• Carregando...
Os privilégios da corte: hiato entre salário do setor privado e do serviço público precisa diminuir
| Foto:

As feministas e os esquerdistas em geral parecem obcecados com as “desigualdades”, e quando falam disso pensam no hiato entre ricos e pobres ou entre homens e mulheres. Ignoram que homens e mulheres ganham salários diferentes, na média, porque optam por trabalhos diferentes, na média, e que os ricos, muitas vezes, criaram riqueza para a sociedade, e por isso acumularam mais. Isso é assim se foi feito por meio da iniciativa privada, num ambiente de livre concorrência.

Agora, o verdadeiro problema, aquilo que deveria indignar qualquer justiceiro social, que teria que tirar do sério um igualitário republicano, é o abismo entre os privilégios da “corte” e a realidade no setor privado, que é forçada a pagar a conta. É esse gap que deveria incomodar os igualitários. Mas não vemos esquerdistas batendo tanto nessa tecla, atacando privilégios do setor público. Claro! Muitos estão justamente vivendo ou tentando viver à custa do esforço alheio, daqueles que criam a riqueza.

Em um tom de desabafo, como de praxe, Fernão Lara Mesquita solta o verbo contra os privilégios do setor público em sua coluna de hoje, citando Modesto Carvalhosa, que recentemente publicou texto no mesmo jornal mostrando disparidades entre público e privado e recursos legais utilizados pelos servidores do estado para aumentarem – e muito – seus ganhos já elevados para os padrões brasileiros. Diz Mesquita:

O que se desvia de dinheiro público para bolsos privados por fora da lei é um troco comparado ao que “o sistema” nos toma usando a Constituição, a lei, as “medidas administrativas” e as decisões judiciais que todos os dias e cada vez mais escreve para si mesmo. […] Os holerites do serviço público não passam de álibis emitidos pelo próprio Estado para enganar o povo e aquela mesma Receita Federal que, tonta e docinha com eles, responde ao contribuinte plebeu sempre com um rugido do mesmo implacável supercomputador que a Nasa usa para pôr um homem em Marte e com que eles vigiam a nossa miséria.

Tudo isso se congela, na sua expressão mais aguda, nas contas da Previdência, porque o funcionário se aposenta no primeiro minuto da idade limite de 50 anos com o último e maior dos salários da carreira – frequentemente um que nunca chegou a receber na ativa, porque é de bom tom entre “colegas” se darem mutuamente promoções de última hora para colher esse efeito. 

[…]

Sobre as boladas que nos arrancam pelo caminho com a lei, então, nem se fala. Contra essas nem mesmo o paladino Sergio Moro e seus indignados mosqueteiros do Ministério Público têm qualquer coisa a opor. É que eles são a corte e a corte não vive no Brasil. Suas diferenças com as dinastias anteriores estão no glacê, e não no bolo. Nem a imprensa de herdeiros, sem direção nem foco, está empenhada em iluminar essa cegueira. E o liberalismo embarcado na boleia do governo, se permanecer emudecido como segue, vai apenas gerenciar a procrastinação para no final ser culpado pelo que não vai ser feito.

São palavras duras, mas verdadeiras. Os liberais da equipe econômica do governo Bolsonaro certamente entendem isso e desejam, sinceramente, mudar esse quadro. Mas vão conseguir? Muito difícil. São muitos e muitos grupos organizados de poder lutando para reagir, para impedir tais reformas estruturais, para valer. A corte tem poder e se acostumou com suas benesses, seus privilégios. Alterar essa realidade não é nada trivial.

Claro que o setor público, para atrair bons quadros, precisa pagar bem, caso contrário quase ninguém vai, pois contar apenas com o espírito público pode ser complicado, especialmente na era do egoísmo. Mas uma coisa é oferecer um pacote razoável de recompensas, para não fazer tão feio frente ao setor privado; outra, bem diferente, é criar inúmeras regalias que abrem um fosso entre as reais remunerações do setor público e aquelas de quem sustenta esses nababos.

Mesquita é direto em sua conclusão: “O Brasil nunca rompeu com a velha ordem aristotélica na qual o senhor e o escravo estão previstos, cada um ‘no seu devido lugar’. Nunca passou à ordem iluminista em que todos nascem e permanecem iguais perante a lei”. Na terra do Carnaval e do jeitinho, todos precisam ser “amigos do rei” para beliscar alguma vantagem da corte, enquanto o nobre conceito republicano de igualdade perante as leis, a única igualdade que presta, permanece ignorado, esquecido.

Inclusive e principalmente pela esquerda igualitária, que fala em igualdade de resultados no setor privado, de olho apenas em abocanhar fatia ainda maior daqueles que produzem, em nome do “povo”. O “bem-estar” da humanidade sempre foi uma boa desculpa para a pilhagem, um álibi para tiranos meterem as mãos no bolso alheio. Mas, se a esquerda é mestre na arte de enganar trouxas, isso não quer dizer que a direita “liberal” consiga reverter essa situação. Mesquita é pessimista e deixa um alerta para fechar:

Se algo não fizer cair a ficha da falência iminente do “sistema”, Jair Bolsonaro, que surfou a onda de uma “libertação” que a censura não permite que o povo brasileiro chegue a definir com precisão, entrará para a História apenas como o protagonista de mais uma troca de dinastias no nosso anacrônico sistema feudal.

Para se tornar de fato um estadista, Bolsonaro terá de comprar a briga junto à sua equipe econômica liberal e cortar na carne, desafiar os privilégios do setor público, a começar pela Previdência. Terá coragem de fazer isso?

Rodrigo Constantino

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]