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O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta
Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, já teria avisado a própria equipe que deve deixar o Ministério.| Foto: Evaristo Sá/AFP

Se o desejo é forçar sua demissão, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, parece estar conseguindo. Esta é a avaliação feita nos últimos dois por interlocutores do governo após a entrevista concedida por Mandetta ao programa Fantástico, da TV Globo. O gesto do ministro foi entendido pela ala militar como um ato de indisciplina, valor que é extremamente caro às Forças Armadas.

O próprio Mandetta teria avisado sua equipe na noite de terça-feira (14), segundo a coluna Painel, da Folha de São Paulo, que o presidente Jair Bolsonaro já procura um nome para o seu lugar. O pano de fundo são as divergências na estratégia de combate ao novo coronavírus no país. Veja cinco sinais de o ministro deve mesmo ser demitido após a "guerra fria" que travou com o chefe do palácio do Planalto:

1) A polêmica entrevista e um mea culpa tardio

O ministro da Saúde admitiu a auxiliares próximos ter cometido um erro estratégico ao adotar uma postura desafiadora contra o presidente Jair Bolsonaro na entrevista ao Fantástico, segundo o jornal O Estado de São Paulo. De caso pensado ou não, Mandetta reacendeu um embate que tinha adormecido. Ele ainda escolheu falar com exclusividade para a TV Globo, vista pelo presidente da República como uma emissora hostil ao governo.

Pegou mal ainda o fato de a entrevista ter sido concedida no Palácio das Esmeraldas, sede do governo de Goiás, cujo governador Ronaldo Caiado (DEM) rompeu politicamente com Bolsonaro. Mandetta passou o fim de semana em Goiânia após vistoriar a construção de um hospital de Campanha, em Águas de Lindoia, ao lado de Caiado e Bolsonaro.

2) Militares retiram apoio a Mandetta

A entrevista de Mandetta ao Fantástico repercutiu mal na ala militar do governo, a mesma que havia avalizado a permanência dele no governo na semana passada. Bolsonaro só não o demitiu sumariamente porque os ministros Braga Netto, da Casa Civil, e Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, o demoveram da ideia, alertando o presidente do desgaste que isso causaria em plena pandemia.

Os colegas militares tinham alertado o ministro da Saúde sobre a necessidade de não expor diferenças com Bolsonaro em público. Mas Mandetta dobrou a aposta e seguiu contrariando o presidente sobre temas como isolamento social e uso da cloroquina em pacientes diagnosticados com coronavírus. "Espero que a gente possa ter uma fala única, uma fala unificada. Porque isso leva para o brasileiro uma dubiedade. Ele não sabe se escuta o ministro da saúde, se escuta o presidente, quem é que ele escuta", disse ao Fantástico.

As declarações de Mandetta foram encaradas como um ato premeditado e de indisciplina hierárquica de alguém que quer forçar a própria demissão. O vice-presidente, Hamilton Mourão, usou uma expressão usada no jogo de polo para criticar a fala do ministro da Saúde no Fantástico. "Acho que ele cruzou a linha da bola. Não precisava ter dito determinadas coisas", disse, em entrevista-live ao Estadão, na terça-feira.

3) Bolsonaro prepara terreno para demissão

Em conversa com apoiadores que o aguardavam na porta do Palácio da Alvorada nesta terça-feira, Bolsonaro voltou a se queixar das medidas de isolamento social adotadas pelo Ministério da Saúde para o combate ao coronavírus. E disse que vai "resolver esse problema esta semana". Segundo a Folha de São Paulo, o presidente planeja desconstruir a imagem de "herói" que Mandetta adquiriu para grande parte da opinião pública durante a pandemia a fim de criar condições políticas para demiti-lo.

Ainda na terça, Bolsonaro se reuniu, no Palácio da Alvorada, com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que é do mesmo partido de Mandetta e que havia saído em defesa do ministro quando a ameaça de demissão foi mais forte. Nos últimos dias, o chefe do Executivo tem conversado com dirigentes de siglas do Centrão, que interpretaram o movimento como uma preparação de terreno para a saída do ministro da Saúde.

"O presidente já abriu esse diálogo e deve partir para a indicação de um técnico no ministério", disse o senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO) ao jornal O Estado de São Paulo. "Enquanto Mandetta não sair ou for demitido, esses problemas vão continuar e Bolsonaro ficará mais desmoralizado".

