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Cenas da chacina de Guaíra, no Oeste do Paraná: 15 mortos e mobilização da opinião pública | Rodolfo Bührer/Gazeta do Povo
Cenas da chacina de Guaíra, no Oeste do Paraná: 15 mortos e mobilização da opinião pública| Foto: Rodolfo Bührer/Gazeta do Povo

Cinqüenta e seis pessoas, das quais seis crianças e 11 adolescentes, foram mortas em dez chacinas nos últimos cinco anos no Paraná, a maioria relacionada com o narcotráfico. Metade foi esclarecida, mas ninguém condenado. Esse é o quadro dos assassinatos em massa (com mais de três vítimas) registrados desde 2003 em Curitiba, Colombo, Pinhais, Rio Branco do Sul, São José dos Pinhais e Guaíra. São José dos Pinhais registrou três chacinas este ano, com 11 vítimas, mas a maior ocorreu há um mês em Guaíra, com 15 mortos.

Autoridades de segurança pública alegam se tratar de fatos isolados, acerto de contas do tráfico de drogas. Mas a repetição do crime mostra que a impunidade seria um estímulo aos matadores. A Polícia Civil prendeu há poucos dias o suposto mandante e um dos autores da ação em Guaíra. O pescador Jair Correia, 52 anos, foi mostrado à população como um troféu. Mas os crimes de São José dos Pinhais continuam sem resposta: a polícia não esclareceu as duas últimas execuções sumárias, nem conseguiu prender os suspeitos pela morte de três irmãos no Jardim Trevisan, no início do ano.

Em Curitiba, a maior chacina ocorreu no Uberaba, com uma mulher e quatro homens executados em fevereiro de 2003, na invasão Ilha do Mel, no bolsão Audi-União, devido ao tráfico de drogas, briga de gangues e homicídios ocorridos no bairro Uberaba e na Vila Torres. Um dos assassinos está preso, à espera de julgamento na 2ª Vara do Tribunal do Júri. Nem assim os vizinhos arriscam comentar a história, muito menos se identificar. "A casa não existe mais, nem a rua onde aconteceu o crime. A prefeitura retirou as famílias que estavam na beira de uma cava", diz uma vizinha. Ela não ouviu nada. "Só vi os corpos sendo levados para o carro do IML."

Já a chacina de Colombo, a maior da região metropolitana de Curitiba, acabou com nove mortos e dois feridos. O crime aconsteceu um dia após a matança no Uberaba, numa sexta-feira de Carnaval, 28 de fevereiro de 2003. No caso de Colombo, um dos assassinos se enforcou na penitenciária e o outro suspeito está para ser julgado. Morreram o traficante Hélio Duarte, mulher, filhos, e seus pais, entre outras vítimas. Segundo as investigações, a ordem para a execução teria partido de dentro da Colônia Penal Agrícola, da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).

Impunidade

Segundo especialistas, as chacinas são sempre mais difíceis de esclarecer do que os homicídios. A taxa nacional de resolução é baixa, em torno dos 5%. "As mortes de forma sistemática indicam a sensação ou certeza de impunidade por parte dos chacinadores. No Rio de Janeiro isso ocorreu por muito tempo motivado por grupos de extermínios. Eles ficavam impunes. O que tem revelado também é uma espécie de impunidade, por causa da lentidão do processo de investigação", diz o coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o sociólogo Pedro Bodê.

Para Benedito Mariano, ex-ouvidor das polícias Civil e Militar de São Paulo e atual chefe da Guarda Municipal de Osasco, não se pode descartar a participação de policiais nas chacinas. "Uma das hipóteses é a dívida de drogas. Os devedores morrem e quem está junto tem o mesmo destino no acerto de contas." Ele investigou a participação de policiais em chacinas. "Lembro de uma grande, na Zona Norte de São Paulo, há dez anos. Morreram 12 pessoas, a maioria com tiro na cabeça. A apuração chegou a um grupo de três ou quatro policiais militares. Eles tinham ligação com o crime organizado e extorsão de traficantes", lembra.

Mariano diz ainda que a chacina é um crime muito difícil de apurar, e normalmente fica com autoria desconhecida. "Mas não acredito que a ordem para as execuções sejam de facções criminosas, como o PCC, embora o pano de fundo seja o tráfico de drogas", diz. Já o advogado criminalista Maurício Stegemann Bieter, doutorando em Direito Penal pela UFPR e membro da comissão de Direitos Humanos da OAB do Paraná, defende tanto a descriminilização das drogas, como a regulação informal da venda de entorpecentes pelo estado. O objetivo é reduzir as práticas violentas oriundas dos acertos de contas do narcotráfico.

"O tráfico de drogas cria um mercado altamente lucrativo, mas marginalizado e ilegal. Logo, ele não se submete às regras de competição de mercado. E por causa da falta de disciplina jurídica dessas relações, as pessoas vão reproduzir a violência na disputa por esse mercado", explica Bieter. "Assim, o estado deveria disciplinar a venda por mecanismos administrativos ou cíveis. Embora a Constituição não permita a venda de drogas como a cocaína, por ser um negócio ilícito, o estado poderia se fazer presente nessas comunidades e disciplinar informalmente as vendas para tentar evitar novas mortes".

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