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Cerca de 6 mil “carperos” estão acampados há quase um ano na divisa entre duas propriedades agrícolas de brasiguaios na cidade de Ñacunday: ameaças a produtores agravam a tensão na região | Marcos Labanca/ Gazeta do Povo
Cerca de 6 mil “carperos” estão acampados há quase um ano na divisa entre duas propriedades agrícolas de brasiguaios na cidade de Ñacunday: ameaças a produtores agravam a tensão na região| Foto: Marcos Labanca/ Gazeta do Povo

Cronologia

Recorde os últimos fatos que agravaram a crise agrária no Paraguai:

31 jan – Em conversa com o embaixador brasileiro no Paraguai, o presidente Fernando Lugo tranquiliza o governo Dilma sobre a tensão na região de fronteira dizendo que "a última coisa que quer é entrar em conflito com o Brasil e os brasileiros".

27 jan – O vice-presidente do Paraguai, Federico Franco, acusa o presidente Lugo de não fazer nada para apaziguar os ânimos na região de conflito.

23 jan – Cerca de 6 mil agricultores brasiguaios fazem ato na cidade de Santa Rosa del Monday para denunciar uma nova onda de invasões. De acordo com eles, soldados paraguaios estão ilegalmente demarcando terras que alegam serem da União. Alguns sem-terra acompanham o trabalho dos militares e ameaçam os produtores. A prefeita de Santa Rosa, María Victoria Salinas Sosa, é agredida pelos sem-terra.

1º dez 2011 – Três mil produtores rurais dos estados de Alto Paraná, Itapúa, Canindeyú, Caaguazú e San Pedro protestam na cidade de Minga Guazú contra um decreto presidencial que regulamenta a chamada Lei de Segurança Fronteiriça. A nova regra estabelece uma faixa de segurança de 50 quilômetros que se estende ao longo da fronteira do Paraguai com Argentina, Brasil e Bolívia. Conforme estabelece a Lei 2.532/05, imigrantes de países vizinhos e empresas com capital de maioria estrangeira não poderão ser proprietários de terras nas regiões limítrofes.

Origens

De convidados a invasores

A intolerância contra brasiguaios surgiu às vésperas da queda do ditador Alfredo Stroessner, em 1989. Foi pelas mãos do generalíssimo que colonos brasileiros, em especial gaúchos e paranaenses, começaram a chegar no início da década de 1970, atraídos por terras baratas e crédito bancário. À época, Stroessner mandou publicar anúncios em grandes jornais brasileiros oferecendo terras a preços módicos. A colonização da fronteira iniciara-se uma década antes, com a venda de grandes latifúndios a companhias estrangeiras agroindustriais.

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O epicentro do mais recente conflito agrário no Paraguai está localizado a 75 quilômetros de Foz do Iguaçu, no departamento de Alto Paraná. Um grupo de 6 mil sem-terra paraguaios, chamados de "carperos", está acampado há quase um ano no município de Ñacunday, na divisa entre duas propriedades rurais de produtores descendentes de brasileiros.Eles ameaçam tomar à força uma área de 167 mil hectares espalhados pelos departamentos de Alto Paraná, Canindeyú e Itapúa na faixa de fronteira com o Brasil e a Argentina. Armados e dispostos a radicalizar o movimento, alegam que as terras ocupadas por brasiguaios pertencem ao governo paraguaio e deveriam servir ao projeto de reforma agrária encampado pelo presidente Fernando Lugo.

Os conflitos vêm se acirrando desde o dia 11 de janeiro, logo após uma ordem recebida pelo Exército para que se encarregasse da medição e instalação de marcos nas propriedades que ficam na faixa de fronteira, área de 50 quilômetros desde o limite com os países vizinhos. Uma lei de 2005, recentemente regulamentada pelo governo, proíbe a venda a estrangeiros de terras no denominado cinturão de segurança. Soma-se à lei o interesse dos sem-terra sobre possíveis excedentes de terras que possam ser desapropriadas pelo governo.

Vigília noturna

Apesar das ordens judiciais de reintegração de posse, os carperos resistem e pressionam os produtores. Valdeir Berle, filho de brasileiros nascido no Paraguai, diz temer os ataques, mas que espera uma solução pacífica para o conflito. "Vie­ram no meu portão ordenando que eu deixasse a propriedade. Dis­­seram que se eu saísse não poderia mais voltar. Desde então, tenho ido dormir lá pelas 4 horas até que meu irmão levante para continuar a vigília. Medo a gente tem, mas daqui, só saio morto."

Representantes dos agricultores têm buscado o apoio de políticos paraguaios na defesa da propriedade privada e dos títulos de terras dos brasileiros. "Nossa situação é totalmente legal. Nossos pais chegaram aqui e, com trabalho sério, começaram a mudar a realidade desta região há mais de 40 anos. Somos filhos de brasileiros, nascemos aqui, somos paraguaios, e herdamos estas terras", afirma Márcio Giordani, membro da Coordenadora Agrícola do Paraguai (CAP), em Santa Rosa del Monday.

Ultimato

Na úlima segunda-feira, líderes dos sem-terra exigiram a posse dos 167 mil hectares, a maioria de propriedade de brasileiros e descendentes, e deram prazo de uma semana para o governo se posicionar. No dia seguinte, voltaram a reclamar as terras e adiantaram que, independentemente da resposta ao pedido, deflagrariam uma nova onda de invasões, a começar pelo município de Ñacunday. No mesmo dia, o presidente Lugo, após reunião com o embaixador do Brasil em Assunção, Eduardo Santos, procurou tranquilizar os brasileiros afastando o risco de conflitos entre paraguaios e brasileiros.

Líderes ruralistas alegam que as ameaças e as ocupações são orquestradas e apoiadas pelo próprio governo. "Existem muitos interesses sobre estas terras. Há muita promessa e muita gente sendo usada. Quem o governo deveria ajudar, como os assentados, por exemplo, não ajuda. Estes estão passando fome. Ou seja, estamos diante de um problema social e político", rebate o representante da CAP em Canindeyú, Hermes Aquino.

Em editorial, jornal critica xenofobia

Três dos principais jornais de circulação nacional no Paraguai destacaram ontem os conflitos entre brasiguaios e carperos na região de Santa Rosa del Monday, no Alto Paraná, próximo à fronteira com o Brasil, segundo a Agência Brasil. O maior jornal paraguaio, o ABC Color, dedicou o editorial ao assunto criticando duramente a xenofobia contra os agricultores brasileiros.

Em sua versão online, o ABC Color disse que os sem-terra do país fazem campanha para acabar com a propriedade privada no Paraguai. De acordo com o texto, há um "espírito distorcido e um falso nacionalismo" que conduzem a atos de "clara xenofobia". No editorial, o jornal alerta sobre "consequências embaraçosas" para a paz social na região.

A principal notícia publicada no jornal Última Hora se refere à determinação do governo de aumentar a segurança nas áreas de conflito no Paraguai – os departamentos de Alto Paraná e Itapúa, ambas na fronteira com o Brasil. A estimativa é que 350 mil brasileiros vivam em território paraguaio – a maioria é agricultor.

No jornal Diário Popular, o destaque é a ordem do presidente paraguaio, Fernando Lugo, ao mi­­nistro do Interior, Carlos Filizzola, para que garanta segurança aos brasiguaios e aos sem-terra do Paraguai, evitando o agravamento da crise. O apelo ocorre no momento em que homens da Polícia Nacional apelam por reajuste salarial.

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