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Curitiba – O Orçamento da União tem sido uma boa fonte de enriquecimento ilícito dos corruptos. Só a máfia das obras públicas, investigada na Operação Navalha da Polícia Federal (PF), abocanhou pelo menos R$ 170 milhões dos cofres públicos. Os envolvidos no superfaturamento na compra de ambulâncias em municípios com recursos do Ministério da Saúde, alvo da Operação Sanguessuga, também da PF, embolsaram no mínimo R$ 300 milhões, segundo investigações. E o último relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) mostra que esses números apresentam apenas a ponta de um iceberg: o governo não sabe como foram gastos R$ 12,5 bilhões transferidos para convênios até dezembro de 2005 porque ainda não recebeu a prestação de contas dos municípios ou programas. Recursos que, segundo o ministro do TCU, Ubiratan Aguiar, relator do documento, são facilmente utilizados para fins diferentes para os quais foram aprovados já que não foram justificados.

Para estancar essa sangria, está em discussão no Congresso a necessidade da implementação de mudanças de como é votado o Orçamento da União. A idéia é impedir que, no processo de definição de como será aplicado o dinheiro, possam ser inseridos os esquemas de corrupção.

A fraude mais comum no Orçamento funciona com a junção de três corruptos: um parlamentar, um dirigente de empresa privada e um intermediário no Executivo que tenha acesso à liberação de verbas. Exemplos de deputados, senadores e funcionários públicos não faltam. Nem de empresas – no caso dos sanguessugas, por exemplo, a Planam, de Luiz Antônio Vedoin; na Operação Navalha, a Gautama, de Zuleido Veras.

As empreiteiras "pressionam" – com presentes e propina – os ministérios que prevêem as verbas e depois os parlamentares que avaliam o orçamento e apresentam emendas. Para se ter uma idéia de quanto as empresas apostam nos políticos, levantamento do jornal Folha de S. Paulo aponta que só as empreiteiras foram responsáveis por 54,7% das doações das campanhas dos parlamentares eleitos no Congresso. No total, R$ 27 milhões – sem contar o tradicional caixa 2.

"Existe um conjunto de companhias privadas tentando se apropriar do orçamento, basta checar as doações de campanha. No outro lado, vemos os parlamentares preocupados em se manter no poder e, portanto, zelosos pelo financiamento de suas campanhas. Para cumprir essas metas, ambos estão interessados em facilitadores nos órgãos do Executivo para garantir o esquema", descreve Gil Castello Branco, economista do site Contas Abertas.

A discussão mais esdrúxula para evitar o rombo nos cofres públicos por meio do Orçamento propõe o fim da Comissão Mista de Orçamento no Congresso e das emendas individuais e de bancadas com o objetivo de brecar a distribuição de propina para parlamentares. "Isso seria jogar o balde junto da água suja", compara Cláudio Abramo, diretor-executivo da ONG Transparência Brasil. "É evidente que a comissão precisa existir para criticar e avaliar a proposta do Executivo. A representação política no Brasil é baseada nos benefícios que o deputado federal defende para sua base, e não tem nenhum sentido impedir essa representação. O que é preciso é fiscalizar esse trabalho", afirma.

Uma proposta mais consistente em estudo é acabar com o contingenciamento dos recursos. Hoje a verba pode ser prometida, mas fica à espera de liberação, ou seja, é contingenciada.

Nesse período, aumenta a "tentação" das partes interessadas de distribuir propinas para "acelerar" o processo. Caso se deixe de contingenciar – as verbas aprovadas seriam depositadas automaticamente na conta corrente de estados e municípios –, não adianta mais tentar interferir na liberação do gasto.

Outra idéia interessante é o Projeto de Lei 1142/2007, do deputado Henrique Fontana (PT-RS), que prevê punições severas para empresas envolvidas em fraudes. A Gautama, pivô da máfia de obras públicas investigada na Operação Navalha, por exemplo, não poderia mais participar de nenhuma licitação.

"Se o chefe de um esquema de corrupção é punido com o confisco do patrimônio e a obrigação de ressarcir os cofres públicos, fica muito mais difícil que outros queiram se arriscar. O uso da pena econômica é a melhor solução", defende Roberto Livianu, promotor de Justiça em São Paulo e presidente do Movimento do Ministério Público Democrático.

Mas o que vai resolver mesmo, diz Abramo, é a sociedade se organizar em associações, ONGs e outras iniciativas que, de fato, conquistem saídas para acabar com a corrupção. "O preço da eficiência está na eterna vigilância", filosofa.

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