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O presidente da Comissão de Direito do Terceiro Setor, da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná, Gustavo Justino de Oliveira, defende que é preciso investir na fiscalização para diminuir o número de casos de irregularidades envolvendo o repasse de verbas da União a organizações não-governamentais (ONGs). A responsabilização pessoal do gestor público também é outra mudança na legislação apoiada pelo advogado. Em entrevista a Gazeta do Povo, Oliveira esclarece alguns pontos sobre as leis que regem a associação do governo federal com ONGs e fala sobre suas expectativas com relação à Comissão Palamentar de Inquerito que tratará sobre o tema no Senado.

Por que se tornou tão urgente tratar da situação das parcerias do estado com o terceiro setor a ponto de ser criada uma Comissão Parlamentar de Inquérito?

Antes, as parcerias aconteciam em menor quantidade de valores e acho que por isso não chamavam tanto a atenção. Mas nos últimos quatro anos do governo Fernando Henrique Cardoso e nos primeiros do presidente Lu-la, foram repassados bilhões às ONGs e a gente não tem a menor noção de quais foram os resultados decorrentes dessas parcerias. Aumentou-se os valores repassados, mas a qualidade das organizações não acompanhou. Muito disso devido a uma ausência de fiscalização das parcerias pelo próprio governo. Ele repassa o dinheiro e depois não quer saber. Se um ministério legaliza uma parceria com uma ONG, não termina aí o trabalho dele. Ele tem de controlar os impactos, saber os resultados desse contrato. Mas essa é uma grande deficiência do governo brasileiro, não deste governo, mas do governo brasileiro como um todo. A atividade de fiscalização e controle do Estado no Brasil é muito deficitária e isso é em todas as áreas, não apenas no que trata de parcerias com ONGs.

Na sua opinião, criar uma legislação que trate das parcerias com entidades sem fins lucrativos é a saída para proporcionar esse controle?

Sem dúvida precisamos de uma legislação mais rígida para esse tema, mas acho que para solucionar esse problema o papel da responsabilidade da autoridade deveria ficar mais fortalecido no nosso sistema. Se não fiscalizou ou fiscalizou mal, a autoridade deveria ser punida. A responsabilidade deveria ser pessoal. Com isso, eu acredito que a população ficaria mais protegida. Países mais avançados trabalham muito a noção de accountability, que seria responsabilizar a autoridade pública a prestar contas diretamente de tudo aquilo que ela faz e acredito que isso tem de começar a ser aplicado aqui também.

O que esperar dessa nova CPI do Senado?

O Congresso já percebeu que é preciso criar uma legislação de ponta que venha regulamentar as concessões de subvenções do governo para entidades sem fins lucrativos. Acredito que esse é o foco principal e o que deverá ser tratado nesta Comissão Parlamentar. Claro que a gente não pode esquecer que as CPIs são instrumentos utilizados no âmbito do Poder Legislativo, que é um espaço propício dos assuntos políticos. Então, dizer que uma CPI não pode ser politizada é muito difícil, mas ela tem um caráter investigativo e esse momento deve ser o mais técnico possível. Por isso acho que muita coisa irá emergir dessa comissão. É bom lembrar que o período de investigação abrange o governo FHC e Lula. Nesse tempo, as parcerias foram feitas com algumas características diferentes, mas foram realizadas basicamente da mesma forma e os problemas são os mesmos. Isso mostrará a necessidade de estipular regras específicas para que as parcerias possam ser um meio usado pelo governo para realizar programas, mas sem fugir da idéia de bom governo e firme fiscalização.

O senhor acha que o terceiro setor pode ter um tratamento mais flexível?

Existem ONGs que nunca vão receber dinheiro público e outras que por sua natureza tendem a fazer parcerias com o governo. Neste segundo caso, acredito que deva haver um controle forte. Na minha opinião, independente de ser uma organização não-governamental ou empresa privada, a partir do momento que se faz associação com o governo, tem de prestar contas. Muitos órgãos federais entendem que por se tratar de uma ONG não precisa nem licitar e escolhem aquela que é melhor segundo os seus critérios. O que defendo é que isso acabe e seja instituído o processo seletivo público. Assim, a ONG que tem melhor capacidade técnica e infra-estrutura para funcionar será a escolhida. Com isso, evitaremos casos como os detectados pelo Tribunal de Contas da União e pela Controladoria Geral da União, em que muitas ONGs foram criadas apenas para firmar determinado convênio.

Como o senhor vê o caso de ONGs de parentes e de amigos de governantes receberem recursos públicos?

Sem dúvida deve ser proibido. Essa não é uma questão de necessidade de legislação, é uma aplicação direta do princípio da moralidade que está previsto na Constituição. A partir de 2008 vai vigorar um decreto do governo Lula que proíbe que convênios sejam firmados com ONGs que tenham em sua administração familiares e parentes de políticos. Não chega a amizade, mas já é um começo. (CO)

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