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Por Gabriel Wilhelms, publicado pelo Instituto Liberal

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Um encontro entre o presidente Bolsonaro e artistas sertanejos trouxe à tona a discussão em torno da polêmica meia-entrada. Na reunião, o representante da Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape), discursou contra a meia-entrada e defendeu a sua extinção. O assuntou chegou a parar no topo dos trending topics do Twitter na semana passada.

Aqueles que criticam uma eventual extinção do “benefício” argumentam que isso não acarretaria a redução de preços, afinal, sendo os empresários gananciosos, eles “embolsariam” a diferença, engordando a margem de lucro. Trata-se, é claro, de um argumento desprovido de qualquer noção básica de microeconomia, mas como isso por vezes é o pensamento popular, vale se debruçar sobre a questão.

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Peguemos as salas de cinema como um exemplo. Na minha cidade o ingresso normal gira em torno de 22 reais, porém há constantes promoções no meio da semana em que os ingressos podem ser adquiridos por até metade desse valor. Além disso, uma grande parte dos que vão ao cinema nos fins de semana, enquanto está em vigência o preço total, são estudantes ou se enquadram em alguma categoria de meia-entrada. Logo, na prática, uma grande parte dos consumidores, provavelmente a maioria, pagam a metade.

Isso não acontece por acaso. Sabendo que precisam cumprir a lei, as salas de cinema devem tentar determinar qual o percentual de ingressos meia-entrada que terão que vender e buscar um preço de equilíbrio, considerando a demanda. A lei atual determina que um mínimo de 40% dos ingressos seja disponibilizado nessa modalidade. O preço final escolhido será maior que seria se não houvesse a meia-entrada – isso porque as salas de cinema já consideram que boa parte irá adquirir a meia-entrada e o valor da meia-entrada precisa cobrir os custos e gerar o lucro esperado.

Tanto isso é verdade que no exemplo que dei o cinema não apenas vende uma cota de ingressos meia-entrada, mas vende de maneira promocional por esse valor no meio da semana, mesmo para aqueles que não se enquadram na meia-entrada. O mesmo pode ser observado em festivais e shows em que muitas vezes os responsáveis pela checagem dos ingressos sequer se preocupam em verificar se os adquirentes fazem ou não jus ao benefício. Já fui até em shows internacionais em que nem ao menos a carteira de estudante foi requisitada para aqueles que compraram nessa condição.

Isso cria um público consumidor que só vai ao cinema porque paga a meia-entrada – entendendo-a como a metade do dobro, obviamente. Se a meia-entrada acabasse e as salas de cinema quisessem manter o preço original, no caso do exemplo, R$22, o que aconteceria é que uma grande parte dos consumidores deixaria de ir ao cinema. Isso significa uma queda na demanda, afinal, há quem só tenha a disposição de ir se o ingresso estiver mais barato ou pela metade. Com a demanda caindo, segue o jogo: os preços também deverão cair para voltar a atrair a massa de consumidores que foi perdida.

Isso no caso de as salas de cinema manterem o preço, como sugerem os conspiracionistas que elas farão. Se eles estiverem certos (não estão), o próprio mercado “puniria” essas empresas e elas seriam obrigadas a baixar os preços de acordo com a demanda.

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O exemplo que dei foi com salas de cinema, mas a lógica segue para qualquer situação em que se cobre meia-entrada. “Ah, mas as empresas não são honestas”. “Ah, mas aqui é o Brasil”. Não é questão de honestidade e também não é questão geográfica. Os detratores do empresariado pensam que eles não são altruístas, benevolentes e que só pensam no lucro na hora de formularem seus preços? Estão certos: encher os bolsos certamente é a motivação dos empresários, justamente por isso que manter os preços no mesmo patamar após a extinção da meia-entrada seria burrice e geraria perda de receitas, ao contrário do que se imagina.

Vale notar que o decreto que regulamentou a meia-entrada e estabeleceu a cota de 40% é de outubro de 2015. Portanto, antes disso era mais difícil para os empresários precisarem qual o percentual de ingressos que deveriam vender pela metade do preço, afinal, nem todos os consumidores se enquadravam em algum critério do “benefício”.

Diante do exposto, extinguir a meia-entrada seria uma boa ideia? Certamente, uma vez que eliminaria uma distorção intervencionista. A possibilidade de o preço ser reajustado de modo a tornar a metade do ingresso o preço de fato não significa que ninguém saia prejudicado, pois aqueles que não se enquadram em nenhum critério têm que pagar um valor mais elevado, subsidiando, portanto, o “direito” alheio, como sempre acontece com esse tipo de política.