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A imagem do garotinho morto na praia após fracassada tentativa de entrada ilegal na Europa por sua família chocou e emocionou o mundo todo. Mas emoções e sensibilidade não costumam resolver os problemas estruturais. O que realmente fazer diante da crise de imigrantes que fogem desesperados dos países em guerra civil como a Síria ou dominados pelo terrorismo do Estado Islâmico? Não há resposta simples.

Mas João Pereira Coutinho arrisca uma em sua coluna de hoje: o regresso do neoconservadorismo. O regresso do próprio Coutinho, após merecidas férias, é sempre bem-vindo, pois o conservador português traz invariavelmente argumentos interessantes que produzem uma saudável reflexão. E seu ponto de vista sobre esse complexo assunto parece bastante razoável.

Em primeiro lugar, ele não alivia a barra do neoconservador Bush, que acertou ao invadir o Afeganistão para caçar os talibãs após o 11 de setembro, mas errou ao invadir o Iraque de Saddam Hussein, ou ao menos errou na estratégia traçada após a invasão. Ao desestabilizar as forças conflitantes das diferentes seitas locais, que de certa forma o regime cruel e ditatorial de Saddam mantinha controladas, Bush ajudou a influenciar na origem do Estado Islâmico.

Mas tampouco Obama é poupado. Sua política de retirar as tropas o mais rápido possível e reduzir o papel dos Estados Unidos como o “xerife do mundo”, por não ver nada de excepcional em seu papel pela paz global, acabou por jogar mais lenha na fogueira, e permitiu o crescimento exponencial dos terroristas islâmicos.

Coutinho chama essa “ambição caridosa” de Obama de “patética” e, de fato, é coisa de jardim da infância, de quem coloca a retórica acima da realidade, de quem se importa mais com o belo som das próprias palavras do que com as consequências de seus atos. O presidente que recebeu um Nobel da Paz antes mesmo de começar a governar acabou contribuindo, e muito, para a escalada da violência na região.

Como liberal que já foi até libertário, entendo as críticas aos neoconservadores. Essa ideia de defender o governo americano como polícia do mundo é um tanto arriscada, além de custosa para os pagadores de impostos americanos. Mas é um fardo que todo líder mundial precisa, de certa forma, encarar. A “pax romana” dependia do poder de Roma, a “pax britânica” da marinha inglesa, e a “pax americana” depende, ainda, da intimidação e poder do governo americano. Ser líder não é moleza, nem barato.

Da mesma forma que os americanos ajudaram na Segunda Guerra a salvar a Europa do nazismo, e depois a salvá-la do comunismo na Guerra Fria, os neoconservadores acreditam que é função dos americanos salvar o mundo do terrorismo islâmico, uma das maiores ameaças do momento. O leitor é totalmente livre para discordar disso, mas não deveria, por isso, ignorar o fato de que a inação também gera consequências.

Eis a maior mensagem dessa confusão toda: deixar os “malucos” em paz não garante que o resultado de sua maluquice ficará restrito às suas fronteiras. Coutinho resume muito bem o que está em jogo:

A filosofia “neoconservadora” levou Bush para o Afeganistão (certo) e arrastou-o inutilmente para o Iraque (errado). E esse erro alimentou em Barack Obama o mesmo sentimento que os americanos tiveram depois da Primeira Guerra Mundial: um sentimento isolacionista, próprio de quem está cansado de ser a polícia do mundo.

Infelizmente, o mundo não tira férias quando os Estados Unidos decidem regressar para a toca. E não deixa de ser irônico que a filosofia “neoconservadora”, depois de todos os erros, seja hoje a única proposta realista para o problema: quando não tratamos dos problemas fora das fronteiras, eles acabam por cruzá-las com fúria e estrondo.

Sem ações militares contra o terrorismo jihadista, o Estado Islâmico conquistará cada vez mais territórios, irá desestabilizar cada vez mais países, e o fluxo migratório será cada vez maior. Alguém realmente acha que colocar milhões de muçulmanos foragidos para dentro dos países europeus em crise com seu estado de bem-estar social falido é uma boa solução, ou que é livre de graves consequências?

O debate sério, aqui, não tolera a retórica infantil e sensacionalista de quem só está preocupado com a própria imagem perante o público, e não com os efeitos concretos do que defende. Não há saída fácil para o enorme e complexo problema. Mas sabemos que a “primavera árabe” não passou de uma ilusão desses mesmos românticos sem compromisso com a realidade, e que sem um freio militar, os terroristas islâmicos farão um estrago cada vez maior, não só nos territórios que conquistarem, como no mundo todo.

Rodrigo Constantino

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