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“Recomendo às pessoas a provocarem seus médicos para que peçam o exame. E que procurem seus direitos caso o tratamento gratuito lhes seja negado. A informação pode ser a diferença entre a vida e a morte.” Carlos Alberto Pessoa, advogado que foi diagnosticado com hepatite C | Marcelo Andrade/ Gazeta do Povo
“Recomendo às pessoas a provocarem seus médicos para que peçam o exame. E que procurem seus direitos caso o tratamento gratuito lhes seja negado. A informação pode ser a diferença entre a vida e a morte.” Carlos Alberto Pessoa, advogado que foi diagnosticado com hepatite C| Foto: Marcelo Andrade/ Gazeta do Povo

Tratamento

Pacientes buscam apoio da Justiça para obter remédios caros

Uma propaganda no rádio fez grande diferença na vida do advogado Carlos Alberto Pessoa, de 31 anos. Aos 25, recém-formado, ele resolveu fazer o teste para hepatite C após ouvir um informe. Ao receber o resultado positivo, descobriu que tinha fibrose hepática de nível 2 (a classificação é de 1 a 4, sendo esta última a mais grave) e que precisava tomar o remédio, uma injeção de interferon por semana, ao custo de R$ 1,8 mil e uma caixa de comprimidos que durava 11 dias, ao preço de R$ 400 cada. Seriam seis meses de tratamento, ao custo de R$ 90 mil.

Como não tinha condições financeiras para tanto e o tratamento lhe foi negado pelo Estado, o advogado exigiu seus direitos via Judiciário e ganhou. Com isso, passou a ser indicado pelo médico a outros pacientes que enfrentavam a mesma dificuldade. Entrou com 60 mandados de segurança nos últimos seis anos e ganhou todos.

Fique alerta

Tire dúvidas sobre a hepatite C:

Como se contrai o vírus?

Contato com sangue contaminado em seringas, objetos cortantes, cachimbos, alicates e espátulas de unha, instrumentos utilizados nas tatuagens e para colocação de piercings, além de transfusões de sangue e hemodiálise que não seguem protocolos de segurança. Em até 7% dos casos, o contágio pode se dar por meio de relações sexuais inseguras e também durante o parto, de mãe para filho, além da amamentação.

Quais os estágios da doença?

A doença em sua fase aguda é extremamente rara, com sintomas como febre, dores de cabeça, náuseas e pele amarelada. Em sua forma crônica, esses sintomas podem demorar até 30 anos para se manifestar, quando o quadro pode evoluir para uma cirrose e câncer de fígado.

Qual o tratamento?

O tratamento é feito com remédios para zerar a carga viral no organismo. Se não houver evolução para uma cirrose, a chance de cura varia de 50% a 80%.

Duas novas opções de tratamento

A partir deste ano, duas novas drogas estarão à disposição no SUS para reforçar o tratamento de quem tem hepatite C. Os antivirais boceprevir e telaprevir foram aprovados em 2011 e permitem uma chance de cura de até 80%, principalmente se o diagnóstico é feito precocemente.

Atualmente, o tratamento consiste em uma injeção de interferon e comprimidos de ribaverina. Eles não deixarão de ser usados, mas agora serão ministrados em conjunto com o boceprevir ou o telepravir, numa espécie de coquetel. Para os próximos 3 a 5 anos é esperada ainda uma nova leva de medicamentos, que permitirão terapias sem o uso do interferon, que gera efeitos colaterais severos, como anemia, dor de cabeça, perda de cabelo e vômito.

Hoje, até 40% dos pacientes em estágio mais avançado não podem ser medicados porque não suportam os efeitos, como a funcionária pública aposentada Zeni Ferreira Castilho, 64 anos, de Curitiba, que contraiu o vírus após uma transfusão de sangue feita em 1981. Ela tentou duas vezes iniciar o tratamento, mas o médico acabou desistindo ao vê-la sofrer. Ao se mudar para os EUA, ele indicou outro profissional para tratá-la e o proibiu de fazer nova tentativa.

Por ter problemas cardíacos, Zeni também não é candidata ao transplante de fígado. Ela espera que um novo medicamento que dispense o interferon seja aprovado, e hoje, conta com a Internet e o Facebook para se informar sobre as pesquisas e colher depoimentos de quem tem o mesmo problema. Também faz exames de sangue, ecografias e ultrasonografias regularmente para monitorar o comportamento do vírus. "Eu me cuido e ele fica lá, quietinho", brinca.

