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Reforma previdenciária é condição necessária, mas não suficiente para retomada de crescimento
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A reforma da Previdência poderá ajudar destravar a economia brasileira, mas não é condição suficiente para garantir a volta do crescimento, apontam economistas ouvidos pela Gazeta do Povo e por agências de notícias. O PIB do primeiro trimestre encolheu 0,2% em comparação com o período anterior, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É o primeiro resultado negativo após oito trimestres de recuperação da atividade econômica.

O economista-chefe do banco Santander, Maurício Molon, afirmou que a reforma da Previdência é fundamental, mas não é tudo. Ele aponta que a reforma tributária, por exemplo, pode ser considerada até mais importante, pois sua aprovação teria o efeito positivo de ajudar na recuperação da confiança, especialmente dos investidores. Concessões e privatizações também seriam bem-vindas.

Uma variável que também preocupa é o risco de recrudescimento da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, as duas maiores economias mundiais, aponta Carlos Thadeu de Freitas, economista-chefe da Ativa Investimentos. O principal impacto é o aumento no risco de desaquecimento global. Até agora, o FMI projeta que a economia global deverá crescer 3,3% neste ano.

As expectativas para o crescimento da economia brasileira vem caindo há 13 semanas seguidas segundo o Relatório Focus, pesquisa semanal feita pelo Banco Central junto a instituições financeiras. O último, divulgado na segunda, sinalizava para um crescimento de 1,23% do PIB.

Molon, do Santander, destacou que a perda da confiança de investidores e consumidores tem contribuído para o fraco desempenho da economia neste ano. Outros fatores, segundo ele, também têm pesado para o baixo crescimento, como o desemprego e a lenta recuperação na concessão de crédito.

O governo Bolsonaro, por meio do ministério de Paulo Guedes, identificou corretamente os dois principais problemas: estabilidade macro, que depende de gastos públicos controlados, e produtividade, que depende de reformas micro.

Ter o diagnóstico certo é o primeiro passo para um tratamento adequado, mas não basta. É preciso capacidade de execução. E é aqui que mora o perigo. O professor Rogerio Werneck, em sua coluna de hoje no GLOBO, diz que Guedes fez bem em alertar para os riscos de uma reforma desidratada, mas que talvez possa ter exagerado no catastrofismo:

Incutir no país o senso de urgência requerido para que a reforma da Previdência seja aprovada tem sido o grande desafio da equipe econômica do governo. E é natural que a campanha de persuasão tenha exigido certo grau de atemorização da opinião pública e do Congresso com as perspectivas desoladoras com que se defrontará o país, caso uma reforma abrangente, com potência fiscal adequada, se mostre, afinal, inviável.

Ao dar força redobrada à campanha conduzida pela equipe econômica do governo anterior, Paulo Guedes vem obrigando o país a fazer uma reflexão incômoda, procrastinada há décadas, sobre a insustentabilidade do quadro fiscal. E é inegável que boa parte da quebra de resistência à reforma adveio da disseminação de uma compreensão mais clara do que poderá ocorrer, caso os gastos previdenciários não possam ser contidos.

A esta altura do jogo, contudo, seria um erro supor que o segredo da viabilização de uma reforma da Previdência com potência fiscal adequada seja nova escalada de atemorização do país com cenários de fiasco da reforma. De um lado, há boas razões para crer que a tática de amedrontamento já tenha passado do ponto. Que seus efeitos colaterais já a tornaram disfuncional. De outro, parece claro que o verdadeiro entrave remanescente à aprovação da reforma não será removido pela aterrorização da opinião pública com os possíveis desdobramentos da não aprovação.

Para Werneck, o “terrorismo” colocou os empresários em posição de maior cautela, e o principal problema reside na articulação ruim com o Congresso, não no convencimento da necessidade da reforma, o que já estaria praticamente resolvido. Ao apostar numa nova forma de se relacionar com o Parlamento, Bolsonaro estaria sendo ingênuo, segundo o professor:

E por que o governo não conseguiu produzir uma narrativa crível? Porque não teve como explicar como seria contornado o verdadeiro entrave à aprovação da reforma. A principal dificuldade que vem sendo enfrentada pela reforma não advém mais da falta de senso de urgência da opinião pública e do Congresso e, sim, da gritante incapacidade do governo de mobilizar o vasto apoio parlamentar de centro direita com que poderia contar.

Bolsonaro ainda não conseguiu entender que, no Brasil, presidencialismo de coalizão não é opção. E, sim, a única forma possível de governar o país. É esta falha de entendimento que tem impedido o governo de construir uma narrativa crível de aprovação da reforma da Previdência.

Não adianta tentar compensar essa deficiência com uma escalada de aterrorização da opinião pública, dos investidores e do Congresso. Quem tem de ser assombrado com o espectro de uma reforma pífia é o próprio Bolsonaro. E é melhor que seja atemorizado intramuros. Não em público.

A reforma previdenciária, em suma, é condição necessária para a retomada do crescimento, mas não suficiente. O governo tem o mapa de fundo correto, e já deve enviar a PEC tributária também, ainda que Guedes esteja certo ao se preocupar em não atrapalhar a tramitação da previdenciária, mais urgente no momento.

Mas é fundamental o presidente compreender que, sem a retomada do crescimento, será ele a ser responsabilizado pela população, não o Congresso ou qualquer outro. E é por isso que cabe a ele ser mais pragmático, agregador e realista. Há sinais de que o presidente tem se dado conta disso e ensaia mudança de postura.

A aproximação aos demais Poderes, os elogios a Dias Toffoli, a crítica aos bolsonaristas mais fanáticos das redes sociais, que fez durante a entrevista a Danilo Gentili ontem alegando serem como esquerdistas infiltrados, tudo isso sinaliza na direção correta. O clima político precisa ser desanuviado um pouco. A retomada do crescimento econômico, num país com 14 milhões de desempregados, deve ser a prioridade número um.

Rodrigo Constantino

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