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O Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu em fevereiro que o processo de relicitação do aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP), deverá ser concluído até o próximo dia 2 de junho. Até agora, entretanto, não há edital publicado e tampouco uma data marcada para o leilão na Bolsa de Valores de São Paulo (B3), o que deixa dúvidas se o governo federal conseguirá cumprir o prazo para sanar o imbróglio que se arrasta há quase cinco anos.
Um dos obstáculos é a inexistência de estudo feito por uma auditoria externa para calcular a indenização devida à concessionária Aeroportos Brasil - Viracopos (ABV), que alega que o governo não cumpriu cláusulas previstas no contrato e que afetaram o equilíbrio financeiro da concessão. Segundo relatório administrativo da empresa, referente a 2023, a ABV teria direito a um ressarcimento de cerca de R$ 4 bilhões — o relatório do ano passado ainda não foi divulgado.
No documento, a concessionária formada pela UTC, Triunfo e Egis elenca três itens não atendidos que resultam no valor pedido. O primeiro é uma área que a empresa não recebeu e que inviabilizou projetos para construir hotel, centro de convenções e prédios comerciais, que aumentariam a receita.
Outro ponto são as tarifas operacionais, que teriam ficado abaixo dos valores projetados no leilão em 2012. Por fim, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) teria adicionado uma contribuição mensal não prevista calculada sobre a receita de tarifas de embarque, pouso e permanência e dos preços unificados e de permanência, domésticas e internacionais, e de armazenagem e capatazia.
O valor de indenização pleiteado pela ABV é diferente do apresentado pela Anac ao TCU em 2022, de R$ 2,5 bilhões, que seria o suficiente para compensar os investimentos no aeroporto que não foram amortizados. A definição sobre o valor da indenização é fator obrigatório para a realização do leilão.
A principal obra prevista para o aeroporto de Viracopos é a construção de uma nova pista de pouso e decolagem.
No acórdão 431/2025 do TCU, de 26 de fevereiro, o tribunal deu à Anac 15 dias para apresentar o estudo da auditoria externa ou uma justificativa para ainda não tê-lo feito. O prazo passou sem que a agência entregasse o estudo.
Em nota enviada à Gazeta do Povo, a Anac informou que “segue normalmente com o processo de contratação da empresa de auditoria externa” e que “está confiante de que atenderá os prazos da relicitação do Aeroporto de Viracopos, em atendimento à decisão do TCU”.
O Ministério de Portos e Aeroportos (MPor) afirmou, também em nota, que acompanha de perto as discussões sobre a relicitação e lamentou que "não tenha sido possível alcançar um consenso" no TCU. Além disso, comunicou que "o prazo de 2 de junho para a conclusão do processo de licitação é considerado desafiador, mas esforços conjuntos estão sendo realizados pela Anac e por este Ministério para que a meta seja cumprida dentro do prazo estabelecido."
A ABV também foi procurada pela reportagem, mas não respondeu sobre os questionamentos enviados — o espaço segue aberto para manifestação da empresa.
Processo de relicitação do aeroporto de Viracopos se arrasta desde 2020
A decisão do TCU de seguir com a relicitação do aeroporto de Viracopos é um dos capítulos finais de um problema que se arrasta desde março de 2020, quando a concessionária entregou ao governo federal um pedido de devolução amigável do ativo. O movimento aconteceu como parte do plano de recuperação judicial da ABV, que somava, à época, dívidas de aproximadamente R$ 2,88 bilhões.
O processo de relicitação foi oficializado em 17 de julho de 2020 e tinha um prazo de quatro anos para ser finalizado. Em 2023, a concessionária mudou seu posicionamento e informou que pretendia seguir com o aeroporto, iniciando uma tentativa de repactuação com o governo federal na Secretaria de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos (SecexConsenso) do TCU — do lado do governo participaram Anac, Ministério dos Portos e Aeroportos (MPor) e Secretaria do Programa de Parceria de Investimentos (PPI) da Casa Civil da Presidência da República.
Essa tentativa fracassou, exatamente pela divergência entre os valores de indenização apresentados pela ABV e Anac. Com isso, o TCU retomou em outubro do ano passado o processo de relicitação iniciado em 2020 e fixou a data de 2 de junho de 2025 como limite para finalizar a questão.
O ministro do TCU, Bruno Dantas, que foi o relator do caso, lamentou em sua decisão a falta de consenso entre as partes. “A melhor solução, a que seria mais aderente ao interesse público e — insisto — aos particulares, seria o êxito no consensualismo que se adotou aqui, nesta Corte de Contas”.
Após isso, ele reiterou a importância do cumprimento da data determinada. “Esse prazo é fatal”, afirmou, apontando que a consequência seria a caducidade da concessão, como consta na Lei 13.448/2017, que trata da prorrogação e relicitação de contratos de parceria.
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Relicitação prevê investimentos de R$ 4,9 bilhões
O estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental mais recente para a nova licitação do aeroporto de Viracopos é de novembro do ano passado — e deve passar por uma nova atualização até a publicação do edital, mas o mercado não espera mudanças significativas.
Pelo documento, o vencedor do leilão deverá pagar uma outorga mínima de R$ 2,9 bilhões e outorgas variáveis que chegam a R$ 8,9 bilhões até o fim do contrato de 30 anos de concessão. Nesse período deverão ser investidos cerca de R$ 4,9 bilhões.
A principal obra prevista é a construção de uma nova pista de pouso e decolagem com 2,7 mil metros de comprimento, aumentando a capacidade de 40 para 78 movimentos por hora. Essa obra está indicada para ocorrer na primeira fase da nova concessão, até 2032, que também prevê a ampliação do pátio e de posições de estacionamento de aeronaves.
Nas fases seguintes, o foco principal está na ampliação do terminal de passageiros, que terá a capacidade aumentada de 16,1 milhões para 28,7 milhões de embarques e desembarques por ano. O pátio também ganhará novas posições de estacionamento, chegando a uma capacidade de atender 92 aeronaves em operação comercial, excetuando carga.
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