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Venom (2018)
Venom (2018)| Foto:

No filme “Venom”, da Marvel, uma criatura alienígena assume o controle de seu hospedeiro, transformando-o numa pessoa diferente, mais agressiva, poderosa, indomável. Na história o monstro vem de fora, mas é boa metáfora para a besta que pode existir dentro de nós, e tomar o controle eventualmente. O parasita extraterrestre não sobrevive em qualquer corpo, porém. Ou seja: é preciso uma compatibilidade entre ambos.

A trama já foi tema de muitos livros e filmes. “O Exorcista”, clássico do terror, fala de algo parecido. Uma menina é possuída pelo demônio, transformando-se em alguém completamente diferente, medonha, terrível. Essa Outra nos assombra, pois como pode Deus permitir algo assim, uma transformação tão assustadora, que destrói a inocência da menina? A fala do Padre Merrin no livro original, em tradução livre, sugere uma explicação interessante:

No entanto, acho que o alvo do demônio não é o possuído; somos nós … os observadores … todas as pessoas nesta casa. E eu acho – eu acho que o ponto é nos desesperar, rejeitar nossa própria humanidade, Damien: nos vermos como essencialmente bestiais; como essencialmente vis e podres; sem dignidade; feios; indignos. E aí reside o cerne disso, talvez: na indignidade. Pois acho que a crença em Deus não é uma questão de razão; eu acho que é finalmente uma questão de amor; de aceitar a possibilidade de que Deus pudesse nos amar…

Vários são os temas de “O Exorcista”, como os limites da razão e da tecnologia, o poder da fé, a realidade do Mal e a glorificação da religião. O monstro que toma conta da menina está nos alertando contra os perigos do niilismo, o secularismo, o materialismo.

Acredito que há uma besta em potencial à espreita em quase todos nós. A mente humana é complexa. Dependendo do ambiente, ou da química, o cérebro pode pregar peças e nos trair. Doença da mente ou da alma, não importa: a pessoa pode ser “possuída” e se transformar em alguém totalmente diferente, monstruosa, intempestiva, irascível.

E pode confundir tudo isso com “liberdade”, gozando com a sensação de poder. Pacientes com bipolaridade em fase de mania costumam passar por isso. O filme “Touched with Fire”, com Kate Holmes, retrata muito bem essa confusão entre doença e genialidade indomável. O doente, tomado pelo Outro que o habita, jura de pé junto ser uma nova pessoa, mais inteligente, criativa, selvagem, aventureira. E acha a vida de todos os demais chata, sem graça, cinza.

Freiar esse Outro bestial e selvagem em nós é a função da civilização, e também do nosso “superego”, do observador imparcial que temos para contrapor a voz do diabinho do outro lado. Infelizmente, a cultura tem contribuído para dar rédeas soltas ao demônio, ao Outro selvagem, ao Venom em nós. Buscar equilíbrio, temperança, prudência, tudo aquilo que já foi visto como virtude no passado, parece algo fora de moda hoje.

Vivemos na era do hedonismo, do romantismo que enaltece os “sentimentos autênticos”, não importa quais ou o quão destrutivos para nós mesmos e aqueles que amamos em volta. Fazer o que der na telha, agir de forma irresponsável, seguir os “instintos selvagens” como se não houvesse amanhã: eis o mantra da modernidade. A pessoa não precisa ser bipolar para mergulhar numa mania destrutiva. Basta abandonar os freios interiores e externos, e gritar “carpe diem”, como os jovens alienados da “Sociedade dos Poetas Mortos”, confundindo libertinagem com liberdade.

Em “Venom”, o hospedeiro consegue chegar a um acordo com o parasita, com o Outro monstruoso que está dentro dele. Um equilíbrio interessante. Mas na vida real é bem mais complexo controlar a besta quando ela assume o controle. Muito mais comum é o “hospedeiro” encontrar justificativas para seus atos inconsequentes e destrutivos. Quase todo esquerdista, por exemplo, vira um relativista moral, ataca a meritocracia, as virtudes individuais. Por que será?

Ora, justamente porque dessa forma alivia sua culpa. Se ninguém é melhor do que ninguém, então posso ser uma porcaria de pessoa que está tudo bem. Se toda verdade tem dois lados, então eu nunca posso estar errado, e faço o que faço porque o outro faz o que faz. O esquerdismo é uma grande desculpa para perdedores, para fracos, para quem cedeu aos vícios e abandonou as virtudes. O sujeito deixa o Venom tomar conta de si, e depois repete que ninguém realmente presta, e que ele é apenas uma vítima, sem qualquer responsabilidade por seus atos. O vilão vira o herói.

Quem quer virar besta selvagem, ou então não consegue impedi-la de assumir o controle do seu eu, acaba pregando o esquerdismo como uma justificativa para seu comportamento decadente, irracional e destrutivo. Não é por acaso que o psiquiatra Lyle Rossiter, em A mente esquerdista, conclui que o esquerdismo é mesmo uma doença mental.

E eu acrescento: os doentes mentais também escolhem o esquerdismo como válvula de escape para seu comportamento condenável. É mais fácil do que procurar tratamento e criar amarras, como fez Ulisses contra o canto das sereias, para não cair em tentação e se livrar do Mal. Amém!

Rodrigo Constantino

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