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O fandango e o barreado são considerados as expressões mais típicas do território paranaense. É na cidade de Paranaguá que essas características são encontradas ainda de forma legítima, mas aperfeiçoadas ao longo do processo histórico. Curiosamente, as duas tradições se complementam nas suas funções, possuindo origens cheias de controvérsias.

Para entender essa ligação é necessário conhecer o significado e o surgimento do fandango no Paraná. Pesquisadores como Roselys Roderjan e Inami Custódio Pinto definem o fandango como uma festa típica dos caboclos e pescadores habitantes da faixa litorânea do Paraná, na qual se dançam várias modas ou marcas ao som de viola e dos tamancos de madeira.

A palavra fandango é apresentada pelos dicionários como sendo de procedência espanhola, cujo significado é um "baile ruidoso". A versão mais comum de sua instalação vem da colonização açoriana, onde nas Ilhas dos Açores também se dançavam um tipo semelhante de música. Já alguns estudiosos afirmam que o fandango teria se originado no Brasil e, mais tarde, difundido na Península Ibérica.

Independente de sua origem, o fandango no Paraná chegou a ser proibido pelas Ordenanças Reais e pela Igreja em 1792, considerado lascivo e atentatório aos bons costumes. Mais tarde liberada, a dança ficou restrita às comunidades rurais, perdendo ainda mais suas características originais. A forte influência européia e a colonização dos imigrantes no planalto praticamente acabaram com o fandango. No litoral, a imigração foi um pouco menos densa, permitindo que a tradição resistisse por mais tempo, principalmente nas cidades e regiões mais isoladas.

Atualmente, na Ilha de Valadares sobrevivem grupos folclóricos como do Mestre Romão e Mestre Eugênio. Em Guaraqueçaba, a Família Pereira tenta manter viva a cultura fandangueira, apesar de muitos integrantes terem se mudado da cidade. Já em outros lugares, como Morretes, Antonina e pequenos vilarejos, apenas grupos isolados ainda relatam sobre a música, abrigando pouquíssimos artesãos que preservam a arte de fabricar os instrumentos.

O grupo folclórico do Mestre Romão é um dos poucos empenhados em resgatar e divulgar esse costume para outras regiões fora de Paranaguá. Romão Costa, 76 anos, ainda se enche de alegria ao ver seus dançarinos passar o que ele ensinou para as novas gerações. Aposentado pelo sindicato dos estivadores, tem no fandango a maioria dos seus filhos e netos. "Aprendi fandango quando era criança. Meu maior desafio agora é não deixar essa cultura morrer." A Expedição Paraná foi conferir uma apresentação do Mestre Romão na casa de música Brasílio Itiberê, localizada no centro histórico de Paranaguá. Com 25 integrantes presentes, entre dançarinos e violeiros, o grupo atraiu a atenção de curiosos e admiradores da boa música. Embalados por três violas, dois adufos e três rabecas, a velha guarda mostrou a verdadeira música de raiz paranaense. No palco em pé, as meninas dançavam exuberantes, todas trajando um lindo vestido floral vermelho. Os meninos caprichavam no sapateado, mas por causa do chão de cimento, o tamanco não causava o impacto sonoro ideal. Destaque para João Otávio, neto do Mestre Romão que com apenas três anos já acompanhava o ritmo da dança.

Para Sheyla Alves, coordenadora do grupo, manter um grupo ensaiado e ativo, mesmo sabendo das dificuldades, traz um reconhecimento muito grande para o fandango do Paraná. "Estávamos agora em Florianópolis, participando de um festival de cultura popular. Junto com nossa música e dança, levamos o barreado. Todos adoraram a iguaria e nossa apresentação foi muito elogiada."

Tradicionalmente, o fandango era dançado durante o entrudo, que deu origem ao atual carnaval. A dança começava no início da noite e ia até o amanhecer do outro dia, terminando a farra apenas na Quarta-Feira de Cinzas. No litoral paranaense, não se pode separar o fandango do barreado, já que este foi o principal alimento consumido durante a festa. Devido aos condimentos à base de carne, toucinho, temperos e à maneira especial de cozinhá-lo, o barreado é um prato saboroso, fácil de fazer e relativamente barato. Ele pode ser requentado várias vezes sem perder o sabor original ou estragar. Por isso, as "folgadeiras" (como são chamadas as dançarinas de fandango), preparavam o barreado no sábado e o requentavam durante os dias de entrudo, dispensando o trabalho que seria cozinhar o prato no dia seguinte a uma noite de festa.

Curiosamente, a origem do barreado também envolve os pescadores do litoral paranaense que misturavam tradições açorianas trazidas no século XVIII junto com influências do caboclo. "Antigamente, nos arquipélagos das Ilhas dos Açores, os nativos cozinhavam a carne temperada com vinho branco dentro daqueles buracos vulcânicos, num prato conhecido como alcatra", garante o fotógrafo Orlando Azevedo. O nome do barreado surgiu da expressão "barrear" a panela com um pirão de farinha de mandioca para vedar o vapor em seu interior. Dona Norma de Freitas, responsável pelo restaurante "Casa do Barreado" em Paranaguá, só prepara o alimento de maneira original na panela de barro. Para ela, a iguaria é como um instrumento de divulgação da cultura local. "Procuro sempre falar aos clientes um pouco da história e da preparação complicada do barreado. Isso ajudou o restaurante a ser reconhecido pelos guias especializados como a melhor comida típica do Paraná."

Ao contrário da "Casa do Barreado", muitos outros restaurantes distorcem a maneira legítima do preparo do alimento, apenas para satisfazer a demanda comercial. Apesar de consolidado, o barreado precisa manter suas raízes históricas para não sofrer influências de outras práticas e perder sua verdadeira essência, como aconteceu com o fandango. Já essa velha tradição de dança depende muito da divulgação e educação de novos tocadores e mestres para sobreviver. O grupo folclórico Mestre Romão busca passar o conhecimento a outras gerações, mas é necessário maior união com outros grupos fandangueiros. Não se pode abandonar algo que tem um profundo significado para as comunidades de antigamente. O fandango está ligado à pesca, à preparação da roça, ao mutirão, à confecção dos instrumentos musicais, ao barreado, à festa da padroeira, enfim, ao modo de viver das comunidades litorâneas. Sem os fandangueiros, a cultura caiçara terá sua resistência profundamente ameaçada.

Sobre a Expedição Paraná

O QUE É – A Expedição Paraná é uma continuação do projeto Coração do Brasil criado pelo fotógrafo Orlando Azevedo. Busca desvendar e revelar o estado do Paraná em seu patrimônio humano e natural percorrendo caminhos alternativos. Orlando Azevedo viaja com os cinegrafistas André Slomp de Azevedo e Marco Aurélio Jacob, acompanhados pelo jornalista Jeferson Jess.

PATROCÍNIO - Sanepar, Gazeta do Povo, Clear Channel, Rádio Rock 96.3 e provedor OndaRPC.

APOIO – Ministério da Cultura, Governo do Estado do Paraná, Secretaria Estadual da Cultura, Vivo, BS Colway, Leica, Imagem Brasil e loja Barddal.

AGRADECIMENTOS - Prefeitura de Paranaguá, Fundação Municipal de Turismo, Rafael Gutierrez e Grupo Folclórico Mestre Romão.

SITE OFICIAL – Roteiro, diário de bordo, mais fotografias e outras informações dessa aventura podem ser conferidas no www.expedicaoparana.com.

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