
Depois de mais de duas décadas de grandes expectativas, o campo da terapia gênica está próximo de realizar um fato histórico: a aprovação de uma droga desenvolvida pela área. A Agência de Medicamentos Europeia recomendou a aprovação da terapia gênica para tratar uma doença genética rara. A terapia gênica dá ao corpo os genes de que ele precisa, como cópias corretas de genes defeituosos que causam desordens genéticas.
Se a Comissão Europeia seguir o conselho, como normalmente acontece, esta será a primeira aprovação de uma droga baseada em terapia gênica no Ocidente. Isso poderia dar um impulso para a área, que há tempos vem lutando por credibilidade e financiamento.
"Uma aprovação vai potencialmente mudar o modo como esse campo é visto hoje", disse o chefe executivo da Ceregene, companhia de terapia gênica em San Diego, na Califórnia, Jeffrey Ostrove. Segundo ele, algumas indústrias farmacêuticas têm sido relutantes em investir na área, porque "não existem produtos aprovados na maioria dos mercados onde elas atuam".
O medicamento recomendado para aprovação na Europa o Glybera foi desenvolvido pela UniQure, uma companhia alemã. Ele trata a deficiência da lipoproteína lipase, doença que afeta centenas de pessoas na União Europeia e quantidade semelhante na América do Norte.
Mutação genética
As pessoas com essa doença têm uma mutação genética que as impede de produzir a enzima necessária para quebrar as partículas que carregam gorduras na corrente sanguínea. Sem a enzima, acumula-se tanta gordura que o sangue fica com aparência esbranquiçada.
"É o equivalente a ter 10% de chantilly na sua corrente sanguínea", disse o doutor Daniel Gaudet, professor de Medicina na Universidade de Montreal, que lidera os testes clínicos da droga. Pessoas com essa doença são propensas a ter ataques severos de inflamação do pâncreas, e não existe tratamento para o problema, exceto uma dieta extremamente pobre em gordura.
Mas o Glybera fornece cópias corretas do gene da lipoproteína lipase, que permite que os pacientes produzam um pouco da enzima necessária. Com ele, a expectativa é a de que um único tratamento, que consiste em injeções nos músculos da perna, dure por muitos anos, se não mais, segundo Joern Aldag, chefe executivo da UniQure.
A terapia gênica tem sido vista como um modo promissor de tratar inúmeras doenças, mas até agora não obteve muito sucesso. Centenas de testes clínicos foram conduzidos desde 1990, e a maioria deles falhou, em parte porque tem sido difícil fazer com que os genes trabalhem por um longo período. O campo também tem sido freado por algumas questões de segurança, particularmente a morte de um adolescente em 1999 em um teste clínico na Universidade da Pensilvânia.
Contudo pesquisadores têm superado os obstáculos de forma lenta, e, nos últimos anos, tem havido relatos de sucesso nas tentativas de tratar câncer e hemofilia B, assim como doenças imunes e um problema que causa cegueira.
"Não aconteceu tão rapidamente como as pessoas sugeriam ou prometiam 15 ou 20 anos atrás, mas nós estamos começando a ver sucesso", disse o doutor Mark A. Kay, professor de pediatria e genética de Stanford.
Tradução: Kamila Mendes Martins



