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Estudos foram publicados recentemente, por meio de resultados obtidos em laboratório. | Rovena Rosa/Agência Brasil
Estudos foram publicados recentemente, por meio de resultados obtidos em laboratório.| Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Dois estudos publicados recentemente indicam que anticorpos contra a dengue podem reagir de forma cruzada com o vírus zika, podendo tanto neutralizar quanto potencializar a doença. Os resultados obtidos em laboratório levantam questionamentos sobre a vacina contra a dengue e a possibilidade de a imunização agravar os quadros de infecção.

O primeiro trabalho, conduzido pelo centro de vacinas da Emory University (EUA) em colaboração com pesquisadores da Tailândia, mostra que há quatro estirpes do vírus da dengue e que a infecção por uma cepa não garante imunidade contra as outras três, pelo contrário: uma segunda infecção por uma cepa diferente pode aumentar o risco de evolução para um quadro de dengue hemorrágica.

É como se os anticorpos pré-existentes para a primeira estirpe fossem incapazes de proteger as células e contribuíssem para o ataque ao organismo. Esse processo é conhecido como antibody-dependent enhancement (ADE).

A suspeita é de que o mesmo processo ocorra a partir do “encontro” dos anticorpos da dengue e do zika vírus – em outras palavras, de que uma pessoa que já possuí anticorpos para dengue, se infectada pelo zika, desenvolva um quadro mais grave da doença. “É importante saber se anticorpos anti-dengue facilitam a penetração da barreira placentária pelo zika vírus, permitindo o acesso ao feto em desenvolvimento”, explica o médico Mehul Suthar, co-autor do estudo.

A descoberta dos pesquisadores do Emory Vaccine Center dialoga com um estudo conduzido pelo Imperial College London e publicado recentemente na revista científica Nature Immunology. O texto apresenta resultados que mostram uma interação complexa entre os vírus da dengue e do zika e destaca a possibilidade de que a pré-existência de imunidade contra a dengue seja uma das razões para a explosão de casos de zika e suas complicações no Brasil.

O desafio da vacina

A ocorrência de ADE foi identificada pela primeira vez há quase 50 anos na infecção pelo vírus da dengue e acredita-se ser esse um dos fatores que explicam a gravidade dos casos de segunda infecção por dengue. “O risco de ADE fez com que o desenvolvimento de vacinas contra a dengue fosse particularmente difícil.”

Paraná terá 500 mil doses de vacina

O Paraná deve ser o primeiro estado a disponibilizar a vacina contra a dengue produzida pela Sanofi Pasteur. De acordo com a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), o governo deve adquirir, inicialmente, 500 mil doses e a expectativa é começar a vacinação já no segundo semestre deste ano para chegar ao verão de 2017 com a população mais suscetível imunizada. O valor a ser investido na aquisição do medicamento ainda não foi definido, pois o Ministério da Saúde ainda não finalizou a precificação da vacina.

Os pesquisadores mencionam a vacina contra a dengue produzida pela Sanofi Pasteur, que acaba de ser licenciada em vários países, inclusive no Brasil. Segundo o texto, a estimativa é de que o medicamento reduza a incidência da doença em 10-30% em um período de 30 anos.

Entretanto, uma análise dos testes da vacina, apontam os cientistas do Imperial College, levanta algumas preocupações. Em grupos de pacientes com menos de 9 anos de idade, a hospitalização por dengue foi maior entre as crianças vacinadas do que no grupo não vacinado. Isso, diz o estudo, pode indicar a ocorrência de ADE, o que significa que, embora imunizadas, as crianças não estão protegidas pela vacina. Por essa razão, o medicamento não está licenciado para uso em crianças menores de 9 anos.

Agora, esses dois estudos indicam que a imunização contra a dengue pode gerar um agravamento dos surtos de zika e que talvez seja necessário pensar em uma resposta à combinação dos dois vírus. “Nossos dados indicam que a imunidade à dengue tem implicações claras para a patogênese (a forma como agentes agridem nosso organismo e como as defesas naturais reagem) do zika vírus e para programas de vacinação futuros para zika e dengue”, diz o artigo da Nature Immunology.

De acordo com Jens Wrammert, do Emory Vaccine Center, a criação de vacinas ou terapias baseadas em anticorpos ainda deve levar em consideração que a gravidade da infecção pelo zika pode ser diferente em áreas de dengue endêmica ou entre pessoas que já contraíram dengue e aqueles que nunca tiveram a doença.

Colaborou: Caroline Olinda

Outro lado

Único laboratório a ter liberada uma vacina contra a dengue no mundo, a Sanofi Pasteur garante a segurança do imunizante. De acordo com a diretora médica da empresa no Brasil, Sheila Honsani, estudos in-vitro, como no caso dos citados na reportagem, não necessariamente se refletem na realidade.

De acordo com ela, durante a pesquisa da vacina da dengue, nos testes in vitro, se observou que uma infecção prévia poderia agravar outra. Porém, nos testes clínicos, essas implicações não foram verificadas. “Tivemos mais de 40 mil indivíduos testados e em nenhum caso se observou uma segunda infecção mais grave”, afirma.

A assessoria do laboratório também destaca que estudos recentes realizados na Polinésia Francesa não detectaram um agravamento dos quadros Guillain-Barré associados à zika devido a imunização prévia contra a dengue. Esse seria mais uma indicativo de que a vacina não agravaria quadros de zika.

A vacina da Sanofi foi liberada no Brasil em dezembro do ano passado e deve começar a ser comercializada ainda no início deste segundo semestre no país.

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