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Por Percival Puggina

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Em 5 de outubro de 2002, véspera do primeiro turno da eleição presidencial, Lula, Duda Mendonça, Antônio Palocci e mais dúzia e meia de companheiros cujos nomes não ficaram registrados para a história jantaram na Antica Osteria Dell’Agnolo, em Ipanema. Nas libações do encontro, com mesuras que superavam, de longe, as prestadas ao candidato, Duda ofereceu a Lula uma garrafa do vinho Romanée Conti. A primorosa dádiva, à época, teve seu preço estimado em R$ 6 mil.

A notícia correu o Brasil. Remover uma rolha de Romanée Conti era e continua sendo gesto de suntuosidade. Coisa para milionários de hábitos espalhafatosos, dados a excentricidades. Políticos, em parte alguma do mundo, bebem de certas marcas, ainda que possam pagar por elas pois expressam um nível de consumo desalinhado dos padrões da sociedade com a qual procuram se identificar. O fato se tornou tão notório que o dono do restaurante criou uma espécie de memorial onde, em estojo de madeira, a famosa garrafa ficou entronizada, com a inscrição “Lula lá 05/10”, até ser roubada, em 2009, durante incursão noturna de um larápio.

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Nunca me pareceu convincente o discurso que procura escriturar, como bem das esquerdas, a sensibilidade face às carências alheias, a austeridade e o senso de justiça. Um mínimo conhecimento de História mostra o elevado padrão de vida que a nomenklatura dos países do Leste Europeu se atribuía, em total discordância com a escassez imposta ao restante da população. Quem vai a Cuba logo ouve falar dos que “tienem la heladera rellena” (geladeira cheia), ou seja, dos que gozam os privilégios de consumo concedidos à alta burocracia partidária, longe das restrições determinadas pela libreta (de racionamento).

Com isso não quero dizer que não existam, na esquerda, pessoas sinceramente preocupadas com questões sociais e que vivam segundo os valores que proclamam em seu discurso. Mas recuso totalmente a tese de que esses mesmos valores não sejam igualmente assumidos e praticados por pessoas de outras correntes ideológicas, ou mesmo sem ideologia alguma. Por outro lado, o caminho da maior prosperidade jamais passou pelos conceitos socialistas fundamentais – estatismo, luta de classes, negação da propriedade privada, planificação econômica. Por saberem disso, esses radicais que andam por aí fazendo discurso contra a liberdade de mercado e contra as empresas privadas, não lutam para implantar suas ideias com o intuito de trabalhar no chão de alguma fábrica. Nem pensar! O que eles querem é ganhar de presente a poltrona, o tapete e a adega do patrão. Ou, mais régio e mais adequado a tempos bicudos, a diretoria de uma estatal ou fundo de pensão.

Os anos seguintes vieram mostrar o espantoso surto de enriquecimento pessoal que acometeu grande parte da elite governante do país, hoje às voltas com a Justiça e à beira de um ataque de nervos. Os primeiros sintomas de que voraz organização criminosa se aproximava do poder, contudo, foram emitidos já naqueles primeiros momentos em que começou a faltar, aos vitoriosos, a virtude da moderação. Eles enriqueceram e o Brasil quebrou.

O poder é um vinho perigoso. Retirada a rolha pode trazer à tona verdades inconfessáveis.

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