigilo profissional como advogado.

Ao final, indagado sobre uma mensagem de um dirigente no grupo do partido, pedindo aos correligionários para “confiar no nosso líder Roberto Jefferson”, o advogado disse que, apesar de não exercer qualquer função no PTB, o ex-presidente “continua sendo uma liderança histórica do partido”.

Jefferson está em prisão domiciliar desde o fim de janeiro, concedida por Moraes em razão de problemas de saúde que passou na penitenciária de Bangu, no Rio. O ministro impôs o uso de tornozeleira eletrônica, o proibiu de qualquer comunicação exterior, de receber visitas a não ser de sua família e de conceder entrevistas. Em seu interrogatório na PF, ele permaneceu em silêncio.

PTB vai receber R$ 122 milhões dos fundos eleitoral e partidário

Neste ano, o PTB já recebeu R$ 7,3 milhões do total de R$ 21,9 milhões a que tem direito do fundo partidário. Do fundo eleitoral, deverá receberá mais de R$ 100 milhões para gastos de campanha, segundo cálculos preliminares.

Em 2018, o partido elegeu 10 deputados federais e quatro senadores, mas hoje, após a janela partidária de março, conta com apenas três representantes na Câmara e dois no Senado. Nem mesmo a guinada à direita experimentada pelo partido desde então foi suficiente para atrair parlamentares à legenda.

Neste ano, o deputado Daniel Silveira (RJ), recém-filiado ao partido, quer tentar uma vaga no Senado, mas deverá ter a candidatura anulada pela Justiça Eleitoral, em razão de sua recente condenação pelo STF.

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