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| Foto: Henry Milléo/Gazeta do Povo

Famílias de crianças em tratamento comemoram a conquista

Para Priscila Inocente, mãe de Miguel, de 5 anos (foto), que até iniciar o tratamento com canabidiol enfrentava convulsões diárias, a liberação do CBD é uma vitória conquistada pela união de centenas de pais que não desistiram diante das dificuldades burocráticas para a aquisição do medicamento. "Nós formamos um grupo muito unido, que lutou pela reclassificação até o fim. Isso vai gerar uma série de facilidades para os médicos, que não se sentirão mais acuados em prescrever; para as famílias e pacientes, que não precisarão enfrentar tanta resistência e burocracia; e para a medicina brasileira, que poderá realizar pesquisas sobre o canabidiol e os benefícios terapêuticos da substância", avalia.

Passo a passo

Famílias de pacientes ainda terão de solicitar à Anvisa autorização para importar o canabidiol:

Dados do paciente

Pacientes ou familiares preenchem um formulário com pedido de importação excepcional.

Receita médica

Em seguida, apresentam a receita médica, que deve conter nome do paciente e do produto, dose indicada, tempo de tratamento, data, assinatura e carimbo do médico.

Diagnóstico

É exigido um laudo médico com o nome da doença, a descrição do caso e a justificativa para usar o produto e não outros tratamentos convencionais.

Responsabilidade

Médicos e pacientes devem assinar um termo em que afirmam estar cientes que o tratamento à base de canabidiol ainda não tem eficácia comprovada.

Validade

A autorização para importação é válida por um ano. Caso queiram fazer um novo pedido neste período, pacientes precisam enviar um e-mail para med.controlados@anvisa.gov.br com a nova receita médica.

O uso terapêutico do canabidiol está permitido no Brasil. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou ontem, por unanimidade, a mudança na classificação da substância presente na maconha. Ela deixa a lista de produtos proscritos e passa a figurar na lista C1, de substâncias de uso controlado.

A decisão é fruto de uma discussão iniciada ano passado, quando familiares de crianças que sofrem recorrentes crises de convulsão começaram uma movimentação para a liberação do produto, cujo uso é permitido em outros países. Estudos mostram que o canabidiol, que não tem efeito psicoativo, ajuda a reduzir as crises convulsivas. Katiele de Botoli, mãe de Anny, uma das primeiras pacientes brasileiras a usar o produto para tentar reduzir as crises, emocionou-se ao fazer a defesa da reclassificação. "Esse momento é muito importante. Sabemos que não se trata da cura, mas da esperança na qualidade de vida das crianças", disse. "Esperamos que a mudança estimule a realização de estudos científicos para conhecer mais sobre a substância e sua interação com outros medicamentos", completou.

De acordo com Katiele, depois de vários meses com crises controladas, Anny voltou semana passada a apresentar um aumento de convulsões. A piora estava relacionada à interação com outro medicamento, que a menina passou a usar. "Interrompido o uso, as crises foram novamente controladas", contou a mãe.

A presidente da Federação Brasileira de Epilepsia, Maria Carolina Doretto, afirmou esperar que, com a reclassificação, indústrias farmacêuticas passem a sintetizar o produto. Ela defendeu ainda que ele seja rapidamente incorporado no Sistema Único de Saúde (SUS). "Seguindo os padrões estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina", destacou.

Justificativa

Na justificativa de seu voto, o presidente em exercício da Anvisa, Jaime Oliveira, lembrou que o canabidiol não é considerado um produto entorpecente ou psicotrópico e não há relatos de que possa provocar dependência. O diretor Renato Porto, que também votou pela reclassificação, fez avaliação semelhante. Ele ressalvou, no entanto, não haver estudos que mostrem a eficácia e a segurança do produto a longo prazo, uma lacuna que, em sua avaliação, é preciso ser reparada. A maior parte dos diretores da agência ressaltou que não há relatos de dependência relacionada ao uso de canabidiol, enquanto há diversos indícios registrados na literatura científica de que a substância auxilia no tratamento de enfermidades como a epilepsia grave.

Os diretores também ressaltaram que a reclassificação abre caminho para que as famílias que fazem uso do canabidiol não continuem a agir na ilegalidade ou por fazer uso de uma substância proibida, além de abrir caminho para mais pesquisas. A Anvisa iniciou a discussão sobre a possibilidade da reclassificação da substância em maio de 2014. Na época, não houve decisão terminativa sobre a questão. Desde então, a agência vem autorizando a liberação de importação do canabidiol em caráter excepcional.

Medidas adotadas reduzem a burocracia

Carolina Pompeo, especial para a Gazeta do Povo

A permissão para o uso terapêutico do canabidiol vem na esteira de uma outra decisão da Anvisa, de dezembro passado, quando a agência criou regras para facilitar os trâmites para importação do medicamento. Desde então, a documentação exigida para viabilizar a solicitação passou a ter validade de um ano, ou seja, se houver necessidade de importar um novo lote de canabidiol, basta que o solicitante apresente uma nova prescrição médica.

Em dezembro, também, o Conselho Federal de Medici­na publicou a resolução 2.113/2014, na qual autoriza médicos neurologistas, psiquiatras e neurocirurgiões a prescreverem o canabidiol. O Conselho Regional do Paraná acatou a orientação. Desse modo, a mais recente decisão da Anvisa pela reclassificação da substância pode não acarretar mudanças imediatas, mas pode representar um avanço para o desenvolvimento de pesquisas e produção nacionais.

De acordo com o médico Maurício Marcondes Ribas, presidente do Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR), a liberação facilitará todas as etapas desde a demanda do paciente, passando pela prescrição do médico até a aquisição. "O Conselho Federal de Medicina já havia liberado a prescrição de forma ordenada, para determinados profissionais e tipos de doenças neurológicas, mas mesmo com o aval para a prescrição, havia muita dificuldade na importação. Agora, o mercado se abre. Quem ganha é o paciente, em agilidade e até mesmo em preço", observa.

O médico também acredita que a reclassificação do canabidiol vai promover avanços em pesquisas e o interesse de indústrias farmacêuticas em produzir o medicamento no Brasil. "A demanda é grande e as pesquisas que já existem apresentam resultados promissores para os pacientes e médicos, principalmente para a pediatria. Seguramente há boas perspectivas para a criação de um novo mercado farmacêutico".

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