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Escombros do Edifício Atlântico, em Guaratuba, em janeiro de 1995: seis andares do prédio recém-construído vieram abaixo, causando um dos maiores desastres já registrados na história do Paraná | Edson Silva/Arquivo/Gazeta do Povo
Escombros do Edifício Atlântico, em Guaratuba, em janeiro de 1995: seis andares do prédio recém-construído vieram abaixo, causando um dos maiores desastres já registrados na história do Paraná| Foto: Edson Silva/Arquivo/Gazeta do Povo

Terreno vira incômodo para os vizinhos

Onde ficava o Edifício Atlântico resta apenas mato. Os vizinhos se revezam na limpeza do local para a própria segurança e não negam que para eles o local é um incômodo. Para os proprietários dos apartamentos destruídos, também. O terreno, estigmatizado pelas 29 mortes, desvalorizou.

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Ouvir gritos era torturante

Trabalhei alguns anos com ronda policial, cobrindo assassinatos e acidentes variados, mas confesso que nenhum destes casos me deixava abalada emocionalmente. Eram os resgates – e quando as vítimas estavam vivas e sofrendo – que me deixavam tocada. Neste cenário nenhuma outra cobertura me abalou tanto quanto a queda do Edifício Atlântico.

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Guaratuba - Quinze anos depois, famílias de vítimas da queda do Edifício Atlântico, uma das maiores tragédias da história do Paraná, continuam sem receber indenização pela perda de seus parentes. No desabamento do prédio, ocorrido em 28 de janeiro de 1995, morreram 29 pessoas. O laudo do Instituto de Criminalística do Paraná apontou erros na construção do imóvel, que havia sido concluído cerca de um ano antes de desabar. O prédio veio abaixo perto das 10 horas da manhã de um sábado. Seis andares desabaram.

A dona de casa Iraídes Cândido Trauczynski, 78 anos, é uma das que ainda esperam para ser indenizadas. Tem a receber R$ 586 mil pelos danos morais e materiais. Na tragédia, ela perdeu o filho César Trauczynski Júnior, 42 anos, dois netos – Rafaella, 15 anos, e Igor, 8 anos – e a nora, Maria Aparecida Odppis Trauczynski, 27 anos.

A família tinha alugado um dos 16 apartamentos do edifício para passar alguns dias na praia. Há 10 anos, a 19.ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná deu ganho de causa a Iraídes e ao marido, César Trauczynski, que morreu três anos após a tragédia em Guaratuba.

O casal moveu a ação em 1998 contra os dois engenheiros responsáveis pela construção do prédio – o engenheiro civil Ney Baptista Torres e seu filho, Luiz César de Mello Torres – e o mestre de obras Cézar Luiz da Silva. Na esfera criminal, os responsáveis pela obra foram processados por homicídio culposo, mas a ação movida pelo Ministério Público foi suspensa em 1996. Beneficiados pela condição de serem primários, os réus conseguiram um acordo e, dois anos depois, por terem cumprido as determinações da Justiça, houve a extinção da punição.

Ney Baptista Torres teve o registro no Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Paraná (Crea-PR) cancelado em março de 1998. Ele perdeu uma nora e dois netos na tragédia.

"Temos tentado tudo para que eles paguem o valor estipulado. Mas o (Ney) Torres tem usado todos os artifícios para protelar o pagamento", diz o advogado da família Trauczynski, Osmar Barreto Filho. Ele afirma que o engenheiro civil estaria vendendo seus bens indevidamente. "Ele usa ‘laranjas’ para vender propriedades e tirá-las do seu nome. Mas continuam sendo suas", diz. Torres não foi localiza­do pe­la reportagem da Gazeta do Po­­vo para comentar as declarações.

A espera de Iraídes já é de dez anos. "A perda do Cesinha, dos meus netos e da Maria Aparecida deixou tudo muito triste. Meu marido morreu de problemas de saúde por causa do desmoronamento. Passei anos sem querer fazer festa de Natal". Ela tem esperanças de receber o dinheiro para cumprir a vontade do marido. "Na época da queda, recebemos proposta de acordos. Ele não aceitou. Dizia que queria ver a justiça feita", conta.

Acordo

O síndico do Edifício Atlântico, Alcyon Pires Gomes Júnior, 66 anos, estava no prédio na manhã do desabamento com a família. "Felizmente não perdi ninguém", diz. É um dos 12 proprietários que aceitou, em 1998, o que ele chama de "mau acordo" com o engenheiro civil. "Queria esquecer aquilo tudo e evitar o desgaste de uma demanda judicial", diz. Os proprietários receberam R$ 306 mil em imóveis, que ratearam.

"Só deu dor de cabeça. Fiquei com duas salas comerciais que valiam uns R$ 15 mil cada e com altas dívidas em impostos", conta o prefeito de Tomazina (Norte Pioneiro), Guilherme Cury Saliba Costa. Ele foi o único sobrevivente das oito pessoas de sua família. Perdeu os pais, dois irmãos, a avó materna, uma tia e um primo. Na época, tinha 15 anos.

Lembranças

Mesmo passados 15 anos da queda do Edifício Atlântico, mínimos detalhes permanecem na cabeça dos envolvidos naquele 28 de janeiro. Iraídes lembra que poderia ter sido a 30.ª vítima. "Não quis descer a serra porque o Cesinha só ia buscar a família. Quando soube do desmoronamento, meu mundo caiu junto", conta.

O jovem Saliba ficou preso entre os destroços e ficou com a medula comprimida. "Fiquei com uma coluna de concreto sobre meu corpo", conta.

Gomes Júnior destaca a agilidade da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros nos resgates. "Os vizinhos abriram suas casas para os familiares, levaram comida, ajudaram a retirar os entulhos", fala. Ontem, reencontrou um deles. "Fizemos o que tinha de ser feito. Quando recebi a notícia de que seis andares tinham ido ao chão, já esperava uma situação com muitas vítimas", conta o capitão do Corpo de Bombeiros Adriano Marcelo Novochadlo.

No dia do desastre, era um tenente de 25 anos. Ele destaca que a concentração da equipe e a solidariedade dos vizinhos foram fundamentais. "Trabalhamos sem parar, sob um calor forte e muita chuva à tarde. Até as 23 horas, a retirada de escombros era toda braçal", conta.

Novochadlo diz sempre lembrar do casal com dois filhos encontrados mortos onde seria a escadaria do Atlântico. "O pai estava abraçado sobre a mulher e os filhos, tentando protegê-los. Só com cabeça fria para ver isso e continuar as buscas."

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