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Os “golpistas” não seriam Renan Calheiros e Luciana Genro?
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Por Lucas Berlanza, publicado no Instituto Liberal

A despeito de ser um instrumento constitucional, rigorosamente legal, e estar sendo conduzido pelos diretamente interessados – com suporte amplo da vontade popular – dentro da legalidade, sem qualquer arroubo revolucionário, é natural que um processo de impeachment presidencial incomode. Por mais irracionais que sejam os argumentos, é esperado que quem é alvo do processo distribua acusações de golpismo e faça uso de um sem-número de maquinações para tentar sobreviver. Algumas figuras que normalmente estariam de fora da discussão, no entanto, deram o ar da graça para combater o impeachment e explicitaram, cada uma por seus motivos particulares, sua aversão aos reclames das ruas.

O presidente do Senado, Renan Calheiros, do PMDB, é a primeira delas. Logo após o peemedebista carioca Picciani perder a liderança da bancada do partido na Câmara e a legenda evidenciar seu racha, Renan deixou claro mais uma vez o seu governismo e desfraldou a bandeira de que o Senado pode revogar todo o procedimento em trâmite na Câmara, recusando-se a acolher o pedido, e de que somente o voto do Senado pode afastar a presidente por 180 dias. Seu discurso parece estar levemente alinhado com o de Fachin, que acolheu o mandado de segurança do PCdoB junto ao STF e está propondo ditar o rito do impeachment ao Congresso – o que não necessariamente é ilegal, caso eles se restrinjam a dirimir dúvidas sobre questões pontuais, tais como o voto aberto ou secreto na formação da Comissão Especial. Entretanto, o tom do ministro, conhecido por suas ligações com o PT e o MST, soa como um claro desafio a Eduardo Cunha, presidente da Câmara, e aos demais deputados, em especial quando ele se dispõe a formular propostas mais gerais. Já não tivemos um processo de impeachment nos anos 90, levado a cabo, sob leis que basicamente não se alteraram? O que torna necessário haver mudanças significativas? Gostaríamos de saber.

Alguns ministros do STF disseram à Época, acerca da tese do governo encampada pelo presidente do Senado, que “a Constituição é clara nesse ponto: se a Câmara aceitar o pedido, o afastamento é automático”. É previsível que se tente “judicializar” o processo o mais possível, recorrer ao STF para tentar obter algum sucesso no “tapetão”, que se queira que o Poder Judiciário tutele o Congresso e respalde todas as manobras imagináveis para sustentar o mandato de Dilma e todos que acreditam depender dela ou obter vantagens com isso – como Calheiros, que talvez suponha ter maior proteção contra as investigações da Lava Jato, também na sua cola. O que não será aceitável é o STF se curvar a isso. Aparentemente, essas tentativas não vão prosperar.

Quem foi mais desavergonhada na explanação do seu golpismo foi ninguém menos que Luciana Genro, eterna musa do combate ao “capital financeiro”, presidenciável em 2014 pelo PSOL. Como essa junção de Socialismo e Liberdade no nome do partido não está com nada e Luciana se esforça em fazer jus ao paradoxo, ela expressou seu desejo de patentear o singular “golpismo antigolpista”. Assim como o PCdoB, o PSOL, apesar de insistir na estapafúrdia declaração de que é oposicionista, é contra o processo de impeachment, e Genro defende a posição utilizando exatamente a principal narrativa petista neste momento: atribuí-lo exclusivamente a Eduardo Cunha. Segundo ela, Cunha e as “forças reacionárias do PMDB” estão articulando uma artimanha para assumir o poder, mesmo sem terem popularidade e legitimidade para tanto, e o impeachment se resume a isso. O fato de que Temer foi eleito junto com Dilma e, portanto, é seu sucessor constitucional, é um detalhe irrisório para Luciana.

Ela prefere uma saída heterodoxa, que aponta em seu perfil nas redes sociais: que a presidente Dilma submeta ao Congresso a ideia de realizar novas eleições gerais. A mesma candidata que, em outubro, defendia uma Assembleia Nacional Constituinte no primeiro ano de um mandato presidencial para dirimir a crise – e que contemplasse uma série de pautas “progressistas” que nós sabemos a que fim conduzem -, agora quer que a presidente simplesmente tente eliminar, com um poder de que não dispõe, uma multidão de parlamentares, senadores, governadores e vereadores eleitos com a participação popular, impondo magicamente um reset inconstitucional que varra tudo e comece tudo do zero. Por mais que o desespero nos possa conduzir a ver uma tal ideia com simpatia, o que poderia ter consequências perigosas, onde estão a lógica e o bom senso em alguém que enxerga golpismo em querer punir um presidente inepto e que infringiu a lei, mas não enxerga em querer pôr fim magicamente a todos os mandatos regularmente empossados?

Olhar a trave no olho do próximo, sem enxergar o argueiro no teu próprio. Assim agem os petistas, assim agem Renan Calheiros e Luciana Genro. Nosso conforto está em que não estamos com a corda no pescoço, receosos de sermos apanhados pelos agentes da lei por traquinarmos com os recursos do pagador de impostos, de maquiarmos os imperativos da ordem legal para posarmos de impolutos num teatro imundo que já não ilude mais ninguém. Tampouco somos demagogos que prometem mundos e fundos aos outros e se contradizem a cada sílaba proferida. Somos gente decente e angustiada, somos o povo brasileiro, e queremos apenas uma coisa: que dentro da legalidade, dentro da ordem – há muito atingida, há muito caducante, há muito abalada -, se faça a justiça. Não vai ter golpe. Vai ter impeachment!

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