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Ricos poupam e os pobres gastam?
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Por Gabriel Wilhelms, publicado pelo Instituto Liberal

Em recente entrevista à Folha de S. Paulo, o ministro da Economia Paulo Guedes polemizou com a seguinte declaração: “Um menino, desde cedo, sabe que ele é um ser de responsabilidade quando tem de poupar. Os ricos capitalizam seus recursos. Os pobres consomem tudo”. A declaração do ministro gerou diversas reações da esquerda arguindo que o ministro não teria conhecimento da situação da maioria dos brasileiros e que estes estariam impossibilitados de poupar.

Para ilustrar o argumento a esquerda costuma desenhar um cenário temerário, como um pai de família que ganha um salário mínimo, precisa sustentar a família com quatro filhos e ainda pagar o aluguel. É evidente que cenários como este, e até piores, existem. É evidente que de fato há quem viva no Brasil em tal estado de miserabilidade que falta dinheiro para o mais básico e poupar é de fato impossível. O que não é verdade é que essa seja a situação de todos e que poupar seja um luxo para poucos.

Creio que a parca educação financeira do povo brasileiro se deve muito mais a fatores culturais do que à renda. É comum ver por aí afirmações de que o ato de poupar e investir só é possível para cidadãos de renda elevada. Dias atrás, por exemplo, me deparei com a afirmação de que investir só seria possível para aqueles que ganham ao menos 10 salários mínimos. Quem pensa assim na certa deve consumir filé mignon como café da manhã ou talvez ser algum procurador insatisfeito com sua “esmola” de R$24 mil.

Mesmo entre os que poupam, para parte considerável impera a falta de conhecimento financeiro que faz com que muitos confiem todas as suas economias às modestas cadernetas de poupança. Demais ativos financeiros, especialmente os negociados em bolsa, a exemplo das ações, ainda são vistos com forte desconfiança e como produtos “para ricos”, a despeito do fato de que são muito mais acessíveis do que muitos produtos de renda fixa.

Segundo dados do Banco Mundial, apenas 14,5% dos brasileiros guardaram dinheiro em 2017, considerando a população acima de 15 anos. A média mundial foi de 26,7% para o mesmo período. Ainda, de acordo com a pesquisa Raio X do investidor brasileiro, realizada anualmente pela ANBIMA (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capital), 8% das pessoas aplicaram em algum tipo de produto financeiro no ano em 2018, sendo que para 88% destes a aplicação escolhida foi a poupança. Em segundo lugar vem a previdência privada, com aderência de 6%. As ações aparecem em último, com apenas 2% de aderência. Neste ano, a Bolsa de Valores bateu a marca de 1 milhão de pessoas físicas, o que, apesar de significar um crescimento, representa menos de 0,5% da população brasileira. Apenas para que se tenha uma ideia, o percentual de investidores em renda variável é de mais da metade da população nos EUA, enquanto na Europa e na Ásia fica entre 20% e 30%.

Há quem diga que tal quadro se desenha tão somente por “falta de dinheiro”, mas não creio que esse seja o caso. Na referida pesquisa da ANBIMA, 24% dos pesquisados afirmaram ter conseguido “investir” no período, porém, como vimos, apenas 8% investiram em produtos financeiros. Do restante, 11% declararam investimentos em bens duráveis (como carros) e imóveis, 4% em empreendimentos próprios e 1% em estudo, próprio ou dos filhos. Muitos brasileiros encaram a compra do carro como um investimento, mas salvo situações específicas, onde o carro é usado para fins de trabalho e geração de renda, isso é raramente o caso. Penso que o brasileiro tem um baixo nível de poupança por sua predileção pelo consumo imediato, bem como pela lembrança ainda vívida da hiperinflação, algo que provavelmente precisará de mais algumas décadas para ser mitigado.

Há quem veja na fala do ministro, comparando ricos com pobres, um ato de insensibilidade, afinal, é evidente que os ricos podem poupar mais. O problema dessa retórica, comumente aceita pela esquerda, é que ela só enxerga o “produto acabado”, como se todos os ricos fossem ricos por herança e como se a mobilidade social dos mais pobres dependesse somente de incrementos na renda. Perdulários serão perdulários, ganhando 2 ou 20 mil. Não quero dizer com isso que os pobres só são pobres porque são perdulários. Também é evidente que quem nasce em uma família rica terá vantagem relativa em relação aos que não nascem. ´

O ponto não é esse; o ponto é que a superação da pobreza não é possível sem geração de riqueza e geração de riqueza depende de poupança. Aqui alguém pode arguir que depende de investimento, mas isso é um raciocínio circular, uma vez que sem poupança prévia não há investimento. Mesmo que uma empresa tome mão de empréstimos ou financiamentos, é preciso que haja a poupança de terceiros para que isso ocorra. Um banco, por exemplo, só é capaz de emprestar dinheiro porque há quem confie a guarda de seu dinheiro a ele. Do mesmo modo, uma empresa que decida abrir capital visando a financiar uma expansão – que gerará empregos, trará novos produtos e/ou serviços para o mercado e pagará mais impostos – só conseguirá ser bem-sucedida na empreitada se investidores, pessoas físicas ou não, confiarem em que o investimento do dinheiro poupado trará retorno para seus bolsos.

A fala do ministro, ao diferenciar o comportamento do poupador e o do perdulário, ilustra isso. Aliás, aquele que nasce rico, mas adota o último comportamento, sendo incapaz de administrar o que ganhou de “mão beijada”, pode acabar tão ou mais pobre do que o nascido pobre. Buscar a independência financeira, evitando depender das amarras burocráticas do estado, em especial no que tange à solvência na velhice, é um dos ideais mais liberais possíveis.

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