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Felipe e Giovana (nomes fictícios) já reprovaram, mas tiveram a ajuda do conselho de classe em outros anos | Ivonaldo Alexandre/Gazeta do Povo
Felipe e Giovana (nomes fictícios) já reprovaram, mas tiveram a ajuda do conselho de classe em outros anos| Foto: Ivonaldo Alexandre/Gazeta do Povo

Outro lado

Secretária nega orientação

Em entrevista ontem à Rede Paranaense de Comunicação (RPC), a secretária de Estado da Educação, Yvelise Arco-Verde, negou que haja alguma orientação para os professores aprovarem os alunos. Segundo ela, dados de 2008 mostraram que, do total de 1,3 milhão de alunos matriculados na rede estadual, 200 mil reprovaram ou abandonaram a escola. Para a secretária, esses números seriam a prova de que não há orientação de aprovação automática.

A Secretaria de Estado da Educação (Seed) e o Núcleo Regional de Educação de Londrina não informaram o número de alunos aprovados por conselhos de classe no Paraná. A chefe do Núcleo, Márcia Lopes, argumentou que os dados estão disponíveis nas escolas. A assessoria da Seed informou que os dados não podem ser divulgados.

Márcia Lopes afirmou que o estado não utiliza a aprovação automática, como outras unidades da Federação, e que o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) não influi nos conselhos de classe. "O Ministério da Educação incentiva as escolas com menores índices, mas ele está ligado não só à reprovação, mas também aos resultados da Prova Brasil e à evasão escolar".

Em Londrina, o pai de um estudante do ensino médio disse que seu filho não tinha notas para passar de ano, mas foi aprovado no conselho de classe. O adolescente tirou nota 38 em física, 26 em matemática e 35 em geografia. "Com umas notas como essas não era para passar de ano, mas para reprovar", disse Claudemiro Nobre, pai do aluno, em entrevista ao PRTV 1ª Edição. A média das escolas estaduais é 60. Para atingi-la, faltavam 92 pontos em física, 93 em matemática e 72 em geografia.

No caso do pai de Londrina, Márcia Lopes disse que determinou uma avaliação assim que o ano letivo começar. "A orientação é que esse caso seja retomado, se faça uma reflexão e que aproxime os pais da decisão tomada, para que eles compreendam o processo." (FA)

Um puxão de orelhas depois que vários de seus alunos apresentaram nota abaixo da média e a pressão para que elas fossem recuperadas de qualquer forma foi um dos primeiros choques de uma professora com a profissão. Há poucos anos na rede estadual de ensino, ela relatou que o "empurrãozinho" para que alunos não reprovem é comum, motivo para desapontamento com a atividade e para que alunos não tenham compromisso com a escola.

A professora deu o depoimento um dia depois que a RPCTV mos­­trou a revolta de um pai de dois alunos de Londrina que apresentaram nota baixa durante todo o ano letivo, mas foram aprovados pelo conselho de classe. Inúmeros e-mails de professores, pais e até alunos relataram histórias semelhantes.

A professora conversou com a reportagem por telefone e narrou estratégias que ocorrem nos bastidores das escolas para evitar que alunos reprovem. Segundo ela, é comum que professores anotem notas e o controle de presença a lápis para futuras modificações. "Muitos mudam a nota de acordo com a pressão ou para dar uma ajudinha no final de ano. Eu mesma mudei as minhas notas no segundo bimestre, depois que me chamaram a atenção no primeiro bimestre", disse. Esse comportamento dos professores, segundo ela, também reflete nos alunos. "Eles não têm mais nenhum comprometimento com as aulas. Não fazem provas, não entregam trabalhos e na quarta-feira, quando a aula é de noite, ninguém aparece por causa do futebol na televisão. Na sexta-fei­­ra nem tem aula, porque todo mundo vai pra balada", afirmou. Para a professora, o motivo é o simples fato da certeza de aprovação no final de ano. "Tem de se esforçar muito para reprovar hoje em dia."

O desânimo já influiu no futuro dela como profissional. "Estou desanimada com o meu trabalho. O amor pela missão de educar vai acabando aos poucos e a gente acaba só indo mesmo porque tem contas para pagar no final do mês. Hoje não existe nenhuma recompensa em ser professor".

Pressão

Os e-mails recebidos pela reportagem refletem a mesma situação. Uma professora lembrou que a aprovação está ligada também ao Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que avalia a educação no país e define as verbas que a União repassa para cada estado. "As aprovações ocorrem sim, mas têm um sentido, a verba para a escola. Quanto mais são aprovados, mais verba. Ninguém é obrigado a aprovar alunos, mas se no ano seguinte faltar papel higiênico no banheiro dos professores você poderá ser culpado", escreveu outra professora.

Outra relatou que ouviu a pressão diretamente do diretor. "Um diretor me chamou e disse que na escola dele não se reprovava aluno", revelou. Uma professora disse que precisou arrumar "notas independentemente das médias, mexer no livro, podendo alterar todos os bimestres".

Há quem tente fazer diferente, mas acaba cedendo à pressão. "So­­fro com meu trabalho jogado no lixo, quando percebo meus colegas passando alunos que brincaram o ano todo e com receio de pais que ameaçam irem ao núcleo abrir um processo administrativo".

Ajudinha

Estudante de uma escola pública de Curitiba, Felipe (nome fictício), 17 anos, conta que desde a 5.ª série necessitou de uma "ajudinha" dos professores para passar de ano. Mas, em 2009 ele reprovou o 2.º ano do Ensino Médio e em 2010 terá de rever todo o conteúdo. Não foi a primeira vez que reprovou: na 6.ª série a soma de notas devidas era muito alta.

A irmã dele, Giovana (nome fictício), 20 anos, reprovou quando estava no 2.ª ano – ela já havia sido aprovada pelo conselho de classe no ano anterior. "Na hora foi um choque porque eu precisava de pouco e achava que conseguiria. Mas no fundo foi bom porque de­­pois tive base para fazer um bom cursinho e passar no vestibular".

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