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Na época que recebeu pedido de “ajuda”, Alexandre Ramagem havia acabado de se eleger deputado federal e já estava fora da Abin havia seis meses
Na época que recebeu pedido de “ajuda”, Alexandre Ramagem havia acabado de se eleger deputado federal e já estava fora da Abin havia seis meses| Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Quando recebeu uma mensagem de uma ex-assessora do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) pedindo uma “ajuda”, o deputado federal Alexandre Ramagem (PSL-RJ) já tinha deixado o comando da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) havia mais de seis meses.

A imagem da troca de mensagens entre ele e Luciana Almeida, revelada nesta segunda-feira (29) e que motivou a busca e apreensão contra Carlos, mostra que o pedido de ajuda foi enviado numa terça-feira, dia 11 de outubro, o que ocorreu em 2022. Ramagem foi exonerado da Abin em 31 de março daquele ano.

Veja o print da troca de mensagens:

Apesar disso, a conversa foi usada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), como um exemplo alegadamente concreto “dos serviços prestados pela estrutura paralela infiltrada na Abin”, numa referência ao grupo de Ramagem que, segundo a Polícia Federal, teria usado a agência para perseguir opositores do ex-presidente Jair Bolsonaro e fornecer informações sigilosas sobre investigações envolvendo ele e seus filhos.

O ministro e a Polícia Federal, no entanto, não mencionam a data da mensagem de Luciana, nem a troca de mensagens anterior, em que ela se apresenta e faz votos de sucesso “nesta nova etapa de sua vida” – provável referência à eleição dele para o cargo de deputado federal. Essa hipótese é reforçada pelo fato de, no dia 9 de outubro, Ramagem ter respondido à ex-assessora de Carlos agradecendo, dizendo que ela podia contar com ele e escrevendo: “Agora vamos eleger nosso Presidente Bolsonaro” – provável menção à campanha de segundo turno do ex-presidente (o primeiro turno da eleição foi realizado no dia 2 e o segundo no dia 30 de outubro).

Outro ponto problemático da investigação é a afirmação, por parte da Polícia Federal e de Moraes, de que a “ajuda” pedida pela ex-assessora de Carlos Bolsonaro seria para obtenção de informações sobre inquéritos envolvendo Jair Bolsonaro e três de seus quatro filhos.

De fato, na mensagem seguinte ao pedido de ajuda, ela passa a Ramagem o nome de uma delegada da Polícia Federal, de um escrivão e dois números que identificariam inquéritos “envolvendo PR e 3 filhos”. O problema é que a mensagem não foi enviada no dia 11 de outubro, à qual Ramagem não responde, mas numa data posterior, identificada na conversa de WhatsApp como “hoje”, numa referência ao dia em que a tela foi copiada, que não é esclarecida.

Mesmo diante desse intervalo de tempo, o delegado do caso, Daniel Nascimento, relaciona a “ajuda” a inquérito “em andamento em unidades sensíveis da Polícia Federal”. Ele mesmo registra, porém, que os números passados pela assessora de Carlos não correspondiam a investigações contra Bolsonaro e seus filhos. Ainda assim, diz que “no período existiam investigações em andamento no interesse dos sujeitos” e que “provavelmente a fonte não obteve os números dos procedimentos corretos”.

Moraes por sua vez, após destacar a mensagem, indica que ela e outras provas colhidas na investigação demonstrariam a existência uma organização criminosa na Abin que, além de supostamente monitorar ilegalmente opositores de Bolsonaro, também tinha por objetivo “‘fiscalizar’ indevidamente o andamento de investigações em face de aliados políticos”.

A outra prova de que isso teria ocorrido é o registro de uma impressão, que Ramagem teria realizado em 2020, de um documento contendo uma lista de inquéritos eleitorais em andamento, à época, no Rio de Janeiro, contendo nome, cargo e partido dos políticos alvos. A Polícia Federal diz que tais informações seriam “a priori sigilosas” e presume, sem demonstração efetiva, que a impressão ocorreu “possivelmente para entregar aos destinatários do núcleo político”.

O “núcleo político” da organização alegadamente criminosa seria, segundo Moraes, formado por Carlos Bolsonaro, Luciana Almeida e Priscila Silva – esta última, informa o ministro, seria uma “interlocutora” de Ramagem “apontada como a receptora do pedido de informações clandestinas realizado por Luciana Almeida”.

Em seu parecer sobre o caso, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, opinou contra a realização de busca e apreensão nos endereços de Priscila, que, segundo ele, “apenas tem o seu contato compartilhado com interlocutor do Dr. Ramagem, sem indicação de fato que aparente merecer a atenção investigativa neste momento”. Ainda assim, Moraes também determinou busca contra ela, por entender que as “as ‘demandas’ eram tratadas por meio de assessoras, e não diretamente entre os investigados”.

Nesta segunda (29), em entrevista à Jovem Pan News, Jair Bolsonaro minimizou o suposto pedido dirigido a Ramagem. “Qual o problema pedir número de inquéritos para alguém? Pediu para interferir, para agir contrário a alguma coisa? Qual o problema você ter acesso a número de inquérito? Talvez estivesse servindo isso aí para colaborar com o próprio advogado. Se eu tiver um problema aqui com a Polícia Federal, vou me consultar também com o Ramagem, que eu virei amigo dele. Se eu tiver problema de saúde, vou ligar para um médico”, afirmou. Ramagem é delegado da Polícia Federal.

À CNN Brasil, o ex-presidente destacou que a mensagem da ex-assessora de Carlos Bolsonaro não esclarece o que teria sido perguntado sobre o inquérito. Também ressaltou que não há registro de resposta de Ramagem ao suposto pedido de informações.

“Eu queria saber o que foi informado pelo Ramagem de volta. Obviamente, em órgãos do governo, é comum as pessoas fazerem questionamentos. O que foi perguntado? Se foi andamento do processo, não tem problema nenhum. Se é interferência, é outra questão. Agora, o que foi informado pelo delegado Ramagem?”, questionou.

Bolsonaro também disse que nunca usou da Abin para se defender e lembrou que Ramagem se tornou próximo dele e de sua família em 2018, quando chefiou a segurança de sua primeira campanha presidencial. “Criou um certo vínculo de amizade, que é comum você pedir informações. Mas jamais meu filho pediria algo que não fosse legal para o Ramagem.”

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