O desconhecimento e o preconceito são hoje os grandes responsáveis pela disseminação de uma doença que atinge mais de 3 milhões de brasileiros e já mata mais do que a aids: a hepatite C, considerada uma pandemia e descrita pela Organização Mundial da Saúde como "o mal silencioso". No mundo, são 150 milhões de infectados e, no total, 350 mil morrem de complicações da doença – principalmente cirrose e câncer hepático – todos os anos. No Brasil, entre 2000 e 2010, ocorreram 14,9 mil mortes.

Como é uma doença que demora até 30 anos, em média, para manifestar seus primeiros sintomas – daí o termo silencioso –, ela se desenvolve e ataca o organismo sem que se tome conhecimento de sua presença. Com isso, a pessoa contaminada passa o vírus adiante, ajudando a engrossar as estatísticas. Para piorar o cenário, poucas pessoas conhecem sua forma de contágio e complicações, e associam-na, erroneamente, a grupos de risco.

O diagnóstico começa por fazer um exame de sangue para detectar anticorpos produzidos contra o vírus, mas a prática ainda não é disseminada no Brasil. "Às vezes, o paciente faz check-up anual e o médico pede uma série de exames, mas não o de hepatite C. E ele precisa ser feito independentemente de sintomas e sempre que a pessoa houver tido um comportamento de risco", explica a gastroenterologista Cláudia Ivantes, do Hospital Nossa Senhora das Graças e da Secretaria de Saúde de Curitiba.

A questão é que muitos não sabem quais são os comportamentos que aumentam a chance de contágio e ainda há um estigma em torno da doença, como explica o infectologista Jaime Rocha, do Laboratório Frischmann Aisengart. "Há muito preconceito, há quem ache que isso é exclusivo de pessoas viciadas. Assim, a pessoa só descobre quando já perdeu a chance de tratar, quando está com uma cirrose ou câncer hepático", diz.

Outra desinformação é a respeito da prevenção: hoje, não há vacina para a hepatite C, apenas para as do tipo A e B, e muitos pensam que, ao se imunizarem contra as últimas, estarão se protegendo da primeira. Por isso, médicos insistem na realização do teste, que é gratuito. Se a hepatite C é detectada precocemente, as chances de cura vão de 50% a 80%. E a boa notícia é que os índices podem melhorar com a oferta de medicamentos mais eficazes pelos SUS a partir deste mês.

Desinformação é a maior inimiga

O fato de o vírus da hepatite C ter sido descoberto apenas em 1989 – um tempo relativamente curto para a medicina – contribui para o pouco conhecimento sobre a doença. Exames para detectar o vírus foram disponibilizados nos países ricos a partir de 1991, e no Brasil, em 1993. De acordo com a OMS, ainda falta muito para que os médicos, principalmente os que têm mais de 20 anos, se familiarizem com a doença, e para que o público conheça seus riscos.

De acordo com a gastroenterologista Cláudia Ivantes, ainda há médicos que, ao receber a confirmação do exame, têm dificuldades em fazer o encaminhamento para um especialista, e o próprio paciente, pelo desconhecimento das dinâmicas da doença, subestima o tratamento. De fato, uma pesquisa realizada na Austrália em 2011 mostrou que apenas 20% das pessoas sabiam, por exemplo, que o vírus pode causar câncer, chamado de hepatocarcinoma.

"O hepatocarcinoma responde pela minoria dos casos de câncer de fígado, pois de 170 casos anuais, em média, que tratamos, apenas oito são deste tipo. Porém, este é um tumor de diagnóstico e tratamento extremamente complexos. A massa tumoral duplica em poucos meses e diminui as chances de cirurgia, que é a melhor alternativa na maioria dos casos", explica o oncologista do Serviço de Cirurgia Abdominal do Hospital Erasto Gaertner (HEG) Flávio Saavedra Tomasich.

Mesmo em casos de cirrose, um estágio anterior ao câncer, o risco é grande, pois na maioria das vezes é preciso fazer um transplante. Dependendo da idade e se o paciente tem complicações de saúde, ele se torna inviável.

Serviço

Faça o teste rápido (pronto em 1 hora) e gratuito para hepatite C no Centro de Orientação e Aconselhamento de Curitiba, na Rua do Rosário, 144, São Francisco, no 6.º andar. Assista a uma palestra sobre a doença no dia 22/03, às 8h30, no auditório do Mercado de Orgânicos, na Avenida Sete de Setembro, 1.865, Centro. Mais informações no site da Associação Brasileira de Portadores de Hepatite: www.hepatite.org.br.

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