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Caveat Emptor: mais liberdade e menos paternalismo no mercado de capitais
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O Brazil Journal, de Geraldo Samor, publicou hoje um texto do advogado Alexandre Costa Rangel em que prega um choque de liberalismo estendido ao mercado de capitais também. O autor busca em Milton Friedman, “pai” da Escola de Chicago, da qual o ministro Paulo Guedes é cria, inspiração para defender mais liberdade com a concomitante responsabilidade nesse importante setor, regulado demais atualmente por conta de uma mentalidade paternalista. Diz ACR:

O choque liberal que o novo Governo está aplicando à economia precisa ser estendido também ao mercado de capitais brasileiro, onde o investidor, de modo geral, é tratado como um incapaz e ainda se verifica um elevado custo de observância das normas aplicáveis, onerando os participantes.
 
Milton Friedman, o expoente da Escola de Chicago, escreveu que “a essência da filosofia liberal é a crença na dignidade do indivíduo, em sua liberdade de usar ao máximo suas capacidades e oportunidades de acordo com suas próprias escolhas, sujeito somente à obrigação de não interferir com a liberdade de outros fazerem o mesmo.”
 
Existem hoje boas chances de as reformas estruturais serem aprovadas, de os juros permanecerem nos menores níveis históricos (para pesadelo dos rentistas) e de o Brasil continuar a usufruir de um ambiente político-institucional estável e democrático. Nesse cenário, nosso mercado de capitais tende a desempenhar um papel cada vez mais relevante.

[…]

​Com o aquecimento do mercado de capitais, uma questão regulatória a ser enfrentada consiste no fato de que o investidor ainda é tratado como a parte hipossuficiente da relação que se estabelece entre poupador e tomador. Percebe-se, nas regras atuais, uma presunção quase absoluta de incapacidade para uma adequada e refletida tomada de decisão por parte do investidor. 

Diversas opções de investimento – acompanhadas de expectativa de rentabilidade mais expressiva e dos respectivos riscos – ficam restritas apenas a um seleto clube de investidores.  Por exemplo, o investimento em Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) e em Fundos de Investimento em Participações (FIP) apenas é permitido aos chamados ‘investidores qualificados’, que são aqueles com mais de R$ 1 milhão em investimentos financeiros, o que representa um número ainda reduzido de pessoas físicas no Brasil.

Em seguida, o advogado, especializado em mercado de capitais, apresenta algumas propostas já em debate para desburocratizar o setor, dando mais liberdade e cobrando maior responsabilidade dos agentes envolvidos. Esse é o caminho. Um mercado de capitais desenvolvido é conditio sine qua non para o progresso de uma nação. Com a redução do papel dos bancos públicos, será ainda mais relevante como fonte de capital o mercado financeiro. Para ele deslanchar, porém, é preciso reduzir a regulação paternalista.

Como se diz no próprio mercado, caveat emptor, ou seja, que o comprador do produto fique atento ao que está comprando. Esperar dos órgãos reguladores, como a CVM, uma onipotência clarividente é uma ilusão, uma perigosa ilusão. Cheguei a escrever um texto na época da crise de 2008 sobre as falhas da SEC, a CVM americana, mostrando como foi o próprio mercado que fez alertas sobre gestores e produtos suspeitos. Disse na ocasião:

O recente e gigantesco escândalo da fraude envolvendo Bernard Madoff revelou uma vez mais as graves falhas do “vigia dos mercados”, a SEC – a CVM americana. Sua função é justamente proteger os investidores, e sua existência pode acabar criando um moral hazard, já que muitos investidores passam a confiar na fiscalização da SEC, deixando de lado uma análise mais rigorosa. Se a SEC garante, então deve ser bom! Infelizmente, não costuma ser bem assim.

Várias fraudes passam despercebidas pela SEC. Como o órgão pertence ao governo, e ignora os mecanismos de recompensa e punição do mercado – ou seja, lucro e prejuízo – não há um incentivo adequado para maior eficiência das análises. Além disso, sempre existe o risco de captura da agência pelo setor privado. Uma grande empresa pode exercer forte influência no quadro de funcionários da SEC, prejudicando a imparcialidade necessária para um bom serviço de análise.

No caso Madoff, não é preciso ficar apenas na teoria. Harry Markopolos, que já trabalhou para uma firma concorrente de Madoff, tentou por vários anos convencer a SEC de que os retornos apresentados por Madoff eram bons demais para ser verdade. Seu esforço não obteve bons resultados, e a SEC arquivou o caso. Por outro lado, a Aksia, uma empresa privada contratada por investidores para avaliar os gestores, publicou vários relatórios recomendando o afastamento de seus clientes dos fundos geridos por Madoff, com base em inúmeros alertas encontrados em suas análises.

Após vários exemplos, concluí: “Em resumo, não se pode ignorar que existem diversas falhas no funcionamento da SEC. O ideal é reduzir ao mínimo possível a quantidade de amarras burocráticas, e focar nos casos de fraude sem asfixiar o livre mercado. Lembrando sempre da máxima caveat emptor, ou seja, deixe que o comprador fique atento!”

Espero que o novo governo siga nessa direção. Paulo Guedes atuou por décadas no mercado financeiro, e sabe melhor do que ninguém das limitações dos órgãos fiscalizadores, assim como entende como poucos a importância da liberdade com responsabilidade, que só pode ser fomentada se os investidores assumirem os riscos de suas escolhas.

Rodrigo Constantino

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