Desde o início do mês, Bolsonaro já recebeu parlamentares e dirigentes do PP, PL e Republicanos e neste quarta-feira (15) deve conversar com o presidente do PSD, Gilberto Kassab. Todos os partidos compõem o Centrão.

Auxiliares do presidente observam que ele só não dispensou o ministro ainda porque faz um cálculo pragmático. Pesquisas mostram que Mandetta, hoje, é mais popular que Bolsonaro e sua demissão, neste momento, agravaria a crise.

4) Presidente busca nome técnico para a pasta

Os primeiros nomes que surgem como favoritos para a vaga de Mandetta no Ministério da Saúde são do deputado e ex-ministro Osmar Terra (MDB-RS) e da médica Nise Yamaguchi. Mas eles perderam força na bolsa de apostas nos últimos dias. Motivo: não têm o apoio da classe médica.

Terra é médico de formação e tem aconselhado Bolsonaro em meio à crise sanitária, alinhando-se ao presidente nas críticas ao isolamento social amplo e no menosprezo ao potencial da Covid-19. Discípulo da ala ideológica do governo, o deputado tem o apoio dos filhos do presidente da República.

Nise Yamaguchi é imunologista e defensora do uso da cloroquina em todos os casos de Covid-19, não apenas nos mais graves, conforme protocolo do Ministério da Saúde. O uso do remédio é um dos temas que opõem Bolsonaro ao ministro da Saúde.

Pelo menos outros dez nomes estão sendo sondados, segundo a coluna de Bela Megale no jornal O Globo. Entre eles tão a cardiologista e pesquisadora Ludhmila Hajjar, diretora de Ciência e Inovação da Sociedade Brasileira de Cardiologia; o médico oncologista Nelson Teich; e Claudio Lottenberg, presidente do Conselho do Hospital Israelita Albert Einstein. Hajjar teria o apoio do cirurgião Antônio Macedo, responsável pelas últimas cirurgias do presidente.

Bolsonaro tem em mente o perfil do que seria o “substituto ideal”, mas tenta achar que alguém com respaldo na classe médica e que seja alinhado ao discurso oficial do governo, de defesa do isolamento vertical e do uso da cloroquina.

O nome do secretário-executivo do Ministério da Saúde, João Gabbardo, é lembrado por apoiadores do Planalto como uma saída menos traumática. Gabbardo é ex-secretário de Saúde do Rio Grande do Sul e tem boas relações com Osmar Terra, apear de fazer parte da equipe de Mandetta no ministério.

De acordo com o Globo, a ideia circulou entre secretários estaduais de saúde como forma de oferecer a Bolsonaro uma saída para que pare de boicotar o ministério, “ganhando a guerra com Mandetta”, sem perder o verniz técnico da equipe da Saúde, que continuaria preservado na figura de Gabbardo.

5) Mandetta reconhece que deve sair

Em conversas reservadas, Luiz Henrique Mandetta já chegou a confidenciar que só não toma a iniciativa de deixar o governo por receio de ficar com o ônus de quem abandonou "o barco" — ou "o paciente", como tem dito — no momento mais dramático. Mas, oficialmente, a conversa é outra.

Após participar nesta terça de reunião ministerial com Bolsonaro no Planalto, Mandetta foi questionado por jornalistas se eram verdadeiras as análises feitas no próprio governo sobre sua intenção de forçar a saída da equipe.

"Não vejo nesse sentido. (O que houve) foi mais uma questão relacionada à comunicação, a como vamos comunicar. Nada além disso", disse ele. "Sabemos de nossa responsabilidade e estamos trabalhando com toda a garra".

Mas, segundo a coluna Painel da Folha de São Paulo, Mandetta avisou sua equipe que Bolsonaro já procura um nome para o seu lugar e que deve ser demitido ainda nesta semana. Ele conversou com integrantes da pasta em clima de despedida após a entrevista coletiva da qual participou no Palácio do Planalto na noite de terça.

De acordo com relatos, Mandetta teria avisado que combinou de esperar a escolha do substituto e de ficar até a exoneração de fato ocorrer. Um dos principais auxiliares do ministro, o secretário de Vigilância em Saúde, Wanderson Kleber de Oliveira, enviou carta aos funcionários de sua área nesta quarta-feira (15) afirmando que "a gestão de Mandetta acabou e preciso me preparar para sair junto".

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