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Filho de pescadores, hoje é Zé Maria quem “ensina a pescar” | Ivonaldo Alexandre/ Gazeta do Povo
Filho de pescadores, hoje é Zé Maria quem “ensina a pescar”| Foto: Ivonaldo Alexandre/ Gazeta do Povo

Hélio Sant’Ana e seu "portal de criatividade"

Desconstruir o mito de que a música é uma atividade cara e difícil é o objetivo do projeto social de Hélio Sant’Ana, músico e arte-ativista que há vários anos ministra oficinas de construção de instrumentos com material reciclado.

Esse projeto, voltado para educadores e para o público em geral (crianças, adolescentes e adultos), mostra que notas musicais podem ser produzidas por meio de qualquer tipo de material: madeira de compensado, plásticos, garrafas PET, canos de PVC e outros inúmeros objetos que, na mão do artista, se torna instrumento.

"Para os participantes, é interessante poder tocar algo que a própria pessoa construiu", ressalta Hélio. "Abre-se um portal de criatividade e inovação para que se desenvolva muito mais coisas, além de ser uma grande terapia, afastando a ociosidade pejorativa."

Em junho, o músico fez um show usando esses instrumentos na Biblioteca Pública do Paraná (BPP). Voltado para o público infanto-juvenil, a apresentação fez parte do projeto Aventuras Musicais, realizado mensalmente na BPP.

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Num país em que talento e oportunidade costumam ser grandezas inversamente proporcionais, pessoas como José Maria Magalhães Silva sabem que a beleza pode surgir em qualquer lugar e esmaecer sem chegar a lugar algum. Trinta anos atrás, o menino de baixa renda, morador da periferia de Fortaleza (CE), teve a sorte de encontrar uma iniciativa que buscava reverter esse prognóstico. Hoje, aos 53 anos, o músico e violista da Orquestra Sinfônica do Paraná retira algumas horas de sua semana para ajudar outras crianças carentes, como ele um dia foi, a também vibrar as cordas do próprio destino.

Zé Maria, como é conhecido no meio artístico local, é filho de um pescador que, nos anos 70, se tornou funcionário do Dnocs, o Departamento Nacional de Obras Contra a Seca. Durante muito tempo, a autarquia era vista pela população do semi-árido nordestino como a salvação da lavoura e despertava admiração de homens como o pai de Zé Maria, que começou a carreira no órgão como cavador de açudes e foi promovido para trabalha no escritório após aprender a ler, como autodidata.

Seu filho, então adolescente, ficou sabendo da existência do Centro de Formação de Instrumentistas de Cordas, um projeto filantrópico para ensino de música erudita. Desconhecia essa forma de arte, e tirou sarro dos colegas que começaram a frequentar, dizendo que eles iriam aprender música "de velho". Mas quando uma ex-namorada se inscreveu no curso, ele resolveu fazer o mesmo para tentar reconquistá-la. Logo a paixão mudou de objeto. "No primeiro contato com o instrumento, parecia que eu já o conhecia. Tinha facilidade em aprender. Depois de um tempo, fui eu que passei a ser alvo da chacota dos amigos", lembra. Pela curta extensão dos braços, começou no violino, mas logo passou à viola.

Zé Maria formou um quarteto de cordas com colegas de curso. Um deles se mudou para Curitiba e convidou os colegas a se juntar a ele. Depois de um tempo de inatividade, o quarteto retomou as apresentações na nova cidade-sede, apropriadamente rebatizado de Quarteto Iguaçu.

Música para Todos

Desde 2001, Zé Maria tentava implantar um projeto gratuito de ensino musical. Já naquele ano recorreu à Lei Rouanet, programa do governo que permite patrocínio cultural por meio de renúncia fiscal. Foi aprovado, mas não conseguiu captar recursos junto a empresas privadas. Na décima tentativa, conseguiu convencer uma multinacional a bancar a ideia. Bastava então escolher o local de implantação. Queria que fosse uma região com deficiências socioeconômicas, onde o impacto seria potencialmente maior, porém não muito longe da capital.

Descobriu que Tunas do Paraná, a 75 quilômetros de Curitiba, tem alguns dos mais baixos indicadores sociais e de renda do estado. Em meio a tantas dificuldades, construiu um pequeno teatro – o único entre os municípios da região. Era um sinal indireto de boa acolhida, que se confirmou ao longo dos dois anos seguintes.

Projeto atende 84 jovens em vulnerabilidade

O projeto sócio-musical Música Para Todos, criado por José Maria Silva, é focado em jovens em situação de vulnerabilidade. "Uma das mudanças mais evidentes é o comportamento desse pessoal. Tinha um rapaz de 26 anos que chegou todo amuado, e nem sequer sabia diferenciar a mão direita da esquerda. Ninguém imaginava que ele poderia tocar, mas hoje é um violista de primeira", exemplifica Zé Maria, coordenador do projeto.

Dois anos depois de iniciado, o projeto atende 84 jovens. Desses, 24 fazem parte da Orquestra Sinfônica de Tunas do Paraná e recebem uma bolsa auxílio de R$ 280 ao mês. Todos os alunos, componentes da orquestra ou não, têm a posse do instrumento. Podem levá-lo para casa e praticar o quanto quiser. "A evolução desses meninos é impressionante. Já foram elogiados por diversos músicos profissionais."

A orquestra viveu um momento de êxtase em dezembro passado, quando acompanhou o cantor Fagner em show realizado no Teatro Guaíra, em Curitiba. Uma nova apresentação com o artista cearense está marcada para o final deste ano, e ainda uma outra com Ivan Lins. "Negocio agora para levá-los à Suíça. Dos meus colegas de estudo, vários ganharam o mundo. Espero que o mesmo aconteça em Tunas", almeja Zé Maria.

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