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A bajulação corrompe: Marina vai precisar ser salva pelas críticas
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Já que Marina Silva é hoje a favorita para vencer as eleições e Eduardo Giannetti da Fonseca é um de seus principais conselheiros, resolvi resgatar três textos antigos com base em seus livros, para levar aos leitores um pouco do que ele pensa. Se o economista tiver peso e influência na futura gestão de Marina, nem tudo estará perdido.

Mas essa é uma premissa otimista, e tudo é incerto quando se trata dela. Espera-se que Giannetti realmente pratique o que prega e lute contra a bajulação que fortaleceria o autoengano da candidata, que já adota uma postura um tanto messiânica e conta com um séquito de puxa-sacos.

Alguns dizem que Marina é o Lula de saias. Talvez. Há algumas semelhanças, e esse primeiro texto ataca justamente o “efeito Teflon” de Lula, com base nos conceitos de Giannetti e outros pensadores. Segue:

A bajulação corrompe

“A grande vaia é mil vezes mais forte, mais poderosa, mais nobre do que a grande apoteose; os admiradores corrompem.” (Nelson Rodrigues)

Os principais observadores da natureza humana sempre tiveram receio do estrago que a vaidade pode nos causar. Gostamos de elogios, mesmo os insinceros, enquanto criamos mecanismos de defesa contra as críticas duras. O auto-engano pode ser uma estratégia útil para a sobrevivência, como diz Eduardo Giannetti em seu livro sobre o tema: “o enganador auto-enganado, convencido sinceramente do seu próprio engano, é uma máquina de enganar mais habilidosa e competente em sua arte do que o enganador frio e calculista”. O enganador embarca em suas próprias mentiras, e passa a acreditar nelas com toda a inocência e boa-fé do mundo. Assim fica mais fácil convencer os demais.

Justamente por conta disso a adulação popular ajuda a criar monstros perigosos. Aqueles que passam a se cercar somente de bajuladores, enquanto concentram mais poder e conquistam as massas, acabam blindados contra todo tipo de crítica. Os conselheiros mais sábios ficam impotentes diante da reverência do povo e, como Cassandras, fazem alertas em vão. De tanto escutar que é uma espécie de messias salvador, o governante populista pode acabar acreditando. Aí reside o maior risco para a sociedade.  

Adam Smith, em Teoria dos Sentimentos Morais, fez um alerta desse tipo: “Nas cortes de príncipes, nos salões dos grandes, onde sucesso e privilégios dependem, não da estima de inteligentes e bem informados iguais, mas do favor fantasioso e tolo de presunçosos e arrogantes superiores ignorantes; a adulação e falsidade muito freqüentemente prevalecem sobre mérito e habilidades. Em tais círculos sociais, as habilidades em agradar são mais consideradas do que as habilidades em servir”. Quando o mais importante na vida de alguém é agradar o poderoso governante, a primeira coisa a ser sacrificada será a sinceridade.

Poucos negariam que a situação brasileira se aproxima deste cenário preocupante. A popularidade do presidente Lula está nas alturas, a imprensa parece filtrar todas as notícias através de uma lente benigna em prol dele, os intelectuais o tratam com incrível condescendência, e até mesmo um filme foi feito para o “filho do Brasil”.

Como diz o editorial do Estado de São Paulo hoje (28/01/2010), há uma espécie de “salvo-conduto que lhe permite, diante dos mais diversos públicos, trafegar sem restrições pelos mundos da retórica, dizendo uma coisa e o seu contrário, construindo verdades de ocasião e exercendo, como já se apontou, o seu notável talento para a quase-lógica”. O presidente adquiriu uma imunidade que nenhum outro cidadão teria em seu lugar. Qualquer outro seria julgado de forma severa por aquilo que Lula diz sorrindo. Há um “efeito Teflon” quando se trata do presidente, já que nenhuma sujeira gruda em sua pessoa.   

O problema é que essa bajulação toda ajuda a despertar a megalomania do presidente, alimentando sua vaidade de forma incrível. O poder corrompe, e o excesso de poder concentrado em alguém vaidoso e popular corrompe ainda mais. Nunca antes na história desse país um presidente contou com tanta indulgência dos críticos. Lula está perdoado por qualquer pecado antes mesmo dele acontecer.

Ele pode se aliar aos mais antigos caciques da política, beijar a mão deles, rir enquanto afirma ser aquilo uma aula de como se fazer política, e tudo é perdoado pelo povo. Ele pode aderir às piores práticas da política nacional, passar a mão na cabeça dos réus de formação de quadrilha do seu partido, que poucos terão coragem de subir o tom das críticas. Se se trata de Lula, então é tudo parte do “jogo democrático”. Cristo teria que se aliar a Judas para governar o Brasil, não é mesmo?

“O mal de quase todos nós é que preferimos ser arruinados pelo elogio a ser salvos pela crítica”, disse Norman Vincent. O antídoto, Schopenhauer já havia dado: “Os amigos se dizem sinceros; os inimigos o são; sendo assim, deveríamos usar a censura destes para nosso autoconhecimento, como se fosse um remédio amargo”. O presidente Lula precisa escutar com mais carinho os seus críticos. Até porque, nesse caso, quem pode ser arruinado não é apenas o presidente, mas todo o povo brasileiro.

Rodrigo Constantino

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