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O crepúsculo do bolivarianismo
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O socialismo dura até acabar o dinheiro dos outros, alertava Thatcher. Isso valia para o socialismo do século 20. A adaptação para o socialismo do século 21 seria: “O bolivarianismo dura até acabar os petrodólares”. E eles “acabaram”.

Um estudo feito pelo Itaú Unibanco estima que os países latino-americanos perderão mais de US$ 70 bilhões em receitas este ano com a queda do preço das commodities. O Brasil teria uma perda de US$ 14 bilhões. A Venezuela, sozinha, arcaria com quase a metade da perda total: US$ 33,8 bilhões a menos de exportações em 2015.

O país se tornou cada vez mais dependente do petróleo desde Hugo Chávez. Com a bonança na era de preços elevados, o governante populista distribuiu benesses e esmolas, comprando apoio para permanecer no poder. Era anunciado o tal “socialismo do século 21”, em todos os aspectos igual ou muito parecido com o do século anterior.

Mas a farra acabou. Se mesmo com o petróleo a US$ 100 por barril a situação econômica e social da Venezuela já era um caos, fruto do excessivo intervencionismo estatal, agora é um quadro desesperador. A escassez é generalizada, os venezuelanos perdem muito tempo tentando conseguir o que comer, e a violência saiu de controle. O herdeiro de Chávez, Maduro, chegou ao ponto de celebrar a nova lei que permite que o governo atire nos manifestantes. O clima é de guerra civil.

Rodrigo Montoya, ex-ministro da Fazenda da Colômbia, escreveu um texto hoje resumindo o ocaso da revolução bolivariana. O projeto está naufragando, e seu fracasso ficou evidente para todos. Diz ele:

O regime venezuelano conduziu o país ao caos inflacionário e à beira da insolvência. Uma política governamental inepta destruiu a capacidade produtiva nacional e desorganizou os canais de comercialização. O nível de desabastecimento adquiriu características dramáticas. Os venezuelanos estão tendo que dedicar muitas horas à tarefa de buscar alimentos, medicamentos e produtos básicos para o lar.

A queda dos preços do petróleo contribuiu a agudizar a fragilidade de uma economia que já estava bastante deteriorada. O tratamento que as autoridades deram à crise traz à mente uma expressão austríaca: “A situação é desesperadora, mas não é séria.” Nicolás Maduro fez uma peregrinação de 13 dias pela Ásia, Europa e o Oriente Médio. O propósito era pedir à China um empréstimo de US$ 20 bilhões e propor aos países da Opep um corte da produção de petróleo.

Maduro está apelando, desesperado. Chegou a declarar que “Deus proverá” os novos recursos de que necessita. Os empresários, como sempre, são os bodes expiatórios prediletos do governo. Retórica à parte, o fato é que o colapso econômico já coloca forte pressão pela mudança de regime. Montoya especula sobre três possíveis cenários:

O cenário preferido seria o da revogação do mandato de Maduro, após o triunfo da oposição nas eleições legislativas. Um segundo cenário seria o de um regime de transição à democracia integrado por civis e militares constitucionais. Um terceiro cenário seria o de uma desintegração violenta do regime com enfrentamentos armados entre facções distintas. Seja como for, o experimento político que agoniza na Venezuela sugere um final melancólico.

Em entrevista à Folha, o principal líder opositor do atual governo também declara que o modelo de Chávez se esgotou. A Venezuela vive hoje seu pior momento nos últimos 16 anos. Henrique Capriles acredita que deve haver uma guerra dentro do próprio governo, pois ninguém é cego para a crise que assola o país e que deve piorar. Diz ele:

Parece, sim, haver uma guerra no governo. É normal que chavistas tenham a mesma dúvida que 80% dos venezuelanos: será que os líderes não enxergam a crise?

E o pior está por vir, porque ainda não vimos os efeitos da queda do preço de petróleo. Hoje caminhamos com os preços do ano passado, pois as vendas são a futuro. Sentiremos o impacto em março.

O Orçamento nacional foi calculado com base num barril a US$ 60. Hoje entram US$ 40 por barril. A conta não fecha. Isso não se resolve aumentando impostos e gasolina nem desvalorizando a moeda, coisas que até poderiam equilibrar contas do governo em bolívares, mas não resolvem o problema de fundo: não ter dólares para contas externas. Alguém acha que a Odebrecht vai aceitar pagamento em bolívares?

Para Capriles, o ideal seria o governo ser derrubado de maneira constitucional. Mesmo com todas as mudanças na Constituição feitas por Chávez com um Congresso vendido, Capriles diz não aceitar nada fora da Constituição, e que ela permite caminhos alternativos.

Capriles resume bem o que foi o populismo chavista: “Entraram US$ 800 bilhões [de renda petroleira] nos últimos 12 anos neste país, que tem apenas 30 milhões de habitantes. E hoje não há sabão para lavar a roupa”. É o efeito inevitável do socialismo, seja do século 20 ou do século 21.

Não obstante, ainda há quem defenda esse regime, inclusive no Brasil. Capriles está seguro de que a presidente Dilma sabe do desastre que é o bolivarianismo, mas que não pode dizê-lo abertamente. Criticou Lula também, por ter feito campanha a favor do chavismo na televisão.

O fato lamentável é justamente esse: mesmo com todo o sofrimento que o bolivarianismo vem causando ao povo venezuelano, ele ainda encontra adeptos e defensores por aí, e é vergonhoso para nós, brasileiros, que nosso governo o defenda abertamente.

O bolivarianismo caminha para seu crepúsculo, após 16 anos de populismo e autoritarismo, distribuindo miséria e concentrando recursos, sempre em nome do povo. Que o Brasil consiga se livrar dessa ameaça, representada pelos camaradas de Maduro no PT, partido que flerta com esse modelo fracassado e que só não foi capaz de avançar mais porque encontrou obstáculos resistentes no caminho, não por falta de vontade.

Rodrigo Constantino

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