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Filhos do presidente dobram aposta em retórica de confronto e prejudicam governo
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Foi um fim de semana patriótico, com uma bonita comemoração do 7 de setembro, num país que precisa mesmo resgatar sentimentos mais positivos sobre seu país. Em seguida, o presidente foi submetido a mais uma cirurgia, e tudo ocorreu bem. Nesse clima, porém, o que chamou a atenção não foi nada disso, e sim a retórica revoltada e beligerante dos filhos de Bolsonaro.

Carlos, o mais pitbull, publicou uma mensagem chula, agressiva, infelizmente já de praxe:

Já seu irmão Eduardo foi por outra linha, insinuando que quem o critica deve ser fake esquerdista ou vendido:

Ambos parecem aprisionados em bolhas, incapazes de compreender o mundo lá fora. Tomaram o ambiente tóxico das redes sociais como realidade, e tentam espalhar ódio, promover conflitos permanentes, encontrar inimigos mortais por todo canto, tudo para não precisarem rebater críticas legítimas. Por exemplo: nenhum deles comenta sobre a escolha de Augusto Aras para PGR.

Alguns podem tentar relativizar a bestialidade desses filhos, mas como, se o próprio presidente confia mais neles para assuntos políticos do que em seus bons ministros, e credita sua vitória ao jeito Carluxo de ser? Não, isso não é “apenas” estupidez de Twitter. É sintoma de algo bem sério!

“Esqueça os dois, eles nem fazem parte do governo”. Vários reagiram com variações sobre esta mesma mensagem. É muita forçação de barra. É triste chegar nesse nível de cara de pau. Afinal, todos sabem da atuação influente dos filhos no governo, inclusive com frituras de ministros que acabaram demitidos.

A tática mais patética do típico minion é repetir que toda crítica aos Bolsonaro é porque se tem “obsessão” ou algum “fetiche” por eles. Caramba! Um é presidente da República, o outro deputado federal e quer ser embaixador dos Estados Unidos, e o outro é vereador e quer controlar a mente e o Twitter do pai. Se fossem todos para a Hungria bajular o nacional-populista Orbán e deixassem os brasileiros em paz, ninguém mais falaria deles…

O editorial do Estadão hoje falou sobre essa “polarização inoperante” no país, com radicais de esquerda e direita disputando o poder. Do lado “direito” ela é promovida pelo próprio Bolsonaro, e tem em seus filhos o real motor. Eis um trecho:

O País precisa urgentemente de caminhos concretos, com propostas de curto, médio e longo prazos, para enfrentar os prementes desafios do crescimento econômico, do emprego, da educação, da saúde, do saneamento e de tantas outras áreas. Essas soluções não virão, no entanto, por passe de mágica. Elas são decorrência do estudo, do diálogo e da negociação – e os grupos militantes extremistas não estão dispostos a percorrer nenhuma dessas etapas. Esse é o grande drama da polarização – inviabiliza as soluções.

A polarização tem atrapalhado o governo do presidente Jair Bolsonaro. É nítida sua dificuldade para apresentar propostas para os problemas reais, bem como para estabelecer com as diversas forças políticas um diálogo capaz de gerar soluções. Ao longo desses oito meses de governo, ele optou por privilegiar uma pauta ideológica, dirigindo sua ação e seu discurso a um grupo cada vez mais restrito de seguidores. Em vez de colocar o seu governo a serviço de todos os brasileiros, o presidente Jair Bolsonaro aninhou-se numa ponta do espectro político, o que causa prejuízos não apenas internamente, mas também nas relações do Brasil com a comunidade internacional.

A população já percebeu esse modo de proceder do presidente Bolsonaro e está cada vez mais insatisfeita, como se vê pelas pesquisas de opinião. Mas a oposição que poderia corrigir os desvios do governo mal existe. Governo e oposição, imersos em suas concepções reducionistas, não estão preocupados com a realidade e muito menos em dar resposta aos problemas reais. O País fica à deriva.

O jornalista Carlos Alberto Di Franco, que tem uma preocupação com o viés “progressista” da imprensa e defende valores atribuídos ao conservadorismo, publicou em sua coluna hoje uma mensagem importante sobre o atual governo, tentando compreender sua postura, mas lamentando os excessos nesse clima de guerra, especialmente contra a mídia:

Jair Bolsonaro, com suas virtudes, seus defeitos e seu estilo “presidente mesa de bar”, soube captar o pulsar profundo da sociedade. Sua mensagem – na política, na economia, na segurança pública, na defesa dos valores – foi ao encontro de um sentimento latente na alma nacional. Isso explica boa parte do seu desempenho. Passou como um tanque e arrasou o antigo mapa do poder: grandes partidos encolheram, velhos caciques foram pulverizados, antigas fontes desapareceram e a esquerda está literalmente no córner. O velho modelo perdeu vigor, rumo e identidade.

As redes sociais tiveram papel decisivo. Bolsonaro falou diretamente com o eleitorado. Rompeu, como nunca antes se tinha visto, a intermediação das empresas de comunicação. Agora, sentado na cadeira presidencial, continua na mesma toada. Bolsonaro está nas manchetes, nas páginas de política e nas discussões midiáticas.

[…]

Creio que muitas vezes o presidente estique excessivamente a corda da sua comunicação disruptiva. Mantém sua militância unida e motivada, mas corre o risco de perder o importante capital representado por aqueles que querem mais governo e menos confronto, mais diálogo e menos conflito. O Brasil, não esqueçamos, é um país de consenso. Não foi só a roubalheira que fez água no projeto lulopetista de perpetuação no poder. Foi o cansaço provocado pela estratégia do “nós contra eles”.

A agressividade como forma de comunicação pode dar certo no curto prazo. Mas desgasta, e muito, numa perspectiva de médio prazo. Provoca antipatia e acaba transferindo o controle da narrativa para as mãos dos que, espertamente, se apresentam como vítimas da comunicação metralhadora giratória. Em política, o mocinho pode virar vilão muito rapidamente. No mundo da pós-verdade o que importa não é a objetividade dos fatos, mas a força emocional das percepções.

O presidente da República corre o risco de perder a batalha das percepções. A equipe montada por Jair Bolsonaro é muito superior às da era petista. Tem gente séria trabalhando: Paulo Guedes, Sergio Moro, Tarcísio Gomes de Freitas, general Heleno, o porta-voz da Presidência, general Rêgo Barros, e Tereza Cristina, entre outros. Não dá para comparar com ministérios de recente e triste memória. Claro, há a dúvida se os filhos mostrarão seu calcanhar de aquiles e o risco de indevidas tentativas de interferência na Polícia Federal, no Coaf (agora UIF), etc. Bolsonaro tem falado demais. Produz espuma inconveniente para sua própria imagem. 

Em seguida, apesar de reconhecer a má-vontade de parte da imprensa com o presidente, o jornalista afirma que este precisa conversar mais com a imprensa, pois faz parte do jogo: “Bolsonaro, por óbvio, precisa conversar com a mídia. Tenho dito e repetido. As críticas aos governantes, mesmo injustas, fazem parte do jogo. Não é possível recriar uma versão indesejável do ‘nós contra eles’. Não é bom para o País”.

Sobre as suspeitas de que Bolsonaro afrouxou a bandeira ética e se afasta da Lava Jato por conta da delicada situação de seu filho senador, Fernando Gabeira comentou hoje em sua coluna que as máscaras caíram, e que está acostumado com a postura dos seguidores fanáticos, que preferem atirar no mensageiro em vez de rebater a mensagem:

Não há nenhuma surpresa na hostilidade de Bolsonaro às bandeiras que abominava desde a campanha. A novidade é ter se integrado ao esquema que quer desmontar a Lava-Jato. Seus defensores acham que colocar Bolsonaro nessa aliança para subjugar a Receita, a PF e procuradores é má-fé ou desinformação.

As evidências estão aí. Já me acostumei com ardorosos defensores de populistas se recusarem a encarar os fatos, refugiando-se numa narrativa paranoica para justificar o seu ídolo.

Bolsonaro cai nas pesquisas, muito pelas frases que diz, por não se conformar, às vezes, em apenas ter uma opinião sobre um tema: quer também desenterrar mortos para brigar com eles.

Quando os eleitores se derem conta de que sua luta contra a corrupção era apenas da boca pra fora, o prestígio vai desabar mais ainda. Talvez isso se torne nítido quando perceberem que investe contra Moro, que por sua vez se finge de morto.

A reação ao texto do Gabeira – com vários bolsonaristas xingando o autor, o jornal ou a mim, que o divulguei – apenas comprova o que ele disse. Os fanáticos populistas são incapazes de rebater argumentos, de derrubar as suspeitas, e atiram no mensageiro. Sem perceber, endossam a crítica. E seguimos sem um só comentário dos filhos do presidente sobre Aras…

E o resultado é o avanço de uma polarização tóxica que prejudica o governo, como se Bolsonaro fosse um eterno candidato num segundo turno eleitoral, contra a terrível ameaça de volta do petismo (é fundamental para essa estratégia matar qualquer alternativa mais moderada ou ao centro, e isso explica a virulência dos ataques bolsonaristas aos liberais). Acabamos com coisas como esta:

Não sei quem é, e parece totalmente inexpressivo, mas é o resultado de uma narrativa influenciada pelo bolsolavismo: fomentar esse tipo de demente. Pode ser fake ou mesmo esquerdista infiltrado? É uma possibilidade, mas está perto do comportamento de vários desses bolsonaristas fanáticos! E não muito distante do próprio guru e dos filhos do presidente, como vimos acima. Eis o ponto. É urgente mudar o tom!
Rodrigo Constantino 
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