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Narrativa de “golpe militar” serve para mobilizar revolucionários jacobinos de direita
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Uma reportagem da Folha deste domingo diz que a ala militar do governo decidiu passar a ignorar o guru dos filhos do presidente, o filósofo Olavo de Carvalho, pois o recado já teria sido dado. Olavo foi chamado de “Trotski da direita” e de causador dos problemas do governo por importantes generais.

Na direita, cada vez mais gente se manifesta contrária a essa postura contraproducente do escritor de Virgínia. Lobão, que já foi reverenciado por muitos olavetes, gravou um vídeo com mensagem direta a Olavo de Carvalho, condenando essa mentalidade de guerra tribal disseminada pelo filósofo:

O roqueiro foi, naturalmente, massacrado pelos olavetes nas redes sociais, mas recebeu enorme apoio de inúmeros ativistas e pensadores da direita. Lobão não está só nessa tentativa de limpar o conservadorismo dessa mentalidade tribal.

Janaina Paschoal já tinha falado nos petistas com sinal trocado para se referir aos mais fanáticos dentro do bolsonarismo, justamente aqueles que seguem cegamente Olavo. E Alexandre Frota, que subia em palanques ao lado de Bolsonaro durante a campanha, também comprou a briga e tem atacado os olavetes nas redes sociais. O PSL, o governo e a direita estão todos em pé de guerra, pelo visto.

E eis o ponto importante aqui: esse clima de guerra constante é exatamente a principal arma do bolsonarismo. Sem inimigos terríveis ameaçando boicotar sua missão nobre de salvar a civilização ocidental essa gente não prospera. Há “comunistas” e “globalistas” por todo lado, inclusive dentro do governo, ministros “traidores”. É por isso que o próprio presidente tem endossado essa narrativa, e seu filho Eduardo, olavete declarado, fala que venceram uma batalha com a eleição, mas não a guerra.

Já tem olavete falando em “junta militar” governando na prática o país, ou seja, a esquerda estaria certa: a vitória de Bolsonaro foi um golpe militar! O presidente seria figurativo apenas. O discurso prepara a campanha de Eduardo Bolsonaro para 2022: o sistema boicotou o governo do mito e agora é preciso investir mais ainda no ataque às instituições corrompidas.

O nacional-populismo autoritário de Steve Bannon vai plantando raízes no Brasil, dentro do próprio governo. É uma turma que tem feito muito mal ao governo e ao país. Infelizmente, o próprio presidente ou não se dá conta, ou é cúmplice do projeto. Em seu editorial de hoje, a Gazeta adota a primeira visão, uma talvez um tanto obsequiosa para com o presidente:

A primeira coisa a se reconhecer, portanto, é que a raiz da crise parece estar não em má-fé do presidente da República, mas simplesmente na incapacidade de enxergar com clareza e distinção essas considerações, o que pode ser, em parte, fruto de uma carreira e de uma formação que nunca lhe exigiram isso.

Mas qual a gravidade disso? Apesar de se reconhecer que a origem não seja a má-fé, é evidente que uma situação dessa natureza tem potencial para desencadear consequências bastante graves para a administração e para o Brasil, o que justifica toda a atenção que lhe tem sido dada.

[…]

Para evitar o agravamento da situação, e pelo bem de sua própria integridade pessoal, está na hora de o presidente tomar consciência das dimensões do problema, amadurecer em sua posição e sinalizar com clareza que não concorda com os insultos e o clima de “revolução permanente” que certos setores propagam. Divergências são saudáveis para o governo e o país, mas devem ser manifestadas no limite que o dever de respeito à honra alheia impõe a todos – sem exceção.

Pode ser que Bolsonaro faça vista grossa a tanto absurdo por amor aos filhos, por gratidão a Olavo, mas seria assumir a premissa de que o presidente é mesmo muito ingênuo e manipulável. Essa interpretação deixa uma saída honrosa ao presidente, caso ainda queira reverter o quadro.

Mas talvez seja mais realista assumir que Bolsonaro sabe o que seus filhos e seu guru estão fazendo, e por um cálculo político muito arriscado permita essa estratégia. Se for isso mesmo, os conflitos não vão diminuir. É a previsão de Carlos Andreazza.

E, nesse cenário, as reformas arquitetadas por Paulo Guedes correm perigo, por conta desse tribalismo tosco, que seria a essência do bolsonarismo. Vem tsunami aí, como alerta o próprio presidente de forma um tanto irresponsável. Quem viver, verá…

Rodrigo Constantino

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