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O Brasil conta hoje com 800 mil coletores de lixo reciclável, bem mais do que os 700 mil advogados e os 350 mil médicos em atividade no país. Desse total, apenas 7,5%, ou 60 mil deles, estão organizados em cooperativas e associações, segundo o Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis (MNCMR). Mas a despeito da presença massiva nas ruas, os carrinheiros seguem invisíveis a sina diária à frente de um carrinho. Atirados na espiral da miséria, eles vivem sob uma atmosfera de silêncio, medo, desconfiança e conformismo. Mo­­tivos não faltam.

A jornada diária de 20 quilômetros puxando uma carga de 300 quilos se estende das 6 às 22 horas, tudo por míseros 15 ou 20 reais. Para conhecer os motivos que os empurra nessa cruzada exaustiva é preciso compreender seu contexto. Desemprego, miséria, baixo grau de alfabetização e especialização alimentam o fluxo de carrinheiros nas grandes cidades. A coleta de recicláveis tornou-se oportunidade de fonte regular de renda a essa classe excluída do mercado formal de trabalho. Para muitos, é a primeira atividade remunerada, talvez a única por toda a vida.

Em 2009, a Gazeta do Povo revelou como funciona a exploração de mão de obra dos carrinheiros, lançando-os um nível abaixo nessa atividade já degradante. Barracões suspeitos se multiplicam nas favelas de Curitiba, lotados de coletores em regime de servidão, a maioria sem se dar conta disso. A retenção dos documentos pessoais, o atrelamento a um só atravessador, o aluguel do carrinho, as ameaças, tudo contribui para fazer dessa gente escravos do lixo. Nos depósitos clandestinos, hospedagem e carrinho são dívidas pagas às custas de muito trabalho.

Sozinhos eles são alvo de exploração, mas há resistência em se organizar. Preferem a liberdade de não ter patrão, nem horários e regras, além de receber diariamente pelo serviço, mesmo que em quantia irrisória.

Ainda que não se queira enxergá-los, eles existem. E são muitos, como revela o cotidiano das ruas. O problema é que, quando rompem a cortina da invisibilidade, os coletores são tidos apenas como estorvo na paisagem urbana. Não só isso os torna invisíveis. Do tipo discreto, os atravessadores agem de forma a acobertar o negócio sujo em lugares distantes das vistas, geralmente no interior de favelas.

Embora pouco valorizados, os carrinheiros respondem, em média, por 90% do lixo reciclável coletado em Curitiba e região, algo em torno de 500 toneladas por dia. Eles retiram das ruas, dez vezes mais que os 170 servidores e os 27caminhões dos dois programas da prefeitura, o Lixo que não é Lixo e o Câmbio Verde. Sendo a coleta algo necessário e o poder público incapaz de recolher todo o resíduo que se produz, os coletores tornaram-se, portanto, indispensáveis.

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