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Para vários alunos, o Jardim Botânico não passava de um estranho  desconhecido | Priscila Forone/ Gazeta do Povo
Para vários alunos, o Jardim Botânico não passava de um estranho desconhecido| Foto: Priscila Forone/ Gazeta do Povo

Isolamento

Onde estão as políticas públicas?

A urbanização, principalmente das grandes capitais, por si só já é excludente, pois costuma empurrar para as partes periféricas da cidade a população mais empobrecida. Com os moradores do bairro Campo do Santana não foi diferente. "A tendência é que as prefeituras deem atenção às áreas mais favorecidas e esqueça o resto. Falta transporte público e fica cada vez mais difícil chegar à região central da cidade", explica a coordenadora do curso de Assistência Social da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Maria Izabel Scheidt Pires.

Os prejuízos para quem não conhece nem o nome da cidade onde mora são inevitáveis. "Eles não se sentem parte da comunidade e repetem a alienação na própria vida. São pessoas que terão dificuldades de problematizar as questões da desigualdade e a tendência é a de que se repita o ciclo de pobreza", diz Maria Izabel.

Mais do que tudo é também uma questão de segurança. "Eles não têm domínio do espaço onde vivem e isso é uma informação primária que precisa ser trabalhada. Todos precisamos saber onde vivemos ou onde estamos, até quando viajamos para o exterior, para podermos estar, de certa forma, em segurança", explica o pesquisador da área educacional Gastão Octávio Franco da Luz. Por outro lado, Gastão lembra que a falta de informação é reversível, desde que a escola e os órgãos públicos atuem em prol dessa população.

O sociólogo Reinidolch Caffagni lamenta que crianças como as de Rio Bonito estejam isoladas socialmente. "Estas pessoas provavelmente terão dificuldades na competição social. É difícil que elas consigam brigar por grandes vagas de emprego com um currículo fraco. Isso acaba por causar conflitos, porque a competição é injusta", diz.

Caffagni lembra que estas crianças costumam desenvolver a inteligência para sobreviver com as poucas condições disponíveis, mas acabam não tendo a oportunidade de se aprimorar em questões intelectuais. "As sociedades que cobram mais, recebem mais recursos. É isso que falta para que estas crianças tenham acesso a recursos culturais que muitas outras crianças já têm." (PM)

São cerca de 30 quilômetros e quase uma hora que se gasta para percorrer o trajeto da Praça Rui Barbosa, no Centro de Curitiba, até a Vila Rio Bonito, bairro Campo do Santana. Apesar de parecer pouco, a distância é suficiente para deixar uma parcela de curitibanos isolada da própria cidade onde nasceu. Para Pablos, Gabrielas, Graces, Larizas e Anas (com idades entre 5 e 8 anos), o nome do município em que vivem é "Rio Bonito".

Curitiba é uma palavra que muitas crianças do bairro desconhecem. Algumas, da Escola Municipal João Amazonas, se familiarizaram com o nome depois que três professoras passaram a desenvolver um projeto com o título "A Curitiba que Curitiba não conhece".

Em 40 questionários enviados a pais de alunos para saber se eles conheciam a capital paranaense, lugar onde moram, 15 responderam que não sabiam efetivamente nada sobre a cidade e o resto afirmou ser capaz de identificar apenas alguns pontos turísticos. "Então começamos a perguntar aos alunos qual era o nome da cidade onde moravam e eles afirmavam Rio Bonito. Percebemos que era preciso fazer algo para que essas crianças começassem a se sentir pertencentes a Curitiba", explica a professora Andrea Gimenez Costa, idealizadora do projeto junto com outras duas docentes – Perpétua Aparecida Martines e Maria Ineide Seifert.

"Jardim Botânico" passou a compor o vocabulário dos alunos, apesar de muitos nem imaginarem o que é possível encontrar lá. Pablo Henrique Omena Pimentel, de 6 anos, é coxa branca, mas, quando questionado se gostaria de conhecer o Couto Pereira, fica paralisado. Ele não sabia que esse é o nome do estádio da equipe. "É grave pensar que exista uma realidade dessas, nunca tinha ouvido falar", afirma o historiador natural e pesquisador da área educacional Gastão Octávio Franco da Luz.

Se algum aluno conhece certos pontos turísticos de Curitiba, é porque a escola ou a creche o levou ao centro da cidade. Nesse caso, os pais, que normalmente vieram de outras cidades, ficam "isolados".

Campo do Santana é o último bairro de Curitiba antes da cidade de Araucária, na zona Sul. "Nos perguntamos porque tudo o que há de infraestrutura pública está lá em cima", questiona Andrea.

As professoras assumiram a causa e agora querem apresentar a crianças como Pablo a parte bonita de Curitiba. Elas pediram à prefeitura um ônibus, para que possam levar os alunos da escola até a Praça Tiradentes e, de lá, pegar a Jar­­di­­neira para conhecer Curitiba. A confirmação do município ainda não chegou. Por e-mail, a assessoria se limitou a responder à reportagem que "a aprovação depende do que o projeto representa para o desenvolvimento do turismo."

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