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75 anos de Auschwitz: Putin não merece destaque
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A cerimônia alusiva aos 75 anos da libertação do campo de concentração nazista de Auschwitz virou o novo palco da disputa entre a Rússia do presidente Vladimir Putin e o Ocidente.

Em jogo, a narrativa histórica sobre quem começou a Segunda Guerra Mundial (1939-45), tema que o russo tomou para si com uma série de declarações polêmicas no mês passado.

Putin foi convidado a fazer o principal discurso de um líder mundial no evento, que ocorre nesta quinta (23) em Jerusalém. Foram as tropas da União Soviética, país que tinha a Rússia como principal Estado entre 1917 e 1991, que libertaram o campo de concentração em 27 de janeiro de 1945.

O presidente polonês, Andrzej Duda, se recusou a participar da cerimônia. Queixou-se que o conflito iniciado com a ocupação da Polônia pelos nazistas matou 3 milhões de poloneses étnicos —e igual número de judeus locais.

Auschwitz e outros campos de extermínio da máquina do ditador da Alemanha nazista, Adolf Hitler (1889-1945), afinal, ficavam na Polônia.

Ninguém precisa negar a importância do papel da URSS na Segunda Guerra. Mas... é preciso lembrar que sem o apoio americano, os militares soviéticos estavam em apuros, e que mesmo antes de os Estados Unidos entrarem na guerra, a nação enviava ajuda alimentar e bélica aos soviéticos.

Muitos gostam de destacar a resistência heróica soviética e os 20 milhões de mortos nas batalhas contra os nazistas. Em primeiro lugar, é preciso lembrar que o inverno russo foi obstáculo ainda maior, como já tinha descoberto Napoleão antes. Em segundo lugar, é bom lembrar que essa matança toda se deve em parte à crueldade do próprio regime stalinista e seu descaso pela vida humana.

Enaltecer o papel dos russos, portanto, significa alimentar uma narrativa falsa de heroísmo do império soviético. O fato histórico insuportável para a imensa maioria dos professores de história, quase todos antiamericanos, é que foram os Estados Unidos que livraram o mundo dos regimes totalitários primos, paridos na Europa, que inundaram o mundo com sangue inocente: o nazismo e o comunismo.

E claro, não podemos ignorar jamais o papel fundamental dos britânicos, sob a liderança do conservador Churchill, que no momento de maior desespero contou com a ajuda fundamental justamente dos americanos.

Outro aspecto que não pode ficar de fora na análise é a influência que os gulags tiveram nos campos de concentração nazistas. No Livro Negro do Comunismo, escrito por franceses, consta claramente a inspiração que os nacional-socialistas tiveram com o modelo soviético, assim como a surpresa com o pacto entre Rússia e Alemanha:

Em 24 de agosto de 1939, o mundo estupefato soube da notícia da assinatura na véspera, de um tratado de não-agressão entre a URSS stalinista e a Alemanha hitlerista. O anúncio do pacto produziu um verdadeiro choque nos países europeus diretamente implicados pela crise, cuja opinião pública não havia sido preparada para o que parecia uma reversão total das alianças, poucas mentes tendo então compreendido o que podia unir dois regimes de ideologias tão opostas.

[...] Desde o início do ano de 1939, a diplomacia soviética, dirigida por Viatcheslav Molotov, esquivava-se gradativamente da ideia de um acordo com a França e com a Grã-Bretanha [...] Em 14 de agosto, o ministro alemão de relações exteriores, Ribbentrop, propôs uma visita a Moscou para concluir um amplo acordo político com os dirigentes soviéticos. Stalin aceitou prontamente.

[....] A parte mais importante do acordo, que delimitava as esferas de influência e as anexações de dois países do Leste Europeu, permaneceu, evidentemente, secreta. Até 1989, os dirigentes soviéticos negavam, contra a evidência, a existência desse "protocolo secreto", verdadeiro "crime contra a paz" cometido pelas duas potências signatárias. [...] Oito dias após a assinatura do pacto, as tropas nazistas atacaram a Polônia. [...] Em 17 de setembro o exército russo penetrou na Polônia sob o pretexto de "ajudar os irmãos de sangue ucranianos e bielo-russos" ameaçados pela "desagregação do Estado polonês".

Como fica claro, e com detalhes de datas para quem gosta de memorizar essas coisas, os russos só "libertaram" os poloneses porque foram traídos pelos nazistas! A Aliança ocidental só contou com a ajuda soviética porque Hitler traiu Stalin.

É perfeitamente compreensível, portanto, a revolta dos poloneses com essa homenagem concedida a Putin. "De acordo com estatísticas do departamento de colonos especiais do Gulag, em fevereiro de 1940 e junto de 1941, 381.000 civis poloneses, somente nos territórios anexados pela URSS em setembro de 1939, foram deportados como colonos especiais para a Sibéria, a região de Arkhangelsk, o Cazaquistão e outras regiões afastadas da URSS", diz o livro, que continua:

Várias fossas comuns continham os restos de 4.000 oficiais poloneses. As autoridades soviéticas tentaram imputar o massacre aos alemães, e foi somente em 1992, durante uma visita de Boris Yeltsin a Varsóvia, que as autoridades russas reconheceram a responsabilidade direta de Stalin e dos demais membros do Politburo na eliminação da elite polonesa em 1940.

Se um traficante mata outro numa guerra entre bandidos, não há muito motivo para celebrar a "coragem heróica" do traficante vencedor. A União Soviética foi crucial para a derrota nazista, sem dúvida, mas isso não a torna louvável em hipótese alguma. Os líderes ocidentais dos países livres tiveram de engolir Stalin muito a contragosto, e logo depois começava a Guerra Fria.

Os poloneses têm razão, portanto, em reagir a essa escolha de Putin para abrir as comemorações da libertação em Auschwitz. E por falar em Polônia, o discurso mais memorável de Trump até hoje foi justamente aquele em Varsóvia, em que enalteceu os valores da liberdade que a América e o Ocidente representam, contra ideologias totalitárias como o comunismo e o nazismo:

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