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Catastrofismo: uma crítica legítima ao anti-bolsonarismo
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Passei a intensificar o tom das minhas críticas ao governo e à postura do presidente, especialmente quando se deixa influenciar por seus filhos e seu guru, e com isso perdi vários seguidores mais intolerantes e outros passaram a me comparar a Reinaldo Azevedo.

Não ligo para tais ataques, pois há muita porcaria nas redes sociais. Acordei hoje vendo que Emir Sader tinha dado RT em texto do Reinaldo. Somente no dia em que alguém como Sader compartilhar meu texto ficarei mais preocupado a ponto de questionar minha sanidade.

Mas há uma turma que faz críticas construtivas. É o caso do meu amigo Guilherme Fiuza. Em nosso debate no último podcast Ideias sobre a radicalização do bolsonarismo, Fiuza reclamou da mídia só falar do que há de ruim, sem mostrar as coisas positivas do governo. Ele cunhou a expressão “corneteiros do fracasso” para se referir a essa gente.

Ele tem um ponto, ainda que os petistas também tenham reclamado dos “pessimistas”, inclusive criando o personagem Pessimildo para tentar ridiculariza-los. O tempo mostrou que os pessimistas, no caso, eram apenas realistas melhor informados. Não sabemos ainda o futuro, e o tempo dirá quem está certo hoje: se os muito empolgados com o governo, ou se seus críticos severos.

É preciso, porém, reconhecer que a imprensa, em geral, recorta notícias negativas mesmo, pois é de sua natureza. E no caso específico de Bolsonaro há evidente antipatia, preconceito, viés ideológico contrário, o que em nada ajuda. Muitos viram, então, torcedores do contra, deixando a análise de lado.

Quem me coloca nesse grupo, porém, está bem equivocado. Como analista, procuro ser o mais imparcial possível, mas nunca escondi o meu próprio viés de liberal-conservador. Ou seja, cheguei a defender abertamente o voto em Bolsonaro, e não tento ocultar minha profunda admiração pela equipe econômica montada por Paulo Guedes, que foi meu chefe e quem conheço bem.

Ou seja, jamais torceria contra o governo. Se venho fazendo tantas críticas, é por basicamente dois motivos: 1) realmente tenho receio da ala mais radical que tanto influencia o presidente, e que demonstra clara tendência ao autoritarismo nacional-populista; 2) vejo como uma oportunidade de ouro ter essa turma boa no governo e entro em desespero ao pensar que tudo pode se perder por conta da ala jacobina.

É mais ou menos assim: nem perderia muito tempo criticando o time de Várzea, mas o meu Flamengo sim, ainda mais depois de organizar a casa, encher os cofres de dinheiro e contratar inúmeras estrelas. Se, por incompetência, negligência ou intransigência burra o time se recusasse a vencer, estaria revoltado com a chance desperdiçada.

As duras críticas construtivas ao governo e, principalmente, ao bolsonarismo se devem justamente a essa sensação de que poderemos levar muito tempo até ter uma figura como Paulo Guedes no comando da economia, com uma equipe de primeira espalhada nos demais departamentos. E por conta de Golden Shower, de mitada em rede social, de fanatismo da militância revolucionária, corremos o risco de perder o jogo, apesar dos craques.

É por isso que concentro o fogo pesado nessa turma olavista. Vejo o quanto atrapalha o governo. Não é torcer contra, e não é ser “corneteiro do fracasso”, mas sim lamentar a energia dissipada com baboseira, e ver um grupo fanático e autoritário dominando o coração do próprio presidente muitas vezes, por meio de seus filhos. Se essa gente foi útil numa campanha eleitoral, isso não quer dizer que sua postura seja desejável no governo.

Trump teve apoio de radicais e contou com o estrategista Steve Bannon durante a campanha, mas soube se afastar deles depois, chutando Bannon da Casa Branca e fazendo críticas aos extremistas da alt-right. Como comentei no Jornal da Manhã hoje, Bolsonaro, ao se reunir com os representantes dos demais Poderes, sinaliza afastamento da sua ala radical, mas resta saber se é para valer ou apenas mais uma tática de “morde e assopra”.

Muitos liberais e conservadores já jogaram a toalha, convencidos de que Bolsonaro tem sua essência no extremismo mesmo, que os acenos institucionais são puro jogo de cena, uma vez que sua mente e seu coração pertencem ao olavismo, sob a estratégia de permanente confronto com inimigos terríveis, reais ou imaginários. Eu respeito essa visão, mas espero que esteja errada. Não perdi ainda as esperanças.

E por isso fecho com notícias que foram publicadas na imprensa demonizada pelo olavismo, apesar de receberem menos destaque do que deveriam ou do que os aspectos negativos. É uma série que tem circulado no WhatsApp, para mostrar que nem tudo é desgraça. São, porém, promessas futuras de investimentos, enquanto a realidade presente é a de uma economia patinando, que depende das reformas macro para deslanchar:

Brasil vence a China e recebe nova fábrica de motor da Fiat

Scania anuncia investimento de R$ 1,4 bilhão em fábrica de caminhões em SP

Carrefour prevê investir R$ 2 bi no Brasil em 2019

Hyundai anuncia investimentos de R$ 125 milhões em Piracicaba

Fiat vai investir R$ 16 bi no Brasil até 2024

Empresas do Japão querem investir no Brasil, diz embaixador

Honda investe R$ 500 milhões na fábrica de motos de Manaus

General Motors anuncia investimentos de R$ 10 bilhões em fábricas paulistas

São notícias de fevereiro até maio deste ano, no começo do governo Bolsonaro, e mostram o enorme potencial de investimentos no país. Mas tudo isso depende, claro, da estabilidade política e econômica. E é aí que mora o perigo…

Ao investir numa narrativa antipolítica, antagônica ao Congresso, o bolsonarismo gera instabilidade e coloca em risco as reformas necessárias. Como eu disse, alguns acham que isso é da natureza de Bolsonaro e não há possibilidade de ele mudar, por isso apostam no conflito permanente, que tornará a vida de Paulo Guedes muito complicada. Há base para tal crença.

Mas como sou um eterno otimista, ou um realista esperançoso, prefiro crer que Bolsonaro vai entender a necessidade de efetivamente mudar de postura e se afastar do seu guru e também de seus filhos, quando o assunto for governo. Ele se diz muito inspirado em Trump. Pode observar o que fez o presidente americano, lembrando ainda que nos Estados Unidos é mais fácil, pois é um sistema bipartidário, enquanto Bolsonaro depende de um Congresso fragmentado. Achar que com “pressão popular” resolve esse dilema é de uma ingenuidade assustadora.

Em suma, temos uma oportunidade incrível de avançar com uma pauta reformista. Daí meu desespero ao ver que tudo isso pode ir por água abaixo por conta do fanatismo de uma seita que conseguiu infiltrar adeptos no governo, e bem perto do próprio presidente. Não é ser “corneteiro do fracasso”, Pessimildo ou catastrofista. É fazer análise realista com base nos fatos e no conhecimento, e sem se deixar levar pela militância.

Rodrigo Constantino